Doses maiores

6 de junho de 2022

Bolhas ideológicas e disputa de hegemonia

Em julho de 2020, Caio Almendra publicou o texto “Desdemonizando Bolhas”, sobre os desafios para uma comunicação de esquerda diante das vitórias da extrema-direita. Um ponto importante do texto é a tão comentada necessidade de a esquerda “furar as bolhas” alheias.

Segundo o texto, a influência entre as “bolhas” se dá por um processo viral. Tais processos se estruturam a partir de ideias fortes que surgem em determinadas bolhas e conseguem “contaminar” outras, ampliando seu contágio paulatinamente. Em certos momentos esses elementos virais se adaptam à bolha hospedeira, em outros, são eles que adaptam o hospedeiro a suas necessidades. Mas tal como um vírus, eles se metamorfoseiam e se reproduzem sem deixar de ser o que são.

O potencial de viralização de um novo fenômeno social, portanto, afirma Almendra, não está na capacidade de seus adeptos de buscar furar as bolhas a partir da busca de pessoas e espaços distantes de si, mas da capacidade de engajar prioritariamente a própria bolha a ponto de estourá-la, contaminar bolhas próximas e, enfim, contaminar bolhas cada vez mais distantes.

Foi assim que a extrema-direita agiu. Como ele diz: “A extrema-direita foi mais radical/extremista, enquanto todos discursavam para a esquerda buscar uma mediação com o centro. A extrema-direita buscou crescer dentro das próprias bolhas. Ela não negociou seu discurso. Ela não buscou diferentes e indiferentes. Ela radicalizou os iguais. E, ainda assim, ela foi vitoriosa.”

Ou seja, trata-se da velha e necessária disputa de hegemonia, para a qual nunca existiram atalhos. Ainda mais, se consideramos que o ambiente em que o vírus fascista surgiu e se reproduziu continua intacto.

Leia também: Ganhando eleições, perdendo hegemonia

3 comentários:

  1. Muito interessante essa ideia de contundência fazendo "contaminar" outras bolhas.

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  2. Acho que a palavra que faltou na explanação é esta: OPORTUNIDADE.. Se a extrema direita não consegue satisfazer aos anseios do povo, surge a oportunidade para a extrema esquerda se expandir. O inverso também é verdadeiro. Insatisfações populares geram oportunidades. Mas, cá entre nós... Existe algum país no mundo que ama a extrema esquerda ou que a deseja ardentemente???

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    1. Pergunta difícil. Acho que ideias de extrema-esquerda jamais conseguiram ou conseguirão mobilizar multidões a não ser em situações bem específicas. Mesmo na Revolução Russa, a palavra-de-ordem que levou os bolchevique ao poder foi “Pão, Paz e Terra”. A questão do socialismo só se apresentou quando ficou claro que pão, paz e terra só viriam colocando o sistema abaixo.

      As ideias de extrema-direita também não são tão palatáveis para o senso comum médio, mas em certas situações conseguem um apoio material considerável do grande capital, quando este entende que seus interesses extremamente minoritários estão ameaçados. Além disso, acho que o texto original não propõe necessariamente opor ideias de extrema-esquerda às ideias de extrema-direita, mas persistir na defesa de um núcleo ideológico que unifica as várias forças de esquerda ao invés de adaptá-lo ao senso comum que gira em torno da visão de mundo burguesa.

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