Doses maiores

5 de janeiro de 2015

“O Abutre” e a meritocracia da rapina

“O Abutre”, de Dan Gilroy, é um bom filme e uma ácida crítica à mídia empresarial e ao empreendedorismo neoliberal.

Jake Gyllenhaal é Louis Bloom, que inicia o filme furtando fios de cobre para vender. Um acidente lhe mostra um caminho mais rentável, legalizado, mas tão imoral quanto roubar.

Trata-se de filmar e vender para a TV cenas de desastres, crimes, perseguições policiais. Bem no estilo de programas como “Cidade Alerta” e “Brasil Urgente”. Quanto mais vítimas, destruição e desrespeito, mais audiência baseada em emoções fáceis e preconceitos baixos.

Bloom tem o sangue frio de um lagarto. É perfeito para a tarefa de gravar imagens de moribundos. Invade cenas de crime e pode ajeitá-las para um melhor ângulo, sem cerimônia.

O rastejante repórter encontra na produtora de TV Nina Romina (Rene Russo) uma ávida consumidora de seu trabalho de rapina. Ela precisa sustentar altos níveis de audiência. Ele traz a carniça que ela rumina e regurgita.

Bloom doutrinou-se sozinho, assistindo cursos e aulas de autoajuda e lendo textos sobre corporativismo empresarial, tudo pela internete. Com os olhos vidrados, o personagem de Gyllenhaal recita lugares-comuns em voz automática, concluídos com um assustador sorriso mecânico.

A maior vítima de suas palestras é seu infeliz auxiliar, Rick (Riz Ahmed). Mas, em algumas semanas, o rapaz vai de auxiliar a vice-presidente da organização criada por Bloom. Uma façanha bastante diminuída pelo fato de que ele e o chefe são os únicos funcionários da empresa.

O final é bastante coerente com a realidade da mídia especializada na infelicidade alheia. Há sempre lugar para quem se destaca na meritocracia dos urubus.

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