No filme de Kleber Mendonça Filho, Sônia Braga é Clara,
única moradora de um antigo prédio na Praia de Boa Viagem, Recife.
Viúva, 65 anos e morando sozinha, ela não aceita vender
seu apartamento para uma empreiteira que planeja demolir a construção para levantar
um condomínio de luxo.
Diante da resistência da moradora solitária, a
empreiteira lança mão de expedientes tão implacáveis quanto os ferozes tubarões
que frequentam a praia recifense.
Como é seu estilo, Mendonça faz uso abundante e
inteligente de metáforas, efeitos de suspense e denúncias sutis das desigualdades
sociais do País.
Mas, afinal, quem representaria a personagem de Sônia
Braga? Qual é sua metáfora?
A possibilidade mais transparente seria aquela na qual
Clara representa uma classe média tradicional, mas nem por isso conservadora.
Proprietária de cinco imóveis, Clara está longe de ter
problemas materiais. Mas utiliza essa condição para resistir ao cerco da
empreiteira. Não admite trocar as lembranças que habitam seu apartamento por
dinheiro.
Também são elementos positivos sua tranquilidade em relação
à homossexualidade do filho e o despojamento diante de sua própria sexualidade.
Os laços de amizade que estabeleceu com a empregada doméstica também merecem
destaque.
Por sua idade, Clara pertence à geração que ainda era jovem
durante as lutas pela redemocratização do País. Dentre os que delas participaram,
a maioria deve estar muito frustrada com os rumos que a democracia tomou.
Se a metáfora vale, tal como no filme, o cerco a nossas
liberdades e conquistas aumenta a cada dia. E como mostra seu final, a determinação
de resistir só tem alguma chance se trocar a solidão pela solidariedade.
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da Casa Grande, a classe média abana o rabo
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