Doses maiores

28 de agosto de 2014

PGM, o partido de William Bonner e Patrícia Poeta

A mais recente candidata entrevistada pelo Jornal Nacional, da Rede Globo, foi Marina Silva. William Bonner e Patrícia Poeta foram duros com ela. Marina teve dificuldades para responder de forma convincente ao pesado interrogatório.

Há quem veja nisso uma manobra da emissora para tentar diminuir o forte desempenho da ex-senadora nas pesquisas. Um modo de fortalecer Aécio Neves, queridinho da Globo. O problema é que o tucano foi questionado pela dupla de forma tão incisiva quanto Marina. O mesmo valendo para Dilma, é óbvio.

De fato, achar que a Globo apoiará abertamente alguma candidatura é um pouco ingênuo. Claro que a emissora mal consegue disfarçar suas preferências tucanas. Mas estamos falando do setor que é a vanguarda do Partido da Grande Mídia (PGM). Esta organização poderosa já não adere simplesmente às opções eleitorais mais fortes. Impõe-se a elas.

Trata-se de um partido, cujas alas correspondem aos grandes grupos empresariais de comunicação do País. E se elas concorrem entre si, disputando mercado, também têm fortes razões para se unir. A maior delas é impedir a democratização da mídia. Outra prioridade é manter o essencial da política econômica neoliberal.

A enorme influência ideológica do Partido da Grande Mídia faz dele um poderoso integrante da “coalizão” do grande capital. Bancos e grandes empresas fazem doações eleitorais. O PGM vai mais longe. Conta com generosos patrocínios, públicos e privados, para impor a agenda que interessa ao conjunto da classe dominante.

Circula uma piada na internete dizendo que a cada entrevista dos candidatos no Jornal Nacional, William Bonner sobe nas pesquisas. Não tem graça.

27 de agosto de 2014

A cumplicidade entre o Estado e cortadores de cabeça

O que teriam em comum a organização terrorista Estado Islâmico e as facções dos presídios brasileiros, além da preferência por degolar suas vítimas? 

O portal Opera Mundi publicou matéria de Charles Nisz com o título “Wikileaks: EUA armaram terror do ‘Estado Islâmico’”. Segundo a reportagem, os Estados Unidos se recusaram a ajudar o governo sírio a combater grupos radicais como o Estado Islâmico. Ao governo norte-americano interessava fortalecer a organização para aumentar seu controle na região.

Fernando Caulyt publicou “‘Criminalidade não se combate com prisão’, diz especialista” na Deutsche Welle. Na entrevista, Camila Nunes Dias, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência, da USP, analisou a recente rebelião na penitenciária de Cascavel, no Paraná. O motim, em que dois homens tiveram suas cabeças arrancadas, foi organizado pelo PCC.

Camila responsabiliza o encarceramento em massa por episódios como este. Os mais de meio milhão de presos nas cadeias vivendo em péssimas condições fortalecem organizações como o PCC. A prisão, diz ela, é o lugar “a partir de onde a criminalidade se articula no Brasil”. Mas a professora afirma que as “facções, até certo ponto, auxiliam o Estado ao exercerem o controle sobre a população carcerária”. Elas acabam “substituindo o Estado na organização prisional”.

Assim, quando as “autoridades” que estão dentro das prisões se desentendem com as autoridades que estão fora delas, não surgem apenas rebeliões. As facções também enviam ordens para que a violência nas ruas aumente.

Invertendo a pergunta inicial: o que é comum aos Estados americano e brasileiro? Além de muitas outras coisas, o incentivo ao terrorismo que corta cabeças.

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Bolsonaro, Constantino, Malafaia e outros neandertais

Que os neandertais compartilham 99% de seu DNA com os humanos modernos já se sabe há algum tempo. Mas estudos recentes também descobriram que eles podem ter convivido com nossa espécie por uns 5 mil anos.

Para chegar a conclusões como estas são utilizadas complexas medições químicas envolvendo carbono radioativo. No entanto, basta observar algumas personalidades famosas para concluir que os neandertais ainda estão entre nós.

Estamos falando de certos indivíduos de nossa espécie que parecem possuir inteligência e sensibilidade pré-históricas. Alguns exemplos óbvios são os jornalistas Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, Raquel Sherazade e Rodrigo Constantino. Todos “nanders” legítimos.

Constantino, por exemplo, chegou a afirmar que Miriam Leitão está certa ao exigir um pedido de desculpas do Exército por ter sido torturada, grávida, em suas dependências. Mas que ela também deveria se desculpar por ter sido comunista.

Outro a apresentar comportamento primitivo é o cantor Lobão, raro caso de involução natural. O primeiro sintoma de sua decadência sem a menor elegância foi um deboche em relação a vítimas de tortura pela ditadura militar. Reclamavam só por terem tido algumas unhas arrancadas, grunhiu ele.

