Doses maiores

7 de junho de 2015

O obscuro fichário da repressão

“Obscuro fichário dos artistas mundanos” é o nome de um projeto criado por Clarice Hoffmann. Trata-se de pesquisa sobre artistas investigados e fichados em Pernambuco entre 1934 e 1958 pelos aparelhos de repressão da “ordem política”.

O Globo trouxe matéria sobre o projeto em 03/06. Há aspectos que seriam pitorescos não representassem mais um exemplo da triste história da repressão política do País. Artistas eram suspeitos apenas por assumir atitudes e posturas fora das regras rígidas de um conservadorismo tão tacanho quanto brutal.

Um dos casos é o da atriz e cantora Anita Palmero, detida por causa de suas gargalhadas escandalosas diante de “autoridades” no saguão de um hotel. Outro exemplo é Sixto Argentino Gallo, anão anunciado como o “menor homem do mundo” pelo Circo Hispano-americano.

Norberto Americo Aymonino tornou-se alvo de investigações por se apresentar “em toilette feminina”. Em determinado trecho do inquérito, a estupidez dos investigadores perguntava: “No caso de mobilização, qual seria a situação de Aymonino, o transformista?”

A matéria informa que o período Vargas foi marcado pelo pensamento eugenista, que considerava possível identificar um criminoso por “conta de sua constituição corpórea”. Mas é importante observar que o período coberto pela pesquisa inclui tanto governos eleitos como ditaduras. Na verdade, trata-se de uma política assumida pelo Estado, que continuou em vigência até a ditadura militar e a ultrapassou.

Ou é falso dizer que a repressão policial, seja política ou não, atinge em especial pessoas tornadas suspeitas por traços de sua “constituição corpórea”, principalmente os que têm a pele escura e ainda ousam fazer arte de resistência nas ruas e em suas comunidades?

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