Doses maiores

21 de dezembro de 2012

Natal com compaixão. E a espada na mão...

Em breve, comemoram-se 2012 anos do nascimento de um menino muito importante. Para seus inúmeros seguidores, ele representa a compaixão divina. Mas há 4 mil anos, nasceu uma criança que pode simbolizar o lado humano desse sentimento. É o que afirma a reportagem “O início da compaixão”, publicada em 19/12, no Globo.

A matéria refere-se a uma descoberta arqueológica feita no norte do Vietnã. É um garoto que teria nascido com uma doença na coluna vertebral. Coisa grave em uma sociedade com forte dependência do trabalho braçal para sobreviver. Mesmo assim, ele recebeu os cuidados necessários para viver mais de 10 anos.

Nada disso combina com a imagem que temos de uma sociedade pré-histórica. Naquelas duras condições de sobrevivência, difícil esperar solidariedade e generosidade. A descoberta mostra que nossa espécie não se rendeu à lei dos mais fortes. Ao contrário, vem se afirmando contra ela. Para desespero dos fascistas.

Nada disso quer dizer que a raça humana seja boa por natureza. Tais definições dependem das lógicas sociais que regem cada cultura ou momento histórico. O que, talvez, distinga nossa época seja a enorme contradição entre o dito e o feito.

Jesus da Palestina e o garoto do Vietnã simbolizam as melhores possibilidades da humanidade. Ironicamente, ambos nasceram em territórios que acabaram testemunhando atos terríveis. Crimes cometidos exatamente por quem fala em nome da paz e da harmonia entre os povos. Os mesmos que agem em defesa de interesses poderosos.

A noite natalina lembra a compaixão do menino Jesus. Mas não esqueçamos o que disse Jesus quando adulto: “Eu não vim trazer a paz, mas a espada”.

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20 de dezembro de 2012

Não perca a esperança. O fim do mundo vem aí

Os maias avisam: seu calendário não prevê o fim do mundo no dia 21/12. Segundo notícia publicada pela Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação, descendentes dos maias asseguram que a data marca apenas os primeiros 5.200 anos de existência de sua civilização.

Mas isso não deve mudar muita coisa. A grande maioria das pessoas parece esperar avidamente que tudo acabe numa imensa bola de fogo.

A ideia de que haverá um fim dos tempos é produto das religiões monoteístas ocidentais. Para judaísmo, cristianismo e islamismo, um dia o mundo acaba e todos são julgados por suas ações. Os inocentes irão para o paraíso e os condenados arderão no inferno.

Até a Idade Média, essa ameaça apavorava as pessoas. Na era do espetáculo, tornou-se um evento festivo. No Facebook, por exemplo, muita gente já confirmou presença.

Durante palestra da série “O futuro não é mais como era”, José Miguel Wisnik, abordou a atração que o Apocalipse exerce sobre o público contemporâneo.  Fascinação que pode ser medida pelo sucesso dos filmes de catástrofes.

Para Wisnik, isso aconteceria porque o capitalismo impõe um ritmo intenso, sem descanso e sem sentido. O comércio de mercadorias só teria por finalidade fazer circular dinheiro e finanças. O consumo leva a um acúmulo de dívidas, não de bens necessários. O lazer ficou reduzido a mais um momento para consumir.

Diante desse frenesi desgovernado, o fim dos tempos aparece com um momento de alívio. Seria um definitivo encerramento das atividades. Férias sem fim, aposentadoria apocalíptica. Ou seja, quase uma esperança. Só falta que os maias venham nos frustrar!

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19 de dezembro de 2012

Pesquisa explica mais o governo que os governados

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) acaba de divulgar dados da pesquisa “Valores e Estrutura Social no Brasil”. O estudo tenta descobrir os valores que regem o comportamento e as atitudes dos brasileiros.

Um estudo desse tipo está sujeito muitas distorções. Principalmente, em uma pesquisa quantitativa. Mesmo assim, os dados dão algumas pistas importantes.

Segundo as conclusões inciais da pesquisa, “62% dos brasileiros aderem a posições mais igualitárias e progressistas, e 32%, a posições sociais mais conservadoras”. Mas o conservadorismo é muito maior em certas questões.

O direito ao aborto, por exemplo, é aceito por apenas 40% dos entrevistados. Somente 23% admitem relações homoafetivas, como namoro ou casamento, no círculo familiar. Em relação ao estupro, mais de 30% concordam em responsabilizar parcialmente a mulher caso ela use “roupas provocantes”.

Mas há uma importante evidência externa aos dados. No texto de apresentação da pesquisa, Dilma Roussef diz querer “falar a essa nova classe média e também à tradicional, e faremos isso falando de valores caros à sociedade”. Ou seja, o governo escolheu a “classe média” como alvo de suas políticas.

