No segundo volume de “Escravidão”, Laurentino Gomes cita a historiadora Adriana Romeiro, da Unicamp, segundo a qual:
...durante o período colonial brasileiro enriquecer no exercício de um cargo público não constituía, por si só, em delito. Ao contrário, esperava-se que os funcionários reais aproveitassem as oportunidades para acumular fortunas que pudessem engrandecer suas casas e redes de clientelas e parentelas. É nesse contexto que, segundo a historiadora, se deve entender a frase pronunciada pelo rei dom João II em 1495 ao se despedir do capitão-mor Lopo Soares de Albergaria, recém-nomeado governador de um entreposto de tráfico de escravos na costa da África: “Eu vos mando à Mina, não sejais tão néscio [tolo] que venhais de lá pobre”.
Mas, avisa Adriana, os oficiais da Coroa deveriam se manter dentro de certos limites de maneira a salvar as aparências e não ferir os interesses do rei. Como disse o marquês do Lavradio, vice-rei do Brasil: “O caso não está em ser gentil-homem, o ponto está que a todos assim pareça”.
Já o coronel de infantaria Luís Vahia Monteiro, governador do Rio de Janeiro de 1725 a 1732, afirmou em carta ao rei dom João V: “Senhor, nesta terra todos roubam, só eu não roubo”.
Onde todos roubavam e trapaceavam, natural que escravos fizessem o mesmo. Mas nesse caso os “crimes” mais frequentes envolviam furtos de sobras e estoques, consumidos às escondidas nas senzalas ou vendidos. E a punição, quase certa e terrível.
Eis porque um ditado popular dizia “Nosso preto furta galinha, furta saco de feijão. Sinhô branco quando furta, furta prata e patacão”.
Não mudou muita coisa.
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