Antonio Prata deixou de lado seu tom bem-humorado ao escrever sobre a redução
da maioridade penal em sua última coluna na Folha. Incomodado, disse que os autores
e defensores da proposta querem apenas vingança, sangue, “cabeças rolando”.
Por isso, apelida a medida de “emenda de Hamurabi”, em referência à famosa Lei
de Talião, bem resumida no dito popular “olho por olho,
dente por dente”.
No entanto, a justa indignação do colunista comete injustiça contra a
legislação criada pelo rei da Babilônia, 1.700 anos antes de Cristo. O código
inovava ao determinar que uma ofensa fosse retribuída de
forma proporcional. Um tapa na cara, por exemplo, deveria ser retribuído com
outro tapa na cara e não com uma paulada na cabeça.
Além disso, a regra procurava impedir que ricos e poderosos impusessem castigos
desproporcionais à ofensa sofrida. Um plebeu que, digamos, desse uma bofetada em um nobre jamais deveria receber como penalidade a mutilação ou a morte.
Cerca de 1/3 de nossos presidiários nem mesmo foram condenados pela Justiça. Quase
todos pretos e pobres. E dentre os condenados, a maioria cometeu crimes como
roubos e fraudes. Mas uns e outros recebem como punição penas hediondas como
tortura, estupro e até decapitações dentro dos cárceres.
A redução da maioridade penal tem pouco a ver com fazer justiça. Seu objetivo
maior é punir desproporcionalmente os mais indefesos. Implica internar mais pessoas
em um sistema prisional que obedece a uma lógica anterior ao ancestral código
babilônico. Nele, o tapa na cara que o suspeito pobre recebeu do policial na
rua se transforma na vingança mais estúpida.
Leia também: Poços para sepultar a
infância
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