Doses maiores

18 de novembro de 2022

Sou o Deus que transtorna, diz o Capital

Os tempos anunciados chegaram: como os monstros vorazes dos mares e as feras raivosas dos bosques, os homens se devoram selvagemente.

“Trabalhe, e a escassez fugirá de você; trabalhe e seus celeiros ficarão cheios de provisões”, diz a sabedoria antiga.

Eu digo: “Trabalho, constrangimento e miséria serão seus companheiros fiéis; trabalhe e você esvaziará sua casa no Monte da Piedade.”

Eu sou o Deus que transtorna os impérios: sob meu jugo igualitário submeto os orgulhosos; reduzo a individualidade humana à insolência e ao egoísmo; torno a humanidade estúpida para a igualdade. Conduzo trabalhadores e capitalistas ao desenvolvimento comunista da sociedade futura.

Os homens expulsaram do céu Brahma, Júpiter, Jeová, Jesus, Alá... Eu me suicido.

Quando o comunismo for a lei da sociedade, terminará o reinado do Capital, o Deus que encarna as gerações do passado e do presente. O Capital não dominará mais o mundo: obedecerá ao trabalhador, a quem odeia. O homem não mais se ajoelhará diante do trabalho de suas mãos e de seu cérebro; ele se levantará e, de pé, olhará para a natureza, como um mestre.

Os trechos acima encerram as pílulas sobre o livro “A Religião do Capital”, de Paul Lafargue.

A título de breves comentários, importante destacar o caráter suicida que o autor parece atribuir ao Capital. Uma ideia que não encontra fundamento nos escritos de Marx, autor que inspira a obra de Lafargue.

Quanto a considerar o animal humano como ser destinado ao papel de “mestre da natureza”, apresenta-se em descompasso com o debate ecológico atual, que denuncia o caráter ambientalmente destrutivo que tal concepção pressupõe.

No mais, amém!

Leia também: Eu sou o Deus da tormenta e do sofrimento

2 comentários:

  1. Enfim, o que ia dizer, amém. Acho que a forma apoteótica das frases são mais para fazer junção com as bíblicas, mais imagem e menos para se aceitar seu conteúdo literalmente.

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