Há muitos mais, infelizmente. Estão na política, como Jair Bolsonaro. Em igrejas, como Silas Malafaia e Luiz Gonzaga Bergonzini. Ou em ambas, caso do Pastor Marco Feliciano. Circulam por aqui e no exterior também. Jean Le Pen e sua filha, na França. Os fascistas do Aurora Dourada, na Grécia. O Tea Party, nos Estados Unidos.

Mas sejamos honestos. Os neandertais, aqui, servem apenas como metáfora. Os exemplos citados acima são de inteira responsabilidade de nossa espécie. E, lamentavelmente, parecem distantes da extinção.

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26 de agosto de 2014

Getúlio: um gênio a serviço de nossos inimigos

Em 24/08, sessenta anos atrás, morria Getúlio Vargas. A data foi muito comentada na grande imprensa. Mas a presidenta Dilma foi particularmente infeliz ao chamar o ex-presidente de “grande democrata”.

Não é o que mostra a excelente biografia recém-lançada por Lira Neto sobre Vargas. Ele chefiou uma ditadura por 15 anos. Fechou partidos e jornais. Autorizou a prisão e tortura de milhares de pessoas, principalmente comunistas.

Quando Vargas voltou ao poder pelo voto popular, teve enorme dificuldade para governar com o parlamento aberto e a imprensa livre. Ainda que ambos fossem dominados por gente ainda pior que ele.

Se há algo inegável sobre Getúlio é sua genialidade política. Sob seus governos, ele aperfeiçoou a dominação burguesa no Brasil. E fez isso contra a vontade de grande parte da própria burguesia. Por isso, disse certa vez: “Estou tentando salvar esses burgueses burros e eles não entenderam”.

E do quê Vargas queria salvar a burguesia? Dos movimentos sociais, do povo revoltado.

Getúlio trocou as patas de cavalo na relação com os movimentos sociais pela cooptação. Substituiu a arrogância elitista pelo apelo ao povo, por cima de partidos e instituições. Criou um Estado que funciona perfeitamente até hoje quando o objetivo é servir ao grande capital.

Eleito para o segundo mandato, Vargas foi saudado com uma marchinha de carnaval que fez enorme sucesso. Ela dizia “O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar”. Alguém capaz de manter milhões sob exploração pela força de seu sorriso também era um gênio da disputa hegemônica.

Getúlio não foi democrata. Foi um grande líder de massas a serviço de nossos inimigos.

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25 de agosto de 2014

O capitalismo racista nos Estados Unidos e aqui

“Ferguson reflete desigualdade racial ainda presente nos EUA", diz reportagem de Dennis Stute publicada na Deutsche Welle, em 10/08. A matéria refere-se à cidade americana onde o jovem negro Michael Brown foi assassinado pela polícia.

A população local reagiu com grandes manifestações. Atribui a morte ao racismo policial.

Nas manifestações surgiram cartazes em que Brown aparece vestido em traje de formatura. Seria um modo de mostrar que o jovem era bem comportado e não merecia morrer.

Um trecho da reportagem diz:

Negros estão em desvantagem em quase todos os segmentos da sociedade americana e sofrem, por exemplo, com tratamento diferenciado da polícia.

Outra matéria sobre Ferguson apareceu no portal “Outras Palavras”. Trata-se de “EUA: adeus ao direito de protestar?”, de Robert Bridge. A reportagem chama a atenção para a crescente militarização da polícia nos Estados Unidos. O resultado tem sido o tratamento da população pobre como inimigo interno, além da criminalização do direito de manifestação.

Tudo o que foi dito acima poderia facilmente ser aplicado ao Brasil.

Aqui, a população pobre também lamenta seus mortos alegando que se tratava de “trabalhadores”. Lá como cá, vale cada vez mais a lógica de que a execução de criminosos é aceitável. Entre nós, o racismo também gera condições sociais e econômicas muito piores para a população negra. A militarização da polícia é outro elemento muito semelhante nos dois países. Até uma espécie de Caveirão circulou nas ruas de Ferguson reprimindo manifestantes.

O racismo americano apresenta muitas diferenças em relação àquele que se manifesta aqui. Mas ambos têm em comum a violência racista da dominação capitalista.

21 de agosto de 2014

Sobre Marina Silva, rédeas e cabrestos

“Marina Silva toma as rédeas da campanha” disse o Globo, ontem. Referia-se ao fato de a ex-senadora ter assumido o lugar de Eduardo Campos nas eleições presidenciais.

O  exagero é evidente. Marina Silva vai ter como vice o deputado federal Beto Albuquerque. O parlamentar gaúcho encontrou no agronegócio grande parte dos doadores de sua campanha.

