A grande sensação das notícias tecnológicas mais recentes foi o ChatGPT, programa de Inteligência Artificial que conversa e escreve textos como se fosse gente.
Na imprensa, cronistas, jornalistas e especialistas da área conversaram com o programa e o desafiaram a escrever crônicas, reportagens, teses acadêmicas e discorrer sobre suas próprias habilidades. Descobriram o óbvio. Não há nada que ameace os raros cronistas talentosos, os jornalistas geniais e os acadêmicos sofisticados. O redator sintético escreve textos medíocres e trava conversas sem grande brilho. Mas tudo perfeitamente funcional no contexto de uma sociabilidade, mídia e produção acadêmica que já são burocratizadas e automatizadas.
Mas a novidade não deveria ser considerada fraca apenas por isso. A lógica social que está por trás da inteligência artificial tem alguns séculos. É a lógica do roubo das habilidades manuais e intelectuais dos produtores por seus exploradores. A invenção considerada fundadora desse processo é o tear mecânico, concebido no século 18. Desde então, a sabedoria milenar de várias atividades vem sendo transferida e cristalizada em ferramentas mecânicas, elétricas e eletrônicas com um único propósito: retirar lucro de trabalho não pago. Trabalho excedente sem remuneração ocultado pela operação de engenhocas e autômatos de todo tipo.
Nessa lógica, a razão de ser da indústria de calçados, vestuário e veículos não é produzir sapatos, roupas e transporte barato, eficiente e sustentável. É o lucro para poucos a partir da exploração de muitos sem diminuir o sofrimento social. Afinal, como revela recente reportagem da Folha, “Quenianos recebiam menos de US$ 2 por hora para treinar ChatGPT”.
Depois de pequenas férias, continuaremos esse chat.
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