Doses maiores

27 de abril de 2021

Com entregadores de aplicativos, a treta é direta

Ao contrário das iluminadas e transparentes vitrines do mercado capitalista, os locais de produção são o que Marx chamou de “lugares ocultos”, onde se esconde o lado feio do sistema: a exploração.

Mas os trabalhadores também têm seus segredos. São suas técnicas, saberes, habilidades. Elementos que lhes permitem tanto controlar o ritmo do trabalho em seu favor, como paralisar a produção.

Por isso, é tão importante para o capital apropriar-se desse conhecimento laboral através de processos como automatização, informatização, inovações nos métodos de produção.

Mas no caso de algumas recentes formas de trabalho, nem essa preocupação os patrões têm. É o que mostra Callum Cant no livro “Riding for Deliveroo”, sobre sua experiência como entregador para o aplicativo Deliveroo.  

Claro que os entregadores desenvolvem certos tipos de conhecimento e habilidades, mas jamais chegam perto de controlar um processo de trabalho no qual são legalmente considerados como “colaboradores”.

Tudo é monitorado pelo aplicativo, que coleta dados em grandes quantidades, enquanto os entregadores ficam no mais completo escuro.

Além disso, essas plataformas se isentam da maior parte do “capital fixo”. Despesas com bicicletas, celulares, seguros e até a mochila térmica ficam por conta dos trabalhadores.

Desse modo, muitos mal conseguem cobrir os custos de reprodução de sua própria força de trabalho. E esta é uma das principais questões do capitalismo de plataforma: o trabalho autônomo.

Desprotegidos legalmente, os entregadores sofrem com a precarização. Por outro lado, não dependem de lei alguma para, por exemplo, organizar uma greve. A treta é direta, entre eles e os patrões.

E treta é o que não vai faltar nas próximas pílulas.

Leia também: O lugar oculto dos aplicativos de entrega

2 comentários:

  1. Nesse momento de pandemia os entregadores tem uma força muito grande, mas e fora dela? Ao ler essa Pílula essa pergunta me veio.

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    1. O relato do Can fala sobre várias greves deles entre 2016 e 2017, bem antes da pandemia. Então, acho que a resistência já vinha se fortalecendo

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