O partido que Marina quer construir chama-se Rede da Sustentabilidade. A sanha dos ruralistas por lucro não combina com qualquer sustentabilidade, muito menos a ambiental.

Como disse Luciana Genro em artigo no site da Carta Capital, Marina é a segunda via do PSDB. Por trás do discurso pretensamente ambientalista, está a continuidade da política econômica herdada dos tucanos e mantida pelos petistas no que ela tem de essencial.

O principal assessor econômico de Marina é Eduardo Gianetti. Ele diz, por exemplo, que é preciso trazer de volta o tripé “superávit primário, metas de inflação e câmbio flutuante”. Mas essa trindade maldita está intacta há décadas, sugando enormes recursos do orçamento público. Tirando dinheiro de serviços públicos como saúde e educação.

Como diz Luciana, as manifestações de junho mostraram que o PT já não consegue manter uma liderança segura sobre os movimentos sociais. Marina seria uma boa alternativa, caso Aécio venha a fracassar. Principalmente, porque aparenta manter certa independência.

Mas a coligação encabeçada pela ex-senadora inclui Alckmin, em São Paulo, o petista Lindberg Farias, no Rio, e o tucano Beto Richa, no Paraná. Uma candidatura com tais alianças jamais dominará as rédeas. Vai somente se acomodar a velhos cabrestos.

Eleições: no máximo, mudarão as moscas

O entrevistado do programa “Roda Viva” de 18/08 foi Mauro Paulino, diretor do Datafolha. Ele forneceu algumas informações que merecem atenção.

Com a entrada de Marina Silva na disputa, os votos brancos e nulos deixaram de ser opção para cerca de 30% dos pesquisados para voltar aos tradicionais 10%.

A identificação partidária despencou nestas eleições. Mais de 60% dos pesquisados não têm qualquer preferência desse tipo. Um recorde histórico, diz Paulino.

O desejo de mudanças disparou, com quase 70% manifestando esta disposição. Mas vários candidatos majoritários disputam a reeleição como favoritos nas pesquisas.

Para o diretor do Datafolha, alianças consideradas incoerentes não preocupam o eleitor. Muitas vezes, quem vota mistura candidaturas com consideráveis divergências ideológicas ou programáticas entre si.

Estes dados permitem tirar algumas conclusões.

Nada indica que a migração de votos nulos e brancos para Marina Silva seja uma opção programática clara. A nova candidata do PSB não tem conseguido apresentar muito mais que uma vaga aparência de renovação.

A importância dos partidos declina junto com a relevância dos programas e das propostas, que poderiam revelar mais facilmente os interesses de classe por trás da disputa eleitoral.

O elevado desejo de mudanças se mantém nos limites estreitos das alternativas dominantes.

Esses elementos apontam para um papel crescente do individualismo despolitizado na definição dos resultados eleitorais. Esta tendência já vinha imperando no plano econômico e social. Mostra-se cada vez mais forte também na política institucional. Produto de décadas de hegemonia neoliberal.  

Talvez, até haja alguma renovação. Mas com ideologias, programas e propostas em segundo plano, a grande tendência é mudarem apenas as moscas.

20 de agosto de 2014

Turbinando o PIB com prostituição, tráfico, repressão e guerra

Uma notícia preocupante surgiu no cenário econômico. O PIB da Alemanha teve uma queda de 0,2% entre abril e junho. É a crise econômica atingindo o motor da economia da União Europeia.

Uma informação relacionada a estes números também chama a atenção. Dizem os jornais que a retração econômica seria maior se a Alemanha não tivesse incluído no cálculo do PIB negócios ilegais, como contrabando e tráfico de drogas.
                                            
A orientação também vem sendo seguida por outros países. É o caso do Reino Unido, que, em maio passado, anunciou que o tráfico de drogas e a prostituição movimentam cerca de 16 bilhões de dólares anuais.

A Itália disse que vai fazer o mesmo em relação ao cálculo de seu PIB. Ingleses e italianos não estão sozinhos na Europa. Adotam critérios semelhantes Estônia, Áustria, Eslovênia, Finlândia, Suécia e Noruega.

Uma das razões para a adoção dessa medida seria a uniformização contábil das economias na região. Afinal, na Holanda boa parte dessas atividades é legalizada.

O estado de Nevada, nos Estados Unidos, está bem distante da Europa. No entanto, também contabiliza atividades de prostituição em seu PIB.

Tudo isso mostra o quanto são hipócritas os governos que são adeptos da “guerra às drogas” e defensores da moral e dos bons costumes. Muitas daquelas atividades já deveriam estar legalizadas. Ainda que nem todas, como a exploração da prostituição.

