Há um conto de Jorge Luis Borges em que Judas é elevado à
condição de mártir. Segundo a hipótese fictícia do grande escritor argentino, o
mais odiado dos personagens bíblicos sacrificou sua honra e o reino dos céus
por uma causa maior. Sem seu ato vergonhoso, não teria ocorrido o terrível sacrifício
que redimiu a humanidade e mudou a história do mundo.
Segundo o conto, Judas teria intuído:
...a secreta divindade e o terrível
propósito de Jesus. O verbo havia se rebaixado a mortal; Judas, discípulo do
Verbo, podia rebaixar-se a delator. (o pior delito que a infâmia suporta) e ser
hóspede do fogo que não se apaga. A ordem inferior é um espelho da ordem
superior; as formas da terra correspondem às formas do céu; as manchas da pele
são um mapa das incorruptíveis constelações; Judas refletiu de algum modo a
Jesus.
Claro que tudo isso não passa da genial imaginação de
Borges expondo as contradições envolvendo valores humanos e divinos. Mas em
tempos prenhes de delações, esse jogo espelhado parece forçar sua aparição nos
jornais.
É o caso da matéria de Marina Dias publicada na Folha, em
13/04. O título diz que “Temer, Lula e FHC articulam pacto por sobrevivência
política em 2018”. A aproximação dos três estaria sendo intermediada por Gilmar
Mendes e Nelson Jobim. A principal motivação, diminuir os estragos causados pela
avalanche de denúncias de corrupção a envolver nomes graúdos dos partidos que
lideram.
Onde Borges encaixaria seu Judas nesse cenário confuso
até para ele? Difícil saber. De qualquer maneira, o título do conto é “As Três
Versões de Judas”.
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