Doses maiores

28 de janeiro de 2022

Tancredo, Lula e transações pelo alto

Em 26/01/2022, Elio Gaspari publicou o artigo “Lula está um passo à frente”, sobre os esforços do ex-presidente para se mostrar moderado.

Mas interessante, mesmo, foi o colunista comparar o petista a Tancredo Neves, quando este conseguiu ser eleito presidente no Colégio Eleitoral em 1985, desalojando os generais do Palácio do Planalto.

Ocorre que, naquele momento, o PT foi o único partido a boicotar a votação. Tratava-se de uma “transação” pelo alto, justificou Lula. Ele estava correto. A vitória de Tancredo inaugurou a Nova República, cujo caráter conservador garantiu, por exemplo, a impunidade aos militares que viria a parir criaturas como Bolsonaro.

Mas é exatamente uma “transação” parecida o que Lula está tentando agora. A possibilidade de fazer de Alckmin seu vice nas próximas eleições sendo um dos sinais mais claros de tal pretensão.

Uma diferença é que a oposição institucional à ditadura só conseguiu fazer valer seu projeto 20 anos após o golpe empresarial-militar. Lula está tentando negociar algo semelhante apenas seis anos depois do golpe parlamentar.

Mas a diferença fundamental é que na época do Colégio Eleitoral havia um polo de oposição popular e de esquerda se consolidando através de organização pela base e muitas lutas.

O problema é que esse polo acabou se dissolvendo na institucionalidade e nada foi construído em seu lugar. Lula chegou à Presidência, mas totalmente vulnerável, como prova sua prisão.

A tentativa de reação por dentro do golpe é o que nos restou. Vai ser difícil, mas é preciso transformar esse péssimo ponto de chegada em ponto de partida. Com Lula e contra ele.

Leia também: Lula, o cavalo do terreiro nacional

5 comentários:

  1. Ih, complicado já vai ser essa campanha com essa frente ampla até doer com Lula. Fazendo esse movimento pendular de ser a favor e contra, nem entre nós vamos nos entender. Bjs e boa sorte para nós. Quer dizer, se conquistarmos o menos mal.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Acho que não fui claro no final. Na eleição, somos Lula sem dúvida. No governo, nem é tanto o caso de ser contra, mas de nos defendermos dos ataques que certamente virão, ainda que muito menos do que sob Bolsonaro.

      Excluir
    2. Aliás, algo parecido aconteceu no primeiro governo Lula, ainda que em circunstâncias bem diferentes. A primeira grande medida do governo Lula em 2003 foi anunciar a reforma da previdência, a mesma contra a qual boa parte do movimento sindical se colocava contra há duas décadas. Isso abriu uma crise com alguns setores da esquerda, mas Lula sabia que mesmo assim ele tinha pouco a perder deste lado do espectro político, enquanto se mostrava confiável para o outro lado.

      Excluir
  2. Sempre comentários ponderados e lúcidos. Obrigada.

    ResponderExcluir