Doses maiores

3 de agosto de 2012

A impossível delicadeza da MPB

Recente pesquisa divulgada pelo jornal Valor revela que a venda de poesia corresponde a 1,8% da indústria editorial. Previsível. Principalmente, quando decifrar versos é sinônimo de tempo roubado à produção e ao desempenho profissional.

Serve de alívio que, entre nós, grande parte da poesia venha embalada pela tradição cancioneira de nossa cultura. São muitas as belas rimas que costumam nos chegar envolvidas por ritmos e harmonias.

A MPB já foi um grande manancial poético. Em belo texto publicado no Globo de 01/08, Francisco Bosco explica o motivo. É que essa corrente musical “simboliza justamente uma ideia — ou ideologia — de conciliação entre as classes e ‘raças’”.

Segundo o filho do grande João Bosco, a geração que criou a MPB foi formada por “universitários, na maioria brancos (ou brancos simbólicos), que aprofundavam relações a um tempo com o Brasil popular e com o que havia de mais contemporâneo no mundo”.

Mas os conflitos de classe, tingidos fortemente pelo racismo, vêm desmentindo essa “utopia” há décadas, diz ele. Poder econômico e preconceito de cor inviabilizam a leveza de quase toda a poesia. Daí, Bosco lembrar a importância das rimas ásperas dos Racionais.

Afinal, a poesia está presente na própria definição do rap, sigla para “rhythm and poetry”. É que, em tempos de combate, a poética precisa se subordinar ao ritmo. Os manos e minas das periferias e morros não podem dar-se o luxo do canto suave.

Enquanto isso, precisamos manter a busca por “todo o sentimento” e pelo “tempo da delicadeza” de que fala a canção de Chico Buarque e Cristóvão Bastos.

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