Doses maiores

1 de setembro de 2021

O amor nas lojas de um dólar

Em lojas de um dólar, muitas vezes os clientes compram mesmo que não precisem de nada. Afinal, o custo de uma decisão errada é mínimo.

Essa atitude é comparada por Eva Illouz a muitos dos “contratos emocionais e sexuais” atuais, que são praticamente isentos de penalidades por sua rescisão.

Um dos exemplos é a prática do “gosthing”, diz ela em seu livro “The End of Love”. O conceito teria origem no famoso filme de 1990, estrelado por Demi Moore e Patrick Swayze. Passou a ser usado para se referir ao rompimento de um relacionamento romântico em que um dos parceiros corta todo o contato repentinamente e ignora tentativas de reconciliação. O ex-parceiro torna-se um fantasma.

“Ele me enviou um SMS dizendo que estava tudo acabado, depois de oito meses de relacionamento!”, queixa-se uma pessoa, em depoimento feito à autora.

No capitalismo atual, as empresas fecham fábricas e despedem trabalhadores sem maiores constrangimentos. Romper tornou-se parte de uma cultura em que as pessoas ficam rapidamente desatualizadas e substituíveis. Mas não apenas na esfera da produção.

Segundo Eva, as noções corporativas de eficiência, custos e utilidade passaram a contaminar as tradicionais convenções e compromissos que envolvem relações amorosas, criando uma crescente situação de incerteza.

Ultimamente, o capitalismo vem lidando com as incertezas de sua instabilidade econômica através de derivativos. Instrumentos financeiros que garantem altos lucros para poucos, mas que, em momentos de crise, acabam socializando os prejuízos com o resto da sociedade.

No caso das relações amorosas, não há derivativos. Muitas vezes, há apenas a garantia de sofrimento em meio a uma solidão abarrotada de mercadorias.

Leia também: Modernidade hiperconectada e cultura do desamor

2 comentários:

  1. O filme que fala é "Ghost - Do outro lado da vida"? Eu conheço um caso em que o homem acaba um relacionamento de mais de 20 anos por mail, mas voltaram. O que me faz pensar que nada é tão definitivo, mesmo no capitalismo, como pode parecer ser. Penso que o livro comentado nessas várias Pílulas (só estou me baseando nelas porque não li o livro), apontam uma perenidade nas relações afetivas anteriormente duradouras, não serem mais necessárias ao capitalismo porque este não necessita, ou acho que até melhor, não interessa mais a composição e estrutura da família, tendo como central o casal. Mas acho complicado, porque se não conseguir manter, seja como for, a existência dessa formalização de relacionamento amoroso, como ele vai sustentar a necessidade de manter a família, sua célula ainda mater? Ou será que não é mais? Acho que não pensamos assim. Ela responsabiliza o capitalismo, por um lado, pela dissolução das relações amorosas pela mercantilização, o que concordo; por outro lado o que fica no lugar?

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    1. A família como lugar importante de reprodução social da força de trabalho, principalmente a cargo da mulher, continua sendo importante para o capitalismo sim. O problema é que a própria dinâmica do capitalismo é que a está inviabilizando, seja nas camadas sociais intermediárias devido a essa "mercantilização" das relações afetivas apontada pelo livro, seja pelas condições econômicas e sociais nas camadas sociais mais pobres, com o papel do homem provedor e senhor da casa sendo questionado. É mais uma contradição que o capitalismo não consegue resolver e que causam muito sofrimento, mas também podem mostrar como é necessário sua derrubada. Aí, o que fica no lugar precisa ser construído no próprio movimento de negação dessa reificação das relações humanas. Uma emancipação que também seria uma forma de descoberta de novas ou renovadas formas de afeto e amor

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