As “classes médias” não são necessariamente conservadoras. Mas tendem fortemente a sê-lo. Por outro lado, seria muito mais adequado considerar a chamada “classe média” como um setor dos trabalhadores. E como tal ser tratada.

Ao priorizar as camadas sociais intermediárias, o governo concentra suas ações nos elementos menos dinâmicos da sociedade. Despreza o potencial transformador dos explorados. Deixa em paz aqueles que concentram o patrimônio e são responsáveis pela enorme desigualdade social. 

Aí, a pesquisa acaba explicando mais o governo do que seus governados.

Leia também: Os proprietários do Brasil e seus síndicos

18 de dezembro de 2012

Os proprietários do Brasil e seus síndicos

Em 13/12, o Instituto Mais Democracia e a Cooperativa EITA lançaram “Quem são os proprietários do Brasil?”. Trata-se de um ranking com 397 empresas ordenadas pelo poder que concentram.

São dados valiosos para começar a entender o tamanho do poder econômico no Brasil. Ainda precisam ser melhor analisados. Mas, logo de cara, ficamos sabendo que as 12 primeiras companhias da lista detêm 51% do “poder acumulado” total. A concentração é enorme, mas o que surpreende mesmo é a grande participação do Estado.

A União acumulava cerca de R$ 460 bilhões, em 2011. Principalmente, devido ao controle das estatais e às participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. A primeira empresa privada no ranking é a Telefônica, valendo apenas R$ 187 bilhões.

É o tipo de informação que pode levar a conclusões precipitadas. A grande presença do Estado demonstraria, por exemplo, um rompimento dos governos petistas em relação ao neoliberalismo tucano?

Não é o que podemos concluir ao ler artigo de Laura Escudeiro, publicado pelo próprio “Instituto Mais Democracia”. Em “Políticas Públicas e a Atuação de Grupos Econômicos”, Laura usa o conceito de “legados dinâmicos”, da estudiosa Suzanne Berger.

Trata-se da forte influência de escolhas feitas no passado. E uma delas seria a grande contribuição estatal na proteção a corporações poderosas como a Vale e a Embraer. Privatizadas, ambas continuaram a gozar dos mesmos privilégios concedidos a elas no passado.

Assim, quanto à proteção a gigantes empresariais, haveria muito mais continuidade que rompimento nas últimas décadas. O governo mudou de mãos, mas continua a fazer papel de dedicado síndico dos proprietários do Brasil.

Leia também: Capital brasileiro saqueando Moçambique

17 de dezembro de 2012

Massacres nos EUA: por que em escolas?

Outro massacre nos Estados Unidos assusta o mundo. Vinte crianças e seis adultos foram mortos em 14/12 em uma escola de Newtown, Connecticut. O assassino seria um ex-aluno do estabelecimento.

Com razão, a grande imprensa culpa a liberdade para comprar armas de fogo no país. Mas há uma pergunta a ser feita. Por que esses massacres acontecem principalmente em escolas ou universidades?

É o que indica Francisco Carlos Teixeira em artigo publicado na Carta Maior, em 15/12. Em "Mass Murder" nas escolas: aconteceu...mais uma vez!” ele contabiliza “177 ataques contra ‘High Schools’ (a partir de 1853) e 111 outros contra ‘Elementary schools’, incluindo o atual ataque”.

Jornalistas falam na necessidade de regras mais rigorosas no comércio de armas. Exigir antecendentes criminais dos compradores, por exemplo. Mas muitos dos assassinos tinham como antecedentes sua própria ficha escolar nos lugares em que cometeram seus crimes.

Ao contrário do que acha o senso comum, a maior função das escolas não é ensinar. Desde os estudos de Michel Foucault, sabemos que elas existem principalmente para disciplinar. O filósofo francês mostrou como as escolas se baseiam nas prisões. Sua lógica é a da vigilância e controle. Algo bem distante do que seriam os objetivos da pedagogia.

As escolas não são culpadas pela loucura assassina de uns poucos. Mas não deveriam ser o lugar para onde alguns de seus próprios alunos voltam para matar. Talvez, a indisciplina dos alunos não seja o maior problema das escolas. Elas é que podem estar se tornando um grande problema para seus alunos e, portanto, para o restante de nós.

14 de dezembro de 2012

Desnaturalizando a pobreza

Uma das funções das Ciências Sociais é desmascarar a naturalidade e a fixidez da vida social. Nada nas relações humanas é necessário e imutável. Tudo é produto das ações humanas. Portanto, está ao nosso alcance mudar aquilo que envergonha nossa espécie. É um dos motivos que torna as Ciências Sociais tão antipáticas para os poderosos.

