Doses maiores

21 de junho de 2023

O espelho escuro do capitalismo

A sexta temporada de “Black Mirror” chegou à Netflix com elevada audiência. O primeiro episódio faz uma ácida e bem humorada crítica ao poder das grandes corporações tecnológicas. Principalmente em relação a ameaças aos direitos do consumidor, violação de privacidade e uso ilegal de dados.  

O próprio serviço de streaming tornou-se alvo da trama. A vinheta da Netflix aparece claramente, ainda que o nome exibido seja outro. Ao mesmo tempo, fica demonstrado mais uma vez que até a crítica aos males do capitalismo contemporâneo foi capturada pelos aparelhos de hegemonia da classe dominante.

Segundo a definição de Gramsci, aparelhos privados de hegemonia são aqueles que são acessados pela sociedade voluntariamente. Ou seja, não se trata de órgãos públicos ou entidades estatais, aos quais a população recorre para buscar serviços ou cumprir obrigações legais. Sua função primordial é atrair a atenção popular para fazer a disputa da hegemonia em favor da ideologia dominante. Os monopólios de mídia são importantes e poderosos aparelhos desse tipo. Constroem um consenso de aceitação da vida tal como ela é, com todas as suas contradições, injustiças, sofrimentos, opressões e exploração.

O problema é que desde o final da União Soviética, o cenário ficou sem um vilão assustador o suficiente para ser responsabilizado pelas mazelas causadas pelo capitalismo. Na ausência de um malvado favorito, uma boa válvula de escape é fabricar um anticapitalismo alienado, tentando manter as massas apáticas e distantes de ações verdadeiramente contestatórias.

Precisamos parar de nos deixar hipnotizar por esses espelhos escuros e apavorantes. Do contrário, não conseguiremos nem evitar um fim com terror nem impedir um terror sem fim.

Leia também: A moda anticapitalista não é anticapitalista

2 comentários:

  1. Bom, gostei da crítica. Li recentemente um ensaios do Mauro Iasi sobre o Dilema das Redes, muito bom. Mais ou menos na linha do que fala, o capitalismo faz a crítica escondendo sua cara real. Sobre esse seriado eu vejo como entretenimento, histórias que são bem construídas, causam uma certa apreensão, apresentam um certo dilema. Como histórias em si gostei só da primeira, não vi todas, uma outra sequer entendi a história e a outra achei bizarra, no campo do fantástico reproduzindo as velhas histórias surradas de lobos. Essa série toda nunca me encantou, salva-se uma ou outra historia que pelo entretenimento despretensioso como história vale a pena.

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