Doses maiores

1 de setembro de 2013

Gramsci e a orquestra desafinada das ruas

As manifestações populares continuam. Agora, reforçadas por greves como a dos educadores municipais cariocas, com suas belas assembleias ao ar livre. Mas os protestos permanecem isolados e descoordenados. Por isso, há quem fale em “cacafonia das ruas”.

A imagem não é necessariamente negativa. E o fenômeno nem é tão recente. Um texto que Gramsci escreveu nos anos 30 também a utiliza. Em um trecho que destaca a importância de passar do “consenso passivo e indireto” ao “consenso ativo e direto”, ele afirma:

... a participação dos indivíduos dá origem a uma aparência de desagregação e de desordem. Uma consciência coletiva é, com efeito, um organismo vivo, ela só se forma depois da multiplicidade se ter unificado através da atividade dos indivíduos... Numa orquestra que está a ensaiar, cada instrumento a tocar sozinho dá a impressão da mais horrível cacofonia; e, no entanto, estes ensaios são a condição da existência da orquestra como um instrumento único. (Note sul Machiavelli, sulla politica e sullo Stato moderno).

Nas manifestações que tomaram as ruas espanholas em 2011, essa imagem ganhou realidade literal. Em maio daquele ano surgiu o Coro e Orquestra Solfônica, formados por músicos profissionais e amadores. Na greve geral europeia de 14 de novembro do ano seguinte, a Solfônica tocou em meio à violenta repressão policial nas ruas de Madri.

A orquestra a que Gramsci se referia era naturalmente o partido revolucionário. Mas este coletivo plural que deve tocar como um instrumento único ainda está por ser construído aqui e em muitos outros lugares. Mas não tem jeito. Sem ensaios, é difícil que a música preste.

Clique aqui e veja a Solfônica em ação.

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