Um exemplo de conceito naturalizado e eternizado é o de pobreza. Não é verdade que sempre houve ricos e pobres. Sobre isso, o antropólogo Viveiros de Castro traduziu um trecho de ensaio de Marshall Sahlins. Em “The Original Affluent Society. A short essay”, Sahlins diz:

Os povos mais “primitivos” do mundo têm poucas posses, mas eles não são pobres. Pobreza não é uma questão de se ter uma pequena quantidade de bens, nem é simplesmente uma relação entre meios e fins. A pobreza é, acima de tudo, uma relação entre pessoas. Ela é um estatuto social. Enquanto tal, a pobreza é uma invenção da civilização...

Por civilização podemos entender a sociedade de classes. Só há pobres ou ricos onde a minoria explora a maioria. E esta tem sido regra desde o surgimento de “civilizações” como a grega e a egípcia. Na verdade, uma etapa minoritária das sociedades humanas. Corresponde a somente uns 10% da história humana.

De qualquer modo, essa etapa parece destinada a se encerrar em algum momento não muito distante. Ou confirmaremos de vez nossa condição de espécie suicida ou iniciaremos a construção consciente de uma verdadeira civilização: barbárie ou socialismo. Que as Ciências Sociais nos ajudem em nossa luta para afastar a primeira opção.

Leia também: Sociólogo bom é sociólogo chato

13 de dezembro de 2012

Só denunciar golpismos não resolve, diz petista

A mais recente onda de denúncias contra o PT assusta os governistas. No editorial “Aonde eles pretendem chegar?” Mino Carta diz sentir um sombrio clima de golpe. E se surpreende com o envolvimento de empresários: “Personalidades aparentemente voltadas aos interesses do País”.

Emir Sader no artigo “As raízes do golpismo da direita brasileira” afirma: “Quem não tem povo, apela para métodos golpistas, ontem com os militares e a mídia, hoje com a mídia e o Judiciário”. Ambos parecem esquecidos das avaliações que grande parte da esquerda fez sobre uma das principais razões do golpe de 1964: a confiança no inimigo. 

João Goulart, Brizola, Luis Carlos Prestes acreditavam no “dispositivo militar” e no movimento sindical. Qualquer golpe da direita seria derrotado por tropas leais e uma greve geral. Na verdade, todos confiavam na lealdade dos militares. Mas estes estavam ocupados demais preparando o golpe.

O golpe que Sader teme viria da grande mídia, que vem sendo alimentada por astronômicas verbas federais. E aconteceria sob o olhar omisso do Judiciário, que teve a maioria de sua cúpula indicada por governos petistas. Quanto aos empresários que decepcionam Carta, vivem dos gordos financiamentos do BNDES.

Melhor ouvir um equilibrado e insuspeito petista. Trata-se de Ricardo Kotscho, ex-assessor de Lula:

É preciso ter a grandeza de vir a público para tratar francamente tanto do caso do mensalão como do esquema de corrupção denunciado pela Operação Porto Seguro, a partir do escritório da Presidência da República em São Paulo, pois não podemos eternamente apenas culpar os adversários pelos males que nos afligem. Isso não resolve.


12 de dezembro de 2012

Capital brasileiro saqueando Moçambique

“Empresas verde-amarelas redescobrem o país e, juntas, desbancam Portugal do posto de maior investidor estrangeiro”. É assim que o caderno “Amanhã” de O Globo resume a forte presença de empresas brasileiras em Moçambique.

Publicada em 11/12, a matéria mostra todo o poder do capital sediado no Brasil em terras moçambicanas. Vale, Camargo Corrêa e Odebrecht, à frente. A primeira explorando carvão e as outras construindo obras gigantescas. Muito provavelmente, provocando as mesmas tragédias sociais e ambientais que cometem aqui e em outros lugares do mundo.

Como se não bastasse, “o agronegócio está virando a mais nova frente de atividade para os empresários brasileiros”, diz a reportagem. Os reis da soja, milho e algodão estão de olho em seis milhões de hectares. As terras pertencem ao Estado e o governo escolheu o capital “verde e amarelo” como favorito para explorar essa imensidão territorial.

A matéria fala do grande potencial da savana moçambicana. Considerada semelhante ao cerrado brasileiro, ela receberá o “Pró-Savana”, da Embrapa. Um programa de cooperação que repetirá o que foi feito no Centro-Oeste brasileiro: “a implantação de monoculturas voltadas à exportação”.

O resultado desta opção para o nosso cerrado foi um desastre. A destruição de grande parte de sua fauna e flora nativas. A cientista política Ana Saggioro Garcia foi ligeiramente citada na reportagem. Lembrando o título do livro de Eduardo Galeano, ela disse: “A sensação é a de ‘veias abertas’ da terra, sendo sugadas, indo para fora”.

