Doses maiores

25 de outubro de 2018

O que o inimigo nos tem a ensinar

O livro “O ódio como política”, organizado por Esther Solano, traz vários artigos interessantes sobre o momento político atual. O de Camila Rocha é “O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância?”.

Nele, a autora faz um histórico sobre a crescente influência de figuras como Olavo de Carvalho, sites como “Mídia Sem Máscara” e coletivos como Movimento Brasil Livre (MBL). A conclusão a que ela chega sobre o financiamento dessas forças políticas conservadoras é a seguinte.

...a suposta disponibilidade de fartos recursos materiais e organizacionais não explicam o sucesso das direitas na opinião pública e sua capacidade de mobilizar uma quantidade significativa de pessoas para protestar contra governos de esquerda. Muitos outros fatores devem ser levados em consideração e dizem respeito à percepção de ameaças e oportunidades por parte da militância, a consolidação de laços e identidades comuns, mobilização de afetos e uso de redes sociais, sendo que, em determinadas circunstâncias, tais fatores foram mais importantes do que a posse de recursos abundantes. Afinal, como explicar o sucesso de Jair Bolsonaro em reunir em torno de si mais de 20% das intenções de voto para as eleições presidenciais de 2018 a despeito de contar com recursos materiais e organizacionais pífios em comparação com outros concorrentes? Não siga o dinheiro, siga a militância.

A afirmação não deveria surpreender. A direita também é capaz de mobilizar e organizar pessoas em torno de valores e não apenas de estruturas. Nós é que andamos com dificuldades de fazer o mesmo.

Na história da luta de classes, não poucas vezes, quem nos deu as lições mais valiosas foram nossos inimigos.

Leia também: A disputa política não se resume a eleições

3 comentários:

  1. É Sergio, li esse livro. O meu destaque vai para o artigo do pastor Henrique Vieira "Fundamentalismo e extremismo não esgotam experiência do sagrado na religião". Quando estava no meio do artigo onde ele se afirma como pastor tomei um susto, fui e voltei no artigo tentando entender melhor o texto dentro da visão que tinha dos evangélicos. Nas outras religiões sabia da existência de um pensamento progressista, de valores morais mais livres etc, mas entre os evangélicos carregava uma visão preconceituosa devido aos valores retrógrados - que entendo ser hegemônicos entre eles - que chegam até nós. Foi uma grata surpresa tomar contato com esta corrente do pensamento evangélico que entendo muito avançado. Teria muitas partes do artigo para citar e comentar, mas escolhi esta: "A Bíblia é um conjunto de livros escritos em contextos e épocas diferentes da atual. Abarca diversos gêneros literários, construções linguísticas e cosmovisões. Inclui os gêneros da poesia, narrativas diversas, textos de sabedoria, cartas, cânticos e uma variedade enorme de histórias." Primeiro, nunca vi uma interpretação da Bíblia tão próxima daquilo que pensava em relação a sua forma de narrativa; segundo, a de colocar a Bíblia como um livro produto de um tempo e época histórica quando diz que "Em nome do que 'está escrito' ou do isolamento dos textos dos seus contextos, atrocidades já foram cometidas ao longo da história". Isso, para mim, é um entendimento que não posso dizer que seja só marxista, mas que teria no marxismo a sua validade. Qualquer teoria, texto, poesia, romance etc, está circunscrito ao seu momento histórico, e tem que ser enxergado dentro deste contexto. Bem, apesar de velhinho, e de uma eleição épica e terrível para as forças que defendem o futuro da humanidade, vou aprendendo. Isso sem falar dos policiais que defendem ideais libertários. Este mundo tá ficando muito mais louco do que eu me imaginava louco, espero poder acompanhar. O meu comentário acabou virando quase que uma outra pílula, né? Acho que não vai ficar chateado por isso. Bjs.

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  2. Marião, quisera muitas pílulas surgissem a partir das minhas. Principalmente, como essa aí, de alto nível. Mas, então, Marião. Esquisito você falar isso porque foi exatamente você que me disse, muitos anos atrás, que instituições, mesmo as mais conservadoras como as igrejas, são atravessadas pelas contradições da luta de classes. Também continuo aprendendo muita coisa depois de velho, mas aprendi muita coisa quando era mais novo, e com você muita coisa.

    Beijo

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    1. Opa, obrigado. A idade não me permite lembrar de tudo que falei, mas fico contente de ter feito este comentário. Pode ser que tenha falado de igrejas referindo as católicas, mas tinha esse resquício com as evangélicas. Bjs.

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