Doses maiores

11 de outubro de 2022

A luta socialista como sistema de sentido

“Por que Bolsonaro surpreendeu no primeiro turno” é o título de artigo recentemente publicado por Frei Betto. Em meio a tantas análises sobre as eleições, o texto mostra um pouco mais da floresta e menos das árvores ao utilizar o conceito de “sistema de sentido”.

Um exemplo de sistema de sentido é a religião. “Ela ‘explica’ desde a origem do Universo até o que ocorre a cada pessoa após a morte. Como ironizam os cientistas, os físicos têm perguntas; os teólogos, respostas”, diz Betto.

O problema é que desde o enfraquecimento da Teologia da Libertação e de outras iniciativas religiosas progressistas, o campo da espiritualidade foi dominado por uma combinação reacionária de empreendedorismo individual e fanatismo. 

O texto é muito preciso na análise dos erros da esquerda nessa esfera fundamental da disputa hegemônica. Mas também pode servir de provocação para a luta da esquerda em geral. Há muito tempo, as concepções socialistas perderam sua condição de sistema de sentido. Mas não se trata de retomar a dogmática stalinista, cujo caráter conservador nada tinha de socialista.

Uma tarefa crucial é romper nossa dependência em relação à farsa da institucionalidade burguesa. Outra ruptura importante é com a influência do relativismo paralisante do pensamento pós-moderno sobre grande parte da produção teórica da esquerda. Esses, porém, são só alguns dos fenômenos que desarmaram a luta socialista.

Para vencer a disputa de hegemonia com a burguesia é fundamental construir uma concepção socialista que atribua sentido à vida das pessoas. Mas isso só será possível se for feito a partir das lutas concretas travadas no cotidiano delas.

Leia também: O que, afinal, vem se desmanchando no ar?

4 comentários:

  1. " Mas isso só será possível se for feito a partir das lutas concretas travadas no cotidiano delas." Sempre conclusões perfeitas, Sergio. Mesmo que não se concorde com o artigo base, voce consegue tirar algum proveito. Estou de acordo com essa análise sociológica (teoria de sistemas?). Graças a deus, conseguimos superar o "sistema de sentido" teologico. Espero nunca mais voltar pra lá. Superamos também, como voce disse, o sistema de sentido stalinista, cuja prática bruta, enevoou nossa visão de utopia. Espero que estejamos numa transição, contemporâneos de todas as coisas escrotas possíveis, para chegar a uma nova "floresta de sentidos" que possa incluir a diversidade da natureza humana (do humano que há no animal homem).

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    1. Muito obrigado, belo comentário. Só gostaria de saber quem o escreveu. Se não for possível, tudo bem. Abraço!

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  2. Boa Pílula, questões pertinentes. Realmente, a Teologia da Libertação foi um movimento que olhando hj no se tornou a questão religiosa deixa saudades. O pós-modernismo também, talvez não sua expressão mais mal acabada, mas onde até mesmo marxistas acabaram parando na feitura de teorias sem fim circunscritas em si mesmas. A questão central dos sentidos é muito pertinente, no passado o socialismo dava sentido de existência, de luta, de possibilidade, isso não vemos mais.

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    1. Pois, é, e se isso não se alcança apenas com a vontade militante, também não pode prescindir dela. Abraço!

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