Doses maiores

18 de novembro de 2020

A melancolia da esquerda: militância com luto

“Melancolia de esquerda: Marxismo, história e memória” é o título de um livro do historiador italiano Enzo Traverso. Publicado originalmente em 2016, a obra volta-se para a história dos “vencidos”.

A melancolia de esquerda quase nada tem a ver com a forma épica e gloriosa, muitas vezes falsa e ilusória, de muitos triunfos e conquistas, com suas bandeiras ao vento, heróis reverenciados, antevendo um "destino magnífico e progressista" escondido no futuro. Em vez disso, trata-se da grande tradição de derrotas que marcou a história das revoluções.

É a melancolia de Auguste Blanqui e Louise Michel após a repressão sangrenta à Comuna de Paris. Mas também de Rosa Luxemburgo, Gramsci, Trotsky, Walter Benjamin, Che Guevara...
 
Essa melancolia foi escondida, removida ou sublimada pelas representações de um futuro emancipado, diz Traverso. “Ela irriga a história dos movimentos revolucionários como um rio subterrâneo, como um riacho poderoso mas invisível, exorcizado por narrativas edificantes”.
 
Tendo irrompido no século 20 como promessa de libertação, o comunismo terminou como um símbolo de opressão. Diante das imagens da demolição do Muro de Berlim, tem-se a impressão de assistir o filme “Outubro”, de Eisenstein, “sendo rebobinado”.
 
Referindo-se às primeiras mortes causadas pela AIDS, pandemia contemporânea ao fim do socialismo real, o autor lembra que muitos ativistas gays viviam com um sentimento permanente de abandono. Sabiam que logo morreriam, compartilhando o mesmo destino de seus companheiros. Mas muitos deles jamais abandonaram a militância.

Traverso considera que o significado dessa experiência poderia ser resumido em uma fórmula que reflete bem o espírito de seu livro: "Militância, é claro, mas também luto: luto e militância".

Continua...

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