O problema é que outro ramo muito lucrativo seria afetado. Trata-se da indústria da segurança e seus enormes lucros e gastos públicos com armamentos e aparatos repressivos. Sem falar no pretexto para controlar e vigiar nossas vidas.

Leia também: A droga corre nas veias do sistema bancário

19 de agosto de 2014

Desertos de esperança e decência

Ainda jovem, o soldado Drogo é enviado para uma distante fortaleza, junto a um território de povos bárbaros. É de lá que a qualquer momento deve partir um ataque, garantem seus superiores. Mas o tempo se arrasta e o combate com as glórias que certamente traria não acontece.

Quando o inimigo finalmente ameaça atacar, Drogo está velho demais para combater. É dispensado e deixa o forte. Morre a caminho de sua terra natal.

Esta é a triste história do livro “Deserto dos Tártaros”, de Dino Buzzati. A obra se presta a diversas interpretações. Uma delas, certamente, diz respeito às fortalezas que se multiplicam pelo mundo. Sempre sob o pretexto de prevenir ataques de “bárbaros”.

São as muralhas com que Israel cerca e asfixia os palestinos. O muro que impede a entrada de mexicanos nos Estados Unidos. As fronteiras que isolam a Europa próspera de europeus, africanos, asiáticos e outros desafortunados.

Liberdade de circulação, só para as mercadorias. Principalmente, aquelas feitas nos países periféricos pelos pobres que não podem seguir o mesmo caminho que o produto de seu trabalho.

Os “bárbaros”, tão temidos, não passam de maltrapilhos, como mostram as recentes ondas de africanos chegando a Itália e Espanha, implorando que alguém explore seu trabalho.

Essas hordas de pedintes são fabricadas aos montes pela desigualdade capitalista, que transforma grande parte do mundo em desertos de esperança e decência.

Será assim enquanto a grande maioria continuar reduzida ao papel imposto a Drogo. Aguardando seu fim desonroso e sem glórias. Inconsciente de que os verdadeiros bárbaros estão ao seu redor, dentro das fortalezas, e são seus próprios comandantes.

Leia também: A suave xenofobia oficial a serviço do Capital

18 de agosto de 2014

As eleições presidenciais e a ilusão democrática

    Latuff
A morte de Eduardo Campos desorganizou o cenário das eleições presidenciais. As primeiras pesquisas indicam Marina Silva com boas chances de sair vitoriosa. Mas a verdade é que permanecemos com mais do mesmo. Não apenas quanto a nomes e propostas.

É o próprio sistema político que se mostra cada vez mais ilusório. Como diz o título de um artigo de Slavoj Zizek, “Nosso inimigo é a ilusão democrática”. Ao comentar as limitações da busca por transformações pela via eleitoral, por exemplo, o texto afirma:

Os eleitores não votam para decidir quem será proprietário do quê, ou para decidir sobre as relações entre os trabalhadores numa fábrica. Essas coisas são deixadas entregues a processos fora da esfera política, e é ilusão supor que essas coisas possam ser mudadas com, simplesmente, alguma ‘ampliação’ da democracia: por exemplo, criando bancos ‘democráticos’ controlados pelo povo.

Mudanças radicais nesse campo têm de ser feitas fora da esfera de instrumentos democráticos, como direitos humanos e outros. Esses instrumentos democráticos têm um papel positivo, é claro, mas é preciso ter em mente que todos os mecanismos democráticos são parte de um aparelho de estado burguês previsto para garantir, sem perturbações, o funcionamento da produção capitalista.

Badiou acertou ao dizer que o nome do pior inimigo, hoje, não é “capitalismo”, “império”, “exploração” ou coisas do tipo, mas, sim “democracia”. Hoje, o que impede qualquer genuína transformação das relações capitalistas é a ‘ilusão democrática’, a aceitação de mecanismos democráticos burgueses como únicos meios legítimos de mudança.

Estas conclusões podem não valer para qualquer lugar e momento. Mas no Brasil atual, batem na nossa cara.

14 de agosto de 2014

Rosas não falam, mas recomenda-se ouvi-las

   www.ratocinza.com.br
Cartola dizia que as rosas não falam, mas isso nunca o impediu de queixar-se a elas. O botânico italiano Stefano Mancuso daria razão ao poeta. Ele garante: “As plantas têm neurônios, são seres inteligentes”. Este é o título da entrevista que ele deu ao jornal La Vanguardia, em 2010.

Segundo Mancuso, as plantas “se movem e tomam decisões, mas em um tempo mais longo que o homem”. Também trocam mensagens. “Em uma selva, todas as plantas estão em comunicação subterrânea através das raízes”, diz ele. Elas “trabalham em rede, como a internet” e as pontas das raízes funcionariam como neurônios.

