Doses maiores

23 de abril de 2012

Gozação entre nós, deboche contra os poderosos

Entre as torcidas organizadas, há quem combata a violência nos estádios com o slogan “Paz entre nós, guerra aos senhores”. Futebol é paixão e alegria. Rivalidades são naturais. Mas que o ímpeto violento popular seja reservado para aqueles que merecem: os donos do poder, que já nos violentam tanto e há muito tempo.

Entrevista publicada na Folha de S. Paulo em 01/04 traz o antropólogo norte-americano Roy Wagner. Comentando seu livro "A Invenção da Cultura", ele destaca o papel do humor afirmando:

O humor é uma forma de invenção. É um exercício de ver a partir de uma perspectiva e então se deslocar para outra repentinamente, com algo um pouco confuso. Uma piada inventa; ela usa a perspectiva para inventar.

Em outro trecho, Roy afirma:

Estamos acostumados a pensar no humor como forma de entretenimento, não como forma de alteração de perspectivas, de alteração sujeito-objeto.

Talvez, essa concepção ajude a pensar o desafio de tornar o humor arma de combate. Proposta difícil porque corre o sério risco de perder a graça. Mas não é impossível. É o que provam, por exemplo, Luis Fernando Verissimo e Laerte. Ambos são mestres na habilidade de deslocar as perspectivas para debochar da lógica dominante.

Isso não quer dizer que só possamos fazer piada com aqueles que ocupam posições sociais elevadas. Nem que devamos desferir ataques pessoais desrespeitosos contra eles. O alvo principal deve ser a estupidez dos preconceitos e valores conservadores que defendem.

Claro que sempre haverá os que fazem piada com mulheres, negros, homossexuais, pobres. Mas sigamos a inspiração dos torcedores conscientes. Entre os explorados e oprimidos, respeito, sem abrir mão da gozação contra rendições aos valores conservadores. Aos poderosos, o melhor e mais impiedoso de nosso deboche.

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