A rigor, no básico, no raso, o ser humano é só outro bicho. Precisa
comer, beber e defecar como quase todas as outras espécies.
Mas essa raça dos viventes se torna específica quando precisa trabalhar.
Não se trata apenas de transformar o meio à sua volta. É preciso moldá-lo conforme
expectativas que mudam continuamente.
Segundo Marx, as mais habilidosas das abelhas são inferiores ao pior
arquiteto porque não projetaram a colmeia antes de construí-la. Mas o trabalho,
como o conhecemos hoje, torna a grande maioria de nós muito mais próxima do
inseto que do engenheiro.
Este parece ser um dos princípios de onde parte o filme “Arábia”, de
Affonso Uchôa e João Dumans.
A anedota que dá nome à produção, descreve a chegada de alguns operários
contratados para fazer uma obra nas arábias. Diante da imensidão do deserto, eles
só conseguem se perguntar quanto de cimento será necessário para transformar
toda aquela areia em concreto.
Em outro momento, dois carregadores debatem sobre qual carga mais
castiga suas costas. Dos pesados sacos de cimento à fedorenta ração para peixe,
o menu de opções é grande. E mostra o grau de degradação a que pode chegar a
labuta dos mais explorados entre os explorados.
É a faina que aliena e brutaliza, ao mesmo tempo. É o concreto da
fadiga constante frente à abstração de seus objetivos. É uma exploração imposta
por laços tão precários que até o patrão fica longe das vistas.
A rigor, no básico, no fundo, é nessa concepção rasa do bicho humano que
se baseia todo o pensamento conservador. E se ergue a atual sociedade.
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