Estes seres que vivem de luz também manipulam os animais com seu pólen e outras substâncias. E até matam alguns deles. É o que teria acontecido em Botsuana, quando 200 mil antílopes foram introduzidos em ambiente que não era o seu. Começaram a comer acácias demais. Estas reagiram, produzindo veneno e matando 10 mil deles.

Nem nós estamos livres. Pense no café, tabaco, ópio e marijuana, provoca Mancuso. São só algumas das plantas de que somos dependentes. Literalmente.

Tudo isso é muito polêmico, claro. Mas é difícil discordar deste trecho:

Caso amanhã as plantas do planeta desaparecessem, em um mês toda a vida se extinguiria, visto que não haveria nem comida, nem oxigênio. Todo o oxigênio que respiramos vem delas. Mas se nós desaparecêssemos, nada iria ocorrer. Somos dependentes das plantas, mas as plantas não são de nós. Quem é dependente está em uma situação inferior, ou não?

Portanto, ao passar por um canteiro, pare e ouça. Deixe as queixas para os poetas.

Leia a entrevista, clicando aqui

Leia também: O egoísmo de classe escolheu a catástrofe ambiental

O povo judeu também é vítima do sionismo

O governo de Israel acusa seus críticos de antissemitismo. Não é verdade. Antissemitismo é racismo contra os judeus. Inaceitável. O que a maioria dos que condenam Israel combate é o sionismo. Uma crença que atribui ao povo judeu direito sagrado sobre a Palestina.Um direito que justificaria tudo, inclusive matar crianças e bombardear escolas e hospitais.

Um texto esclarecedor sobre essa questão está no portal Voltaire.net. Trata-se de “Quem é o inimigo?”, de Thierry Meyssan. Através dele ficamos sabendo que o sionismo surgiu com a Revolução Inglesa de 1688. Os calvinistas, que derrubaram a nobreza, acreditavam que para o bem dos cristãos ingleses, os judeus deveriam retornar à Palestina. Voltar a “Sion”, a Terra Santa.

O sionismo sairia fortalecido da Guerra da Independência e da Guerra Civil dos Estados Unidos, cujos vencedores eram seus adeptos. Ele também voltaria a ganhar força sob a regência da Rainha Vitória. Trata-se, portanto, de uma ideologia com enorme peso entre os setores dirigentes das sociedades inglesa e estadunidense.

O acordo em torno do sionismo foi elemento importante na reaproximação entre os britânicos e seus ex-colonos  da América do Norte, diz Meyssan. E no século 20, a crença no direito judeu sobre territórios do Oriente Médio serviu ao controle imperialista sobre uma das regiões mais estratégicas do planeta.

Portanto, diz o autor, o “sionismo nunca teve como objetivo ‘salvar o povo judeu, dando-lhe um lar’, mas sim fazer triunfar o imperialismo anglo-saxônico envolvendo nisso os israelitas”. Desse ponto de vista, o povo judeu também é vítima do sionismo. Mesmo que esteja longe de ser a maior delas.

Leia também: Gaza e os cachorros loucos de Hollywood

12 de agosto de 2014

Gaza e os cachorros loucos de Hollywood

Penélope Cruz e Javier Bardem estão entre os astros de cinema que assinaram carta aberta contra o genocídio israelense em Gaza. O documento afirma que “lares palestinos estão sendo destruídos, eles não têm água, luz e acesso livre aos hospitais, escolas e abrigos, enquanto a comunidade internacional não faz nada.”

É a mais pura verdade. Apesar disso, a atitude teria levado os estúdios de Hollywood a incluir os signatários em uma lista suja. São acusados de fazer o jogo dos inimigos do povo judeu. Mas os chefões do cinema estadunidense não têm a menor moral para fazer tal acusação.

É o que mostra “A Colaboração, o Pacto entre Hollywood e o Nazismo”, de Ben Urwand. Recém-lançado no Brasil, o livro investiga as negociações dos estúdios estadunidenses com o governo de Hitler na década de 1930.

A obra revela que, para não desagradar os nazistas e perder mercado na Alemanha, os executivos de Los Angeles censuravam seus próprios filmes. Fecharam os olhos para a perseguição aos judeus, apesar de muitos deles mesmos serem de origem judia.

Em 1933, por exemplo, Herman J. Mankiewicz escreveu um roteiro sobre a situação dos judeus alemães. O nome do filme seria “O Cachorro Louco da Europa”, óbvia referência a Hitler. O projeto foi engavetado pelos patrões de Mankiewicz.

Mas a indústria cinematográfica não estava sozinha. Ford, Coca-Cola e IBM estão entre as empresas que mantiveram excelentes relações com os nazistas. Só os abandonaram quando se tornou inconveniente associarem suas marcas aos massacres nos campos de concentração.

