Não
me venham com besteiras de dizer que herói não existe. Passei metade do dia
imaginando uma palavra menos desgastada para definir o gesto desse sargento
Sílvio, que pulou no poço das ariranhas, para salvar o garoto de catorze anos,
que estava sendo dilacerado pelos bichos.
O
garoto está salvo. O sargento morreu e está sendo enterrado em sua terra.
Que
nome devo dar a esse homem?
Escrevo
com todas as letras: o sargento Silvio é um herói. Se não morreu na guerra, se
não disparou nenhum tiro, se não foi enforcado, tanto melhor.
Podem
me explicar que esse tipo de heroísmo é resultado de uma total inconsciência do
perigo. Pois quero que se lixem as explicações. Para mim, o herói -como o
santo- é aquele que vive sua vida até as últimas consequências.
O
herói redime a humanidade à deriva.
Esse
sargento Silvio podia estar vivo da silva com seus quatro filhos e sua mulher.
Acabaria capitão, major.
Está
morto.
Um
belíssimo sargento morto.
E
todavia.
Todavia
eu digo, com todas as letras: prefiro esse sargento herói ao duque de Caxias.
O trecho
acima é da crônica “Herói. Morto. Nós.”, publicada por Lourenço Diaféria na
Folha de S. Paulo, em 1977. O texto levou seu autor à prisão, por “ofensa às Forças
Armadas”.
Episódios como esse mostram
como a covardia com que os governos da ditadura militar torturavam e executavam
prisioneiros também os tornava valentes diante de pessoas armadas apenas com máquinas
de escrever.
E, “todavia”, figuras como
Geisel morreram em seus leitos tranquilamente, livres de qualquer vergonha. Mas
só elas ficaram livres. Nós não.
Esse artigo e a reação da ditadura foram perturbadores!
ResponderExcluirObrigado pela lembrança, não tinha lido ainda.
Abraço
Bruno