É o Imperialismo Jr. brasileiro substituindo os colonizadores portugueses. E com ajuda de um governo de esquerda. Que o povo moçambicano nos perdoe tamanha vergonha.

11 de dezembro de 2012

O instinto assassino do capitalismo

Dois textos publicados recentemente página da Carta Maior mostram como o capitalismo pode ser cruel. "Bancos contra povos: os bastidores de um jogo manipulado!", de Eric Toussaint, desmente a ideia de que as dívidas que vêm quebrando países da Europa são públicas:

A dívida bruta dos Estados da zona do euro representava 86% do PIB dos 17 países em 2011. A dívida pública grega representava 162% do PIB grego em 2011. Por seu turno, as dívidas do setor financeiro representam 311% do PIB, ou seja, o dobro. A dívida pública espanhola atingiu 62% do PIB em 2011. No entanto, as dívidas do setor financeiro atingiram 203%, ou seja, o triplo da dívida pública.

Mesmo assim, todos os pacotes de ajuda usando dinheiro público beneficiaram bancos privados endividados.

Enquanto isso, o título da reportagem de Naira Hofmeister fala por si só: “Bancos desalojam 500 famílias espanholas por dia”. Segundo Naira, a “previsão das associações de consumidores é de que até o final de 2012 o número total de desalojamentos forçados ultrapasse os 100 mil”.

É pior que do que parece. Por causa da crise, os imóveis ficam vazios, mas os despejados continuam endividados. “Os débitos variam entre 150 e 300 mil euros”, diz a reportagem. O resultado foi um aumento nos suicídios: “Em 40 dias, quatro pessoas”.

Na grande crise de 1929, ficaram famosos os suicídios de empresários e banqueiros falidos. Hoje, ganharam uma bilionária rede de proteção dos governos. Tal como eles, o capitalismo não cometerá suicídio. Cabe aos explorados e oprimidos voltar contra o sistema seu próprio instinto assassino. Manifestações e Greve Geral neles!

Leia também: Na Europa, greve geral contra a barbárie

10 de dezembro de 2012

Biscoito fino e pão com mortadela

Na foto, a respeitada atriz sentada numa bela cadeira. Ao fundo, um conjunto habitacional. O título: “Madureira Gostou”. Embaixo, o texto explica: “Com leitura de Fernanda Montenegro e samba, bairro ganha amanhã nova arena, num projeto de estímulo às artes para além de Centro e Zona Sul”.

É a capa do caderno “Rio Show” do Globo, publicado em 07/12. A matéria refere-se à inauguração da Arena Fernando Torres, no Parque Madureira. O novo espaço receberá eventos culturais que vão das velhas guardas do samba, coletivos de funk e hip-hop até orquestras sinfônicas e peças teatrais.

“É a democratização da cultura”, dizem governos e grande mídia. Por isso mesmo, convém desconfiar. Iniciativas como estas poderiam ser uma forma de dizer aos moradores do subúrbio: “Fiquem por aí. Não venham estragar os espaços bonitos e charmosos da Zona Sul”. Mas, talvez, seja pior que isso.

Oswald de Andrade escreveu: "A massa ainda comerá do biscoito fino que eu fabrico". O poeta e escritor quis dizer que o povo também sabe apreciar obras de arte. Mas a frase também pode ser lida de forma elitista. É preciso levar biscoitos finos à “massa” ou continuará consumindo o pão com mortadela que ela mesma faz.

Ora, O Globo, Eduardo Paes e Sérgio Cabral não são Oswald de Andrade. Além disso, quem faz seu próprio pão desenvolve perigosos laços solidários. Então, são enormes as chances de que políticas culturais desse tipo queiram dizer o seguinte: “Eventos culturais, só com nosso selo de qualidade e na hora e lugar que escolhermos”.

Leia também: Diversão popular tem que ser perigosa

7 de dezembro de 2012

Receita paulistana nas remoções cariocas

“Distante dos olhos” é o título da reportagem de Mariana Timóteo da Costa, publicada no Globo em 01/12. A matéria explica porque em São Paulo, diferente do Rio, as favelas ficam distantes das áreas “nobres” da cidade.

É que os pobres se tornaram um problema social no Rio muito antes do que em São Paulo, diz a matéria. A primeira favela carioca surgiu em 1897, no morro da Morro da Providência. Na capital paulistana, apenas nos anos 1940. Mas, logo, São Paulo tornou-se um polo capitalista mais dinâmico. 

Nos anos 1970, investimentos imobiliários e obras de urbanização voltados para indústria e comércio foram eliminando as moradias precárias do centro paulistano. Sem morros para ocupar, os pobres foram para as periferias.