A loucura canina nunca deixou de fazer vítimas e adeptos. Na Europa e fora dela.

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11 de agosto de 2014

O Ebola e a pior das epidemias

O Ebola já matou mais de mil pessoas na África. Em 05/08, o portal “Outras Palavras” publicou reportagem de Jane Merrick sobre a questão. A matéria cita John Ashton, presidente do Instituto de Saúde Pública do Reino Unido. Comparando a epidemia atual à da Aids, ele afirmou:

Em ambos os casos, parece que o envolvimento de grupos minoritários menos poderosos contribuiu para a resposta tardia e o fracasso em mobilizar recursos médicos internacionais adequados (…) No caso da Aids, levou anos para que o financiamento de pesquisa adequada fosse posto em prática, e apenas quando os chamados grupos “inocentes” se envolveram (mulheres e crianças, pacientes hemofílicos e homens heterossexuais) a mídia, os políticos, a comunidade científica e as instituições financiadoras levantaram-se e tomaram conhecimento.

Ashton responsabiliza a indústria farmacêutica, que volta seus esforços apenas para mercados rentáveis. A Aids talvez tenha sido uma das primeiras epidemias a revelar o surgimento do que os especialistas chamam de “medicalização da vida”.

Segundo Suely Rozenfeld, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, a medicalização:

... leva pessoas saudáveis a acreditarem que estão doentes e pessoas que estão um pouco doentes a acreditarem que estão muito doentes. Isso acaba gerando um enorme aumento de mercado para vendedores e administradores de insumos de saúde, como os medicamentos, os equipamentos e os exames laboratoriais, entre outros. Leia mais aqui.

Não à toa, a produção farmacêutica é a segunda mais rentável do mundo, logo atrás da indústria bélica. É a produção de morte e doença para benefício de alguns poucos e poderosos monopólios. Efeito trágico da maior das epidemias: a praga capitalista.

As eleições e a reprodução do velho

Os homens sempre foram, em política, vítimas ingênuas do engano dos outros e do próprio e continuarão a sê-lo enquanto não aprendem a descobrir por trás de todas as frases, declarações e promessas morais, religiosas, políticas e sociais, os interesses de uma ou de outra classe.

A frase acima é do livro “Que fazer?”, publicado por Lênin, em 1902, na Rússia. Na época, não havia eleições naquele país. Mas a citação ajuda a interpretar alguns números das próximas eleições.

Entre 1994 e 2010, o custo das eleições presidenciais cresceu 85%. Mas em relação às eleições de 1989, quando as doações de pessoas jurídicas eram proibidas, o aumento chega a 1.138%. No mesmo período, o eleitorado brasileiro apenas dobrou.

As candidaturas Dilma, Aécio e Campos receberam 99% das doações. Três empresas bancam 65% da arrecadação: Friboi, Ambev e OAS.

Eleger um deputado federal pode custar até R$ 5 milhões.

Voltando a Lênin, no mesmo livro:

Os partidários de reformas e melhoramentos ver-se-ão sempre enganados pelos defensores do velho, enquanto não compreenderem que toda a instituição velha, por mais bárbara e apodrecida que pareça, se mantém pela força de umas ou de outras classes dominantes. E para vencer a resistência dessas classes só há um meio: encontrar na própria sociedade que nos rodeia, educar e organizar para a luta, os elementos que possam - e, pela sua situação social, devam - formar a força capaz de varrer o velho e criar o novo.

Eleições podem ser um meio importante para criar o novo. Por isso, é necessário disputá-las. Mas as próximas devem apenas reproduzir o velho.

Leia também: A provável vitória eleitoral do neoliberalismo criativo

7 de agosto de 2014

O banco dos BRICS, abutres e urubus

Em 15 e 16/07, representantes dos “Brics” (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) se reuniram em Fortaleza, Ceará. Anunciaram a criação de um banco de desenvolvimento para financiar projetos do grupo e de outros “países em desenvolvimento”.

Mas a nova instituição já surge a serviço de velhos objetivos. É o que diz a “Carta de Fortaleza”, divulgada por movimentos populares de várias parte do mundo. Segundo o documento, o modelo de desenvolvimento proposto é:

... baseado na extração intensiva da natureza, na concentração do poder e da riqueza e na adaptação jurídica e política das instituições aos interesses dos grandes mercados e no agravamento das injustiças sociais e ambientais.

O novo banco tem sido considerado uma forma de garantir proteção econômica e agilizar a ajuda financeira a seus membros em caso de crise. Mas há um enorme desnível de poder interno ao grupo.

A China é a segunda economia do mundo. Prestes a se tornar a primeira. Além disso, seu parque industrial deixa o restante dos países do grupo no chinelo. Compra commodities de baixo valor acumulado e vende tecnologia de ponta. Não à toa, a sede do novo banco será em Xangai.

