O massacre do Charlie Hebdo provocou um debate sobre os limites do humor. Mas o
risco é atribuir ao mau gosto humorístico do semanário francês a responsabilidade
pelo ataque que sofreu. Seria como culpar a mulher que foi vítima de um estupro
pela forma como se veste.
Feita a ressalva, digamos, simplesmente, que os limites do humor se manifestam quando
a piada não tem graça. Não existem anedotas que levem todos a rir ou a sorrir. Muitas
vezes, há uma vítima que não acha engraçado ser objeto do alegre desprezo alheio.
A questão é a reação. A resposta pode ir do sorriso amarelo ao uso de fuzis e
bombas.
Mas entre um extremo e outro, há várias consequências possíveis. Quem acha
graça em ofensas a homossexuais, mulheres, minorias religiosas, não brancos, dificilmente
limita-se a gargalhar. Também humilha, discrimina, espanca, mata. Na grande maioria
dos casos, com a tolerância ou cumplicidade dos que deveriam impedir ou punir tais
comportamentos.
No mundo todo, o Estado costuma penalizar com rigor apenas quem zomba das crenças,
valores, convicções, verdades do grupo social dominante. E esta diferença de
tratamento coroa a desigualdade econômica e a injustiça social que atingem minorias
discriminadas ou maiorias exploradas. Em geral, as primeiras fazem parte das últimas
e a combinação resulta desastrosa.
O massacre de Paris de forma alguma pode ser justificado, mas muitos elementos presentes
na atual sociedade francesa podem explicá-lo. Entre eles, a islamofobia e o
cadáver político de François Hollande ressuscitando no funeral dos cartunistas
e deixando-se fotografar em um porta-aviões nuclear. São atitudes como essas que
transformam piadas sem graça em desgraça.
Leia também: Pisoteando os cadáveres do “Charlie
Hebdo”
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