Infelizmente, não há nada de incoerente na fala dele. O sistema de dominação sempre impôs o castigo físico ao cotidiano das crianças de amplas parcelas da população.
Principalmente, quando o racismo torna a violência o mais desesperado recurso dos pais para defender seus filhos de uma brutalidade ainda maior que a sua. Vejamos um triste depoimento:
Quando eu tinha seis anos, mamãe e papai me levaram a um parque local. Escapei à vigilância deles e achei um playground. Seus avós passaram ansiosos minutos me procurando. Quando me encontraram, papai fez o que cada pai que conheço teria feito — levou a mão ao cinto. Lembro-me de ter ficado olhando para ele numa espécie de atordoamento, aterrorizado, naquela meia distância entre castigo e agressão. Depois, ouvi a voz de papai: “Ou eu bato nele, ou bate a polícia”.
Estas palavras são do escritor afro-americano Ta-Nehisi Coates. Estão no livro “Entre o mundo e eu”, relato autobiográfico escrito para seu filho de 15 anos.
O pai do autor era um funcionário da Universidade de Howard, em Baltimore, Maryland. Não um trabalhador rural vivendo em algum canto do território estadunidense dominado pelos encapuzados da Klu-Klux-Klan.
O que o levava a fazer isso era o medo. O medo de perder seu filho “para as ruas, para a prisão, para as drogas, para as armas”.
“Ou eu bato nele, ou bate a polícia”. Trágico ver como uma simples frase pode resumir toda a crueldade causada pelo racismo.
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Eu nunca tinha pensado nessa perspectiva, mas faz todo sentido. Minha mãe dizia a mesma coisa, já que na realidade que a gente vivia era mais fácil "se dar bem" financeiramente pelo tráfico do que o trabalho formal. Enfim... É mesmo doloroso saber que a violência é utilizada como instrumento de educação por causa do medo daquilo que o Estado pode fazer a quem não estiver na "linha".
ResponderExcluirSim, camarada. Terrível!
ExcluirAbraço