Copacabana,
meia-noite. Estouram os fogos. A multidão olha para o espetáculo. Muitos
caminham até perto do mar, mas ninguém se molha ou dá os tradicionais sete pulinhos.
As oferendas a Iemanjá também não deixam a areia. Ficam encostadas no Muro. É nele
que está sendo projetada uma sequência de cenas em alta definição, gravadas em
réveillons antigos. Do tempo em que não havia o Muro.
O Muro
já existe há dez anos, quando as águas do oceano começaram a invadir a Av.
Atlântica. Já antes do século 21, não faltaram alertas sobre os efeitos da
elevação do nível do mar na orla carioca, mais uma das consequências do
aquecimento global. As autoridades locais continuaram ignorando o perigo.
Preferiram, por exemplo, gastar enormes recursos para atrair turistas que
começariam a sumir diante de uma cidade cada vez mais ameaçada por águas sujas.
A
construção isolou do mar os moradores e os poucos visitantes de Copacabana.
Uma das praias mais famosas do mundo reduzida a um aterro de areia que termina em
um paredão. Do oceano, só o marulho das águas batendo no outro lado da grande
barreira.
Acima da
multidão, em suas janelas, moradores dos prédios da Av. Atlântica contemplam
alguns navios de cruzeiro navegando além da barreira de concreto. São os privilegiados
da terra firme trocando olhares com os privilegiados embarcados nos enormes
iates. Parecem só um pouco menos tristes que a multidão que os ignora,
vários andares abaixo. Buscam, todos, algum consolo nas imagens projetadas no
Muro.
É
meia-noite. Todos gritam “Feliz 2060!”. O som das palavras bate no paredão e volta num eco desanimado.
Baseado
no artigo “Rio debaixo d’água e o fim da praia de Copacabana”, de José Eustáquio Diniz Alves.
Nenhum comentário:
Postar um comentário