Mais poemas de José Paulo Paes, retirados do livro “Socráticas”, escrito às vésperas de seu falecimento. A obra inspira-se nos ensinamentos do filósofo Sócrates sobre a morte com dignidade. A ingestão voluntária de cicuta evitando a sentença que pretendia dar-lhe um fim humilhante.
Os crimes atribuídos ao filósofo foram ateísmo e corrupção dos jovens com seus ensinamentos. O poema “Promissória ao bom Deus” faz sutis provocações às relações com as divindades. Alguns trechos:
NÃO TE AMAREI sobre todas as coisas, mas em cada uma delas,
por mínima que seja. É o que compete aos poetas fazer.
NÃO TOMAREI teu nome em vão, mesmo porque nome é coisa séria. Inclusive os feios, que, ditos por dá cá aquela palha, perdem muito da sua eficácia.
GUARDAREI os domingos e quantos dias de festa houver, que ninguém é de ferro, como descobriste no sexto dia da Criação.
(...)
NÃO LEVANTAREI falso testemunho de ninguém, muito menos de ti, que hás por certo de preferir um agnóstico fora do teu templo a um vendilhão dentro dele.
NÃO COBIÇAREI coisas alheias. Deixo-as todas para os filisteus do meu país, fascinados pelas quinquilharias do que, enchendo a boca, eles chamam de primeiro mundo.
NÃO DESEJAREI a mulher do próximo nem a do remoto. Como sabes, jamais tive paciência de esperar na fila.
(...)
EM SUMA , Senhor, vou fazer o humanamente possível para seguir teus
mandamentos. Mas desculpa, agora e na hora de nossa morte, qualquer
eventual escorregão nas cascas que o Diabo espalhou a mancheias pelo
nosso caminho depois de ter comido todas as frutas do teu, para sempre
perdido, Paraíso.
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