Uma
das características mais marcantes dos textos de Marx é a ironia. Importante
lembrar disso ao ler o trecho abaixo. Pertence a um rascunho para “O Capital”
chamado “Teorias da Mais-Valia”, escrito entre 1861 e 1863:
Um filósofo produz ideias; um poeta, poesia; um
pastor, prédicas; um professor, compêndios etc. Um criminoso produz crimes.
Observe-se mais de perto a relação desse ramo de produção com o todo da
sociedade e dar-se-á conta de muitos preconceitos. O criminoso produz não
apenas crime, mas também o direito criminal e assim também o professor que dá
palestras sobre direito criminal e ademais o inevitável compêndio de onde o
professor retira a "mercadoria" que lança no mercado. Disso advém
incremento da riqueza nacional. Sem falar no prazer privado que a leitura dos
compêndios criminais proporciona - como nos ensina o Prof. Roscher,
referindo-se àquele que ele mesmo produziu. O criminoso produz além disso a
polícia e a justiça criminal, juízes, carrascos, jurados e assim por diante. E
todos esses ramos de atividade, que compõem grande parte das divisões sociais do
trabalho, desenvolvem certas faculdades do espírito humano, inventam novas
necessidades e novas formas de satisfazê-las.
Mas
não há qualquer ironia em muitas situações sociais contemporâneas produzidas
pela criminalidade. Um instantâneo delas pode ser flagrado em reportagens
corriqueiras cujos títulos são, por exemplo, “Segurança privada fatura bilhões
com violência nas ruas” ou “Segurança é tema central de candidatos ao governo
do estado”. E ainda, “Violência faz audiência de programas policiais na TV disparar”.
Ou
seja, a ocasião não produz apenas ladrões, mas principalmente enormes lucros e
mais repressão.
Leia
também: O
jovem Marx antecipa o Marx maduro
Acompanho já algum tempo o blog, apenas não havia deixado ainda comentários... Muito bacana este texto caro colega. Sou socióloga que atua há décadas na área da segurança pública, na formação acadêmica de policiais e de civis. Gosto de leituras afins e de textos curtos e inteligentes como esse. Gratidão. Abraço, Gláucia
ResponderExcluirObrigado pelo apoio, Gláucia. Trabalhos como o seu são fundamentais para tentarmos compreender melhor muitos dos problemas sociais que temos no Brasil.
ExcluirAbraço!