Os
trechos abaixo são de “Machado: Romance”, de Silviano Santiago, vencedor do
Prêmio Jabuti 2017.
Em
1900, era tamanho “o descalabro da vigilância policial” no Rio de Janeiro:
... que o coronel Hermes da Fonseca, que viria a ser
presidente da República e era então comandante da Brigada Policial, convoca o
delegado Eneias para discutir questão mais ampla e definitiva. Em pauta nas
negociações do alto escalão, a proposta de a força militar da nação reforçar a
força policial do Distrito Federal. Força militar e polícia civil dariam as
mãos no combate ao crime na capital da República. Assinado o acordo, o coronel
Hermes da Fonseca decide que “serão postos à disposição da polícia central mil
e tantos praças, diariamente, para que sejam distribuídos pela cidade”.
Mas
logo “os responsáveis pela ordem pública extrapolam a noção de crime segundo a
lei penal, aplicando-a ao comportamento privado de muitos dos cidadãos e dos
artistas”.
Conclusão
do narrador:
Os problemas que a capital federal enfrenta não se
resolvem com o policiamento indiscriminado dos miseráveis e dos
desclassificados, segundo as normas ditadas pela moral pequeno-burguesa. É a
sociedade carioca como um todo que, na passagem do século XIX para o seguinte,
embaralha de modo contraditório os cacos que a compõem. Quer ser moderna e é
tradicionalista, injusta e preconceituosa. Nunca reconheceu o trabalho livre e
continua a não reconhecê-lo e, se é obrigada a reconhecê-lo pelas
circunstâncias da Lei Áurea e da Proclamação da República, é apenas para que
dele se sirva com um à vontade que escandaliza qualquer estrangeiro culto que
nos visita.
Cento
e dezoito anos depois...
Leia
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