Ou seja, o que aconteceu em São Paulo foi um processo que combinou repressão estatal com expulsão econômica. A valorização dos territórios centrais da cidade inviabilizava a permanência dos mais pobres. Essa forma de remoção, muito mais eficiente, só agora está sendo utilizada pelas autoridades cariocas.

No Rio, a polícia abriu caminho para o poder econômico. A grande maioria das UPPs foi instalada na zona sul. Lugares que eram perigosos tornaram-se turísticos. O aluguel sobe e taxas que antes não eram cobradas pesam no orçamento. A situação é ideal para as empreiteiras. Podem comprar imóveis por quantias dezenas de vezes menores do que valem.

São os mecanismos de mercado empurrando os pobres para o subúrbio. Os capitalistas continuam a precisar muito deles. Mas, enquanto lucram, aproveitam para se livrar de uma intimidade que pode ser perigosa também do ponto de vista da luta de classes.

Leia também: UPP é militarização. Ou você acredita em duende azul?

6 de dezembro de 2012

Pequena política, grandes estragos

"Se eu fosse político de direita, iam inventar uma namorada mais jovem, 18 anos. Como sou de esquerda, sobrou uma mais velha”. Segundo a edição de O Globo de 04/12, esta frase teria sido dita por Lula a um grupo de amigos. Refere-se ao suposto caso amoroso com Rosemary Noronha, que estaria envolvida em casos de corrupção envolvendo as agências reguladoras.

O governador Eduardo Campos (PSB-PE) disse que o ex-presidente merece respeito pelo legado deixado por seu governo. As lideranças do PT não gostaram, diz a jornalista Vera Magalhães na Folha do dia 05/12. Os petistas entenderam que a frase de Campos estaria considerando Lula como coisa do passado. É verdade que o próprio Lula afirma que não será mais candidato a nada, dizem os petistas, mas somente ele pode dizer isso. Seus aliados, não.

Como se vê, um debate em nível de rodapé. É a pequena política. Aquela que, segundo Gramsci, “compreende as questões parciais e quotidianas que se apresentam no interior das estruturas já estabelecidas, em virtude de lutas pela predominância entre as diversas facções de uma mesma classe política”.

Enquanto isso, ninguém discute as agências reguladoras. Essas autarquias criadas pelos tucanos para proteger os interesses dos controladores dos serviços privatizados. Comitês a serviço das gigantes da telefonia, aviação comercial, transportes, eletricidade etc. É assim que serviços mais que duvidosos obtêm lucro certo às custas de grandes estragos nos bolsos da população.

Uma vez hospedados no poder, o que os petistas fizeram? Mantiveram intactas as agências reguladoras. Era mais um cantinho para suas minúsculas ambições. Outro grande feito que apequena o governo do PT.

5 de dezembro de 2012

Por que juros e PIB caem juntos?

A economia brasileira cresceu só 0,6% no terceiro trimestre deste ano em relação aos três meses imediatamente anteriores. É o que mostraram dados divulgados em 30/11 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No mesmo dia, reportagem de Carolina Jardim para O Globo afirmava: “Resultado ruim de bancos e financeiras contribuiu para expansão fraca do PIB”. Para o IBGE, o setor de serviços seria responsável pela queda nos números. Mais especificamente, a atividade financeira, que sofreu o maior recuo desde o auge da crise econômica mundial, em 2008.

Os motivos? Queda nos juros e alta na inadimplência. Se este diagnóstico estiver correto, poderia sinalizar dois problemas sérios. O primeiro é óbvio. O crescimento da inadimplência indicaria problemas para manter os níveis de consumo que vêm conservando a economia a uma distância segura da crise.

Mas o mais grave não é isso. Por anos, a grande maioria dos economistas acreditou que juros altos são inimigos do crescimento econômico. Não faz sentido que a queda de juros venha, agora, a provocar queda no PIB.

Não seria um sinal de que a economia brasileira chegou a um nível de financeirização alto demais? Tão alto que se tornou dependente da especulação financeira? Seria como alguém em estado avançado de dependêcia química. Diminuir as doses causa males ainda maiores que a própria droga.

Para muitos, é um mistério que a economia brasileira ainda não tenha sido afetada seriamente pela crise econômica mundial. A solução desse mistério poderia estar perto de ser revelada? Talvez, em breve, saibamos. E pode não ser muito agradável.

4 de dezembro de 2012

O Fator Previdenciário e o Grande Irmão

No livro “1984”, de George Orwell, há um Ministério da Verdade. Uma de suas funções era forjar informações convenientes ao poder. Por exemplo, há um momento em que a ração semanal de chocolate é reduzida de 30g para 20g por pessoa.

