Doses maiores

10 de janeiro de 2023

Se Deus é brasileiro, o diabo é patriota

Está em fase de finalização o filme “Deus ainda é brasileiro”, continuação de “Deus é brasileiro”, de 2003. Ambos de Cacá Diegues. 

Com Antônio Fagundes no papel principal fazendo dupla com o então estreante Wagner Moura, o primeiro filme foi sucesso de público. Lançado logo depois da posse do primeiro governo Lula, era possível ver na produção uma espécie de símbolo da época que se iniciava. “Cheia de esperanças por concretizar e sem abrir mão de alguma astúcia para desviar-se dos percalços que estão por vir”, dizia um texto de minha autoria, publicado na mesma época. 

Trata-se de “Deus é brasileiro e quer férias”, que aproveitava a trama da produção para arriscar uma avaliação sobre a forma como a religiosidade judaico-cristã estaria se manifestando na vida social contemporânea. Segundo o texto, diante de um mundo cada vez mais desencantado, privado de forças mágicas, as pessoas poderiam se sentir convocadas a assumir o fardo de conduzir seu próprio destino.

O problema é que o esvaziamento do sentido religioso também vinha ocorrendo em outras esferas de organização da vida social, como as da política, do trabalho e dos laços comunitários. E o conservadorismo passou a utilizar o fanatismo religioso para preencher esses vazios existenciais. Fenômeno que viria a se manifestar como forte onda ultraconservadora, cerca de uma década depois. E se Deus parecia brasileiro no começo do século, passados 20 anos, seu diabólico adversário se revelou patologicamente patriota. 

De qualquer maneira, talvez o texto ainda mereça uma leitura: clique aqui para acessar.

Leia também: Sou o Deus que transtorna, diz o Capital

2 comentários:

  1. "Segundo o texto, diante de um mundo cada vez mais desencantado, privado de forças mágicas, as pessoas poderiam se sentir convocadas a assumir o fardo de conduzir seu próprio destino."

    Assumir o proprio destino. Isso é muito marxista. Nao podemos retroceder a novas imersões metafísicas. Ainda que os doentes da fé tenham se revelados todos, é indispensável matar o deus judaico cristão e esvaziar todo o conteudo das fantasias alucinatórias e superstições primitivas.

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    1. Concordo. Mas para isso é preciso agir com mais determinação, inteligência e sensibilidade. Esse texto, por exemplo, é um pouco ingênuo ao acreditar que a ausência de sentido promovida pela dominação do capital abriria um espaço maior para as alternativas revolucionárias do que para o fascismo. Vem acontecendo o contrário, cada vez mais. Outro texto, bem mais recente, aborda essa questão de maneira menos otimista. É este aqui: https://pilulas-diarias.blogspot.com/p/o-que-afinal-vem-sedesmanchando-no-ar.html

      Abraço!

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