Há quem pense que a medida contribuirá para afastar a influência das “potências imperialistas” ou fugir dos riscos dos chamados “fundos abutres”. Pura ilusão. De um lado, o imperialismo esmagador do capital chinês. De outro lado, não há barreiras capazes de impedir que papéis das dívidas públicas venham a cair em garras rapinantes, como aconteceu com a Argentina.

No máximo, trocaríamos abutres por urubus, mas isso não parece nada tranquilizador.

6 de agosto de 2014

A provável vitória eleitoral do neoliberalismo criativo

São grandes as probabilidades de que o Brasil enfrente uma grave crise econômica. Mas não a tempo de influenciar o resultado das eleições.

É o que mostra, por exemplo, a reportagem “Quatro temas econômicos que devem dominar a eleição presidencial”, de Ruth Costas, publicada pela BBC Brasil em 05/08.

A matéria destaca primeiramente o crescimento econômico. Em 2010, quando Dilma foi eleita, o Brasil cresceu 7,5%. Este número pode ficar abaixo do 1% em 2014.

Mas segundo Carlos Melo, cientista político do Insper, o voto é influenciado principalmente pela renda e pelo emprego. E nestes aspectos, a candidatura petista não tem muito com que se preocupar.

Como diz André Biancarelli, da Unicamp, em relação “ao mercado de trabalho, Dilma foi melhor até que Lula. Nos últimos anos, o desemprego caiu para patamares historicamente baixos e a renda dos trabalhadores continuou a crescer”.

Quanto à inflação, ninguém nega que esteja elevada. Mas Renato Perissinotto, cientista político da Universidade Federal do Paraná, não vê maiores problemas. Apesar do alarmismo da grande mídia, “a alta de preços tem ficado muito próxima ao teto da meta definida pelo Banco Central, de 6,5%”.

Por fim, há a questão social, sobre a qual o cientista político David Fleischer, da UNB, afirma: "Só de eleitores ligados ao Bolsa Família temos algo em torno de 40 a 50 milhões". E estes votos são majoritariamente do governo.

O problema é que os mandamentos neoliberais continuam sólidos. É o caso do pagamento da dívida pública, superávit primário, juros estratosféricos, monopólios dominando cada vez mais a economia.

Provavelmente, a vitória eleitoral será da ala criativa do neoliberalismo.

Sinais de uma crise muito possível

  Bira Dantas
“O Brasil à beira de uma nova crise externa?”, pergunta editorial da revista Retrato do Brasil, publicado em 30/07. O texto traz alguns sinais muito preocupantes em relação à nossa situação a econômica.

O artigo relaciona o saldo negativo das transações correntes do País à ocorrência de crises econômicas. A primeira delas teria sido a de 1982, quando o déficit ficou em 6%. Outra grave crise ocorreu em 1998 e o saldo era 4,3% negativo. Atualmente, estamos com 3,47% de déficit.

Em quase 12 anos de governos petistas, diz o artigo, o rombo total ultrapassou os 300 bilhões de dólares. O saldo foi positivo em mais de 40 bilhões de dólares entre 2005 e 2007. Em 2013, caiu para 2,5 bilhões de dólares negativos.

A desindustrialização tem papel importante nessa conta. Apenas com o aluguel de equipamentos como sondas para exploração de petróleo, modernas retroescavadeiras e colheitadeiras, por exemplo, o País vai gastar 19 bilhões de dólares. O valor equivale a quase oito vezes o saldo comercial esperado para 2014.

Quanto às supostas enormes reservas monetárias do País, elas podem desaparecer se houver um novo “grande ajuste das finanças internacionais”. O volume atual está em 380 bilhões de dólares. Mas entre julho e dezembro de 2008, momento agudo da crise mundial, deixaram o País 347 bilhões. E de junho a setembro de 2011, foram embora 226 bilhões.

Se estes números servirem como aviso, a resposta à pergunta do artigo é perigosamente afirmativa. A oposição de direita dirá que é culpa de um governo intervencionista e desastroso. Desastroso, sim, mas porque se manteve preso à lógica neoliberal.



4 de agosto de 2014

O novo templo e seus vendilhões

Para alguns, a famosa passagem bíblica em que Jesus expulsa os “vendilhões” do templo é a mais radical dos evangelhos. A atitude atingiu a nobreza clerical que se beneficiava do aluguel daquele espaço sagrado. Neste momento o líder dos judeus pobres teria atraído contra si o ódio da classe dominante judia e pavimentado seu caminho para a crucificação.

Mais de dois mil anos depois, a grande maioria dos templos são palácios luxuosos disfarçados como igrejas e catedrais. Seus pregadores, príncipes que envergam as roupas mais luxuosas. Devassos de fala mansa, convivem com o poder temporal da forma mais promíscua. O Vaticano tem até um banco, tão rico quanto corrupto.