O trabalho do Ministério da Verdade era destruir todas as informações que diziam que a ração antiga era maior que 20g. Uma vez feito isso, anunciava-se a mudança no tamanho da ração. Graças à generosidade do Grande Irmão, ela seria "aumentada" para 20g.

Em nossa sociedade, a manipulação é mais sutil. Não é preciso destruir os dados antigos. Basta que se percam na torrente de informações produzidas e distribuídas em ritmo cada vez mais alucinante.

É o caso de uma notícia divulgada pela Folha de S. Paulo, em 20/11: “Fator previdenciário muda para melhor pela primeira vez na história”. A matéria trata do cálculo utilizado pelo INSS para determinar a aposentadoria dos segurados.

Na verdade, o Fator Previdenciário reduz o valor do benefício. Isso leva o segurado a retardar o pedido da aposentadoria por vários anos. É mais um golpe dos tucanos mantido pelos governos petistas.

A novidade que o jornal anuncia é a uma pequena queda na redução da aposentadoria. O Fator é calculado com base na expectativa de vida. Como esta teve uma redução média de 83 dias, a aposentadoria deixa de perder 0,31% em seu valor.

É a lógica neoliberal. O Fator Previdenciário é um roubo. Mas uma leve diminuição em seus efeitos é anunciada como positiva, mesmo que às custas da queda na esperança de vida da população. Obrigado, Grande Irmão!

Leia também Era Lula: Confusões nada confusas

2 de dezembro de 2012

“Mortes de negros não chocam”

“Homicídio de negro no Brasil é 132% maior”, diz matéria do Estadão, publicada em 30/11. O título demonstra a persistência da violência racista e desmente parte da euforia oficial pelas “conquistas sociais” que estaríamos presenciando.

A matéria refere-se ao Mapa da Violência, lançado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. O estudo cobre o período de 2002 a 2010, com dados do Sistema de Informações de Mortalidade, do Ministério da Saúde.

O levantamento mostra que o número de homicídios de brancos caiu 25,5% no Brasil, entre 2002 e 2010. Mas o de negros aumentou 29,8%. E há situações ainda mais graves quando olhamos para dentro dos dados.

É o caso dos números no Nordeste. Na Paraíba, por exemplo, o assassinato de negros foi 1.824% maior. Mas mesmo onde a situação é menos grave, ainda é feia. Em São Paulo, o total de negros assassinados foi 32% maior do que o de brancos.

Entre as capitais, Salvador fica em primeiro com 1.659 vítimas negras, em 2010. Mas a “pacificada” cidade do Rio de Janeiro vem em segundo lugar, com 1.078 homicídios.

Os jovens negros formam outro público-alvo, literalmente. Entre os brancos de 15 a 29 anos, houve redução de assassinatos em 33%, contra um aumento de 23,4% para jovens negros.

Difícil não concordar com Douglas Belchior, membro da Uniafro e do Comitê de Luta contra o Genocídio da Juventude Negra: “Isso é reflexo de 500 anos de história, boa parte dela com escravidão e até hoje com negação de direitos. A morte de negros é tolerada e não choca".

Baixe o Mapa, clicando aqui

Leia também: Consumo e conservadorismo convivem muito bem

30 de novembro de 2012

Terra para índios? Sete palmos bastam

“Muita terra para pouco fazendeiro” diz o título de artigo de Márcio Santilli, coordenador do Instituto Socioambiental (ISA), publicado na Folha em 29/11. O texto fala sobre pesquisa encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A entidade dos latifundiários quer usar o estudo para desqualificar a luta dos indígenas por seus direitos.

Em primeiro lugar, pretende dizer que a utilização de bens de consumo pelas comunidades tribais desmentiria sua condição indígena. Santilli responde, dizendo que “os demais brasileiros, a começar pelos patrocinadores da pesquisa, têm interesse por bens importados e nem por isso deixam de ser brasileiros”.

Mas o objetivo principal da CNA é mostrar que os indígenas têm terras demais. Segundo o levantamento da entidade, 520 mil indígenas aldeados vivem em 113 milhões de hectares. O problema, diz Santilli, é que “98,5% dessa área estão na Amazônia, onde vivem 60% dos indígenas do país. Os outros 40% dispõem de apenas 1,5% de todas as terras, em geral em áreas exíguas”. Ao mesmo tempo, diz o artigo, o IBGE mostra que:

...os 67 mil maiores proprietários possuem 195 milhões de hectares, 72% a mais que os índios. Além disso, as terras indígenas preservam 98% da sua vegetação nativa e prestam serviços ambientais a toda sociedade.

