Imagine um drone equipado com uma câmera sobrevoando a
Europa na Idade Média. Mais especificamente, focalizando uma típica família
camponesa na hora da refeição. O que ela mostraria sobre a mesa seria mingau de
trigo. Sem sal, sem cor, sem graça.
Agora, o drone se desloca rapidamente pelo Oceano
Atlântico. Chega ao que é hoje a Amazônia brasileira, num lugar chamado
Hatahara. Trata-se de um complexo de aldeias com 20 hectares de área total, que
existiu entre os séculos 8 e 13.
O local é um exemplo do que Reinaldo José Lopes chamou de
“A civilização do pescado”, em artigo publicado na Folha, em 22/05. O texto
refere-se a descobertas de uma equipe de arqueólogos coordenados por Eduardo
Góes Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP.
Ele e seus colegas descobriram que a dieta dos habitantes
locais era composta por 36 tipos de peixes, além de tartarugas, jacarés e
sucuris. Uma comunidade capaz de explorar ao máximo os recursos fluviais, sem
comprometer sua sustentabilidade, diz o artigo.
Por fim, o drone voltaria aos nossos dias para mostrar nossas
mesas. Certamente, as imagens revelariam uma alimentação cuja diversidade deve-se
apenas às embalagens. No interior delas, uma ração cada vez mais baseada em
milho e soja transgênicos, impregnada de agrotóxicos e outras químicas.
Não à toa, aquela comida sem graça ou
sal predominava num lugar que viria a parir o capitalismo. A Europa do mingau
tornou-se uma civilização em que impera a dieta insossa do velociraptor
neoliberal, símbolo de uma humanidade tão especializada e eficiente quanto cultural
e mentalmente desnutrida.
Leia também: O velociraptor ataca novamente
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