Mas os cristãos protestantes não ficam atrás. Principalmente as ramificações neopentecostais que adoram a ostentação e abençoam o acúmulo de bens materiais. A evidência mais recente disso é o Templo de Salomão, inaugurado pela Igreja Universal do Reino de Deus, em São Paulo.

Três vezes maior que a Basílica de Aparecida do Norte, a construção simboliza todo o poderio a que chegou a organização de Edir Macedo. À inauguração compareceram a presidenta do País, o governador paulista e o prefeito paulistano. Todos de olho no voto dos quase 2 milhões de fiéis da igreja. Mas não só.

Adentrar o novo santuário custa 45 reais e os dízimos serão recolhidos por uma moderna esteira rolante. Tamanho potencial econômico não pode ser desprezado. Afinal, levantamento recente da Justiça Eleitoral mostrou que entre 1994 e 2010, só o custo das eleições presidenciais cresceu 85%, de R$ 190 milhões para R$ 352 milhões.

Um novo templo para vendilhões antigos e recentes.

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Israel semeou o Hamas

Tawfik Gebreel, Bushra Shanan
e Belal Khaled
Após a 2ª Guerra, potências imperialistas impuseram a criação e o fortalecimento do Estado de Israel no Oriente Médio. Desse modo, criaram conflitos na região para melhor dominar seus territórios ricos em petróleo.

Essa mesma tática Israel também acabou usando em relação aos palestinos. É mais ou menos o que a afirmou Guila Flint, em entrevista ao programa Espaço Público, exibida na TV Brasil em 22/07. 

A jornalista brasileira mora em Israel há 20 anos. Ela afirmou ser público e notório que o Estado de Israel incentivou o surgimento e o fortalecimento do Hamas em terras palestinas nos anos 1980.

O objetivo era enfraquecer o "Movimento de Libertação Nacional da Palestina", o Fatah. Até então, essa frente de organizações liderava sozinha a resistência contra a ocupação israelense das terras palestinas.

Mais tarde, em 2005, o governo direitista de Ariel Sharon retirou as tropas israelenses da Faixa de Gaza sem avisar o Fatah. Como resultado, criou-se um “vácuo político” naquele território, que foi ocupado pelo Hamas.

Foi assim, diz Guila, que uma “organização laica e democrática” perdeu espaço para um movimento religioso e extremista. O consequente aumento das ações violentas ajudava a justificar a necessidade de eliminar o povo palestino na região.

Mas assim como os Estados Unidos criaram as tropas de Bin Laden para vê-las se voltarem contra si, o Estado de Israel pode colher uma terrível tempestade dos ventos que semeou.

Hoje, os sionistas fazem chover fogo em Gaza. Mas como aconteceu muitas vezes na História, Israel pode ganhar a guerra e perder a paz.

1 de agosto de 2014

Quando nos rendemos aos ídolos do inimigo



“Os ídolos da nova geração de brasileiros” é o título da reportagem de Rafael Sigollo, publicada pelo Valor, em 30/07. A matéria refere-se a uma pesquisa feita com 51.674 jovens brasileiros entre 17 e 26 anos para saber quem são seus ídolos.

Barack Obama aparece em primeiro, com pouco mais da metade das preferências. Depois vieram Steve Jobs e Bill Gates, os empresários brasileiros Jorge Paulo Lemann e Flávio Augusto da Silva e Mark Zuckerberg, do Facebook.

Presentes em 2013, Lula e Dilma desapareceram agora. Eike Batista também chegou a figurar em lisas passadas, mas deu lugar a Silvio Santos. Joaquim Barbosa, Roberto Justus e o Papa Francisco também aparecem entre os dez primeiros.

Em uma lista contendo apenas líderes brasileiros, aparece Bel Pesce, 26 anos de idade. Ela é fundadora da escola “FazINOVA”. Aos 17 anos, conseguiu ser aprovada no Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos. Trabalhou na Microsoft, Google e Deutsche Bank e, após a conclusão do curso, mudou-se para o Vale do Silício.

O caso de Bel é a exceção das exceções. Ela venceu uma disputa típica de um sistema que só produz desigualdade social. Apesar disso, milhões de jovens acham que podem seguir seu caminho. Mas tudo isso só comprova o que disse Marx há 150 anos: as ideias dominantes em uma sociedade são as ideias da classe dominante.

O pior acontece quando os que dizem combater essa lógica rendem-se a ela. Travam disputas selvagens pelo poder nas burocracias partidárias, sindicais e organizações de luta. Jovens ou veteranos, envelhecem cultuando os ídolos do inimigo.

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