Os maiores prejudicados, afirma Santilli, são os 45 mil Guarani-Kaiowá. Eles teriam direito a 95 mil hectares, mas suas terras continuam ocupadas por fazendeiros. Os Guarani-Kaiowá estiveram nas manchetes recentemente. Muitos deles cometeram suicídios diante dessa situação toda. E esta é a vontade de muitos fazendeiros: terra para indígenas, só a que cair sobre seus corpos sem vida.

29 de novembro de 2012

As maiores vítimas do julgamento do mensalão

Manchete do Globo de hoje (29/11): “O maior golpe na impunidade”. Uma gravura de Joaquim Barbosa mostra que o assunto é o mensalão. Um caderno especial estampa o título “Um julgamento para a história”.

A edição anuncia a definição das penas de todos os envolvidos no caso. Na verdade, comemora um julgamento que condenou lideranças históricas do PT. Antigos desafetos do jornal e de boa parte da classe dominante brasileira. Não se trata de acreditar na inocência dessas personalidades. Mas cabe desconfiar de uma disposição para condenar jamais vista naquela corte antes.

Por outro lado, oito dos onze juízes do Supremo foram indicados pelos governos petistas. O próprio Joaquim Barbosa foi nomeado por Lula. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também. Ambos foram decisivos na condenação dos envolvidos com o mensalão. Ao confiar na insitucionalidade burguesa, o PT acomodou-se dentro de uma armadilha.

Mas as maiores vítimas dessa armadilha não são os réus do mensalão. Muito menos as lideranças e a direção do PT. Estes últimos sabiam o que estavam fazendo. E seguem convictos de que estavam certos. Afinal, a popularidade de seu governo continua alta, apoiando-se na vocação corrupta da política oficial.

A verdadeira vítima da armadilha institucional é uma pequena parte da militância petista. Aquela que nunca concordou ou se fez cúmplice das sujeiras petistas. Permanece socialista e combativa. A ela resta a necessidade de refletir sobre uma frase atribuída à revolucionária Rosa Luxemburgo: “os socialistas não mudam o Estado. O Estado é que muda os socialistas”.

28 de novembro de 2012

Enem, mercado e racismo da inteligência

“Instituição paulista montou turma de ‘elite intelectual’”, diz notícia do Globo publicada em 27/11. Segundo a matéria, o Objetivo Colégio Integrado “tem aulas em período integral, ministradas por professores selecionados, em salas com poucos estudantes”. Resultado? Primeiro lugar no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2011. Enquanto isso, das 50 escolas melhor colocadas no exame, apenas três são públicas.

Tudo isso tem pouco a ver com qualidade de ensino. Aparecer no topo da classificação do exame garante a cobrança de mensalidades caras. O Objetivo, por exemplo, cobra 1.800 por mês. Mas há aquelas, como o Vértice, cuja mensalidade ultrapassa os R$ 3 mil.

Para turbinar seu desempenho, muitas escolas particulares colocam para fazer a prova apenas alunos que estão acima da média. No exame de 2010, por exemplo, 60% dos estabelecimentos tiveram menos da metade dos alunos no Enem. E em apenas 7,6% deles mais de 90% dos alunos fizeram o exame.

Ou seja, quatorze anos depois de criado pelos tucanos, o Enem se consolida como mecanismo de disputa de mercado. Mas este é não é o pior lado do exame. Essa forma de classificação também vai impondo um modelo de educação restrita, elitista e voltada para o mercado. Vai reforçando o que Pierre Bourdieu chamou de “racismo da inteligência”.

Segundo o sociólogo francês, trata-se de um tipo de discriminação “característica de uma classe dominante cujo poder repousa em parte sobre a posse de títulos que, como os títulos escolares, são considerados como uma garantia de inteligência”. Na verdade, mais uma forma de justificar a dominação e a exploração da maioria pela minoria.

Leia também:
O problema do Enem é o próprio Enem

27 de novembro de 2012

O Maracanã é nosso. Os royalties, da galinha

O governador Sérgio Cabral convocou grande manifestação no centro do Rio de Janeiro. Dispensou servidores públicos do trabalho e garantiu transporte de graça para os manifestantes. O motivo para tanta mobilização é a tal redistribuição dos royalties do petróleo. Cabral diz que o Estado está sendo roubado em seus direitos. Especialmente, no caso da exploração do petróleo da camada pré-sal.

O problema é que o recurso nem começou a ser explorado. Ou seja, estão tentando fazer omelete com o ovo ainda dentro da galinha. Além disso, o óleo está localizado na plataforma continental, não em território fluminense. O Rio pode até ficar com uma parte maior dos royalties para compensar eventuais problemas ambientais. Mas não com a parte que caberia a um “estado produtor”, já que não é disso que se trata.

