No
romance “O drible”, Sérgio Rodrigues “recupera episódios sombrios da história
recente do país e faz uma celebração do futebol raras vezes empreendida na
literatura brasileira”, diz a apresentação da Companhia das Letras, editora da
obra. E é verdade.
Em
um trecho, por exemplo, o personagem Murilo Filho faz considerações muito
bonitas, ao observar que no futebol:
...não é como no basquete, no vôlei, esses esportes em
que a equipe mais talentosa e mais bem preparada faz valer sua superioridade
noventa e nove por cento das vezes. O futebol é cheio de planícies imensas,
horas mortas como a que nós acabamos de ver. Um bololô de ruído, intenções que
não se concretizam, acidentes, lances de sorte e azar. Nas horas mortas pode
acontecer tudo. Tudo mesmo, não é força de expressão. E quando acontece é de
repente, um raio que cai e muda a paisagem por completo. É isso, Tiziu, que
torna tão chato o videoteipe de um jogo que nós já sabemos como terminou. O
futebol só pode ser revivido em melhores momentos, editado, enxugado, porque é
a expectativa de ver qualquer momento se revelar um desses melhores momentos
que leva a gente a transpor seus desertos imensos. Se nós já sabemos quais
serão eles, e quando, a seca nos mata de sede. Pense naquele puto do Heráclito.
Não se entra duas vezes no rio de uma partida, do mesmo jeito que ninguém vive
duas vezes, sabe por quê? Porque sem a interrogação do futuro o futebol e a
vida são de uma pobreza de bocha.
E
Heráclito, todos sabemos, batia um bolão!
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