Por fim, alguém realmente acha que Cabral está preocupado com a população do Rio? Logo ele, que é amigão das empreiteiras? Que teve viagens pagas pela construtora Delta? Para o governador, os royalties são mais uma galinha que tem ovos de ouro para dividir com os grandes empresários.

Ao invés de participar dessas manifestações chapa-branca, vamos engrossar as mobilizações contra as remoções das populações pobres devido às obras para a Copa e Olimpíadas. Todos ao Maracanã em 01/12, às 10 horas. É o ato "O Maraca é nosso!", organizado pelo Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas. É o lançamento da campanha contra a privatização do Maracanã, já anunciada por Cabral.

Leia também: Tá vendo aquele estádio, moço? Ajudei a construir...

26 de novembro de 2012

É preciso deter o inverno árabe no Egito

É inverno no Egito. Mas as temperaturas médias dificilmente ficam abaixo dos 20º. Frio, mesmo, só no nível político. Os responsáveis são o presidente Mohamed Mursi e sua organização, a Irmandade Muçulmana. Eles acabam de adotar medidas que dão poderes ditatoriais ao chefe do governo.

Mursi alega que pretende “proteger a revolução”. Realmente, as medidas atingem juízes favoráveis a Mubarak. Verdadeiros carrascos de toga. Mursi também diz que soltará os milhares de revolucionários detidos e investigará a morte de dezenas deles.

Mas o governo Mursi está cheio de integrantes da época de Mubarak. É o caso do procurador-geral e do ministro do interior. O parlamento é governado com mão de ferro pela Irmandade Islâmica. Os membros da Assembleia Constituinte foram eleitos com regras que garantiram maioria esmagadora para o governo.

Nas ruas, o governo vem reprimindo as manifestações por mais liberdade e pela derrubada definitiva do antigo regime. Os partidários de Mursi defendem leis religiosas para governar o País. Enquanto isso, tentam se consolidar seu poder buscando a confiança dos capitalistas egípcios.  

A Revolução Egípcia chega a uma perigosa encruzilhada. Como aconteceu no Irã em 1979, forças conservadoras apoiadas no fanatismo religioso querem sequestrar e matar a revolução. Por outro lado, setores de direita que ficaram sem lugar no novo governo tentam voltar ao poder.

Aos revolucionários resta a dura tarefa de defender as conquistas da Primavera Árabe. Conquistar o apoio da maioria dos explorados para fazer avançar a revolução. Derrotar Mursi e os saudosistas de Mubarak. Afastar o abraço gelado dos capitalistas locais e seus aliados imperialistas.

23 de novembro de 2012

Classe média, conservadorismo e conformismo

“Classe média prefere eficiência a democracia”, diz o título de reportagem de Lisandra Paraguassu, publicada no Estadão, em 13/11. Trata-se de uma pesquisa feita pelo instituto Data Popular voltada para esse suposto grupo social.

Segundo a matéria, a enquete mostrou que 51% dos entrevistados concordam com a frase: "Prefiro uma ditadura competente do que uma democracia incompetente". Por outro lado, 67% dos entrevistados concordariam com a afirmação: “meu voto pode melhorar a política brasileira”.

O diretor do Data Popular, Renato Meirelles, conclui que se trata mais de “uma cobrança pela ineficiência do Estado do que um saudosismo da ditadura." De fato, uma pesquisa desse tipo está sujeita a todo tipo de interpretações e imprecisões. A começar pela definição do que seja “classe média”.

Mas o estudo sinaliza um fenômeno perigoso. A chamada “classe média” não é necessariamente conservadora. Expressivas parcelas dela ajudaram no crescimento do próprio PT. O problema é quando esse setor é conquistado pelo individualismo consumista. Passa a desprezar as saídas coletivas e a solidariedade às lutas dos explorados.

De um lado, o crescimento da capacidade de consumo, do emprego e da renda familiar. De outro, o individualismo consumista impera. Ninguém mais exige serviços públicos de qualidade. O objetivo é ganhar o bastante para pagar plano de saúde, escola particular, previdência privada, transporte individual.

Os governos petistas têm grande responsabilidade nisso. Alegam que pode haver harmonia entre empresários e trabalhadores. Os problemas virão quando os poderosos resolverem romper esse namoro fajuto na base da porrada. Poderão contar com a omissão e a cumplicidade de milhões de explorados desmobilizados e acomodados.

22 de novembro de 2012

Consumo e conservadorismo convivem muito bem

Da coluna de Ancelmo Gois, publicada no Globo em 18/11:

O site de compras de passagens Vai Voando começará, em 2013, a vender bilhetes aéreos em quiosques em 150 favelas do Rio. Fechou parceria com a Central Única de Favelas.

O Banco do Brasil, a 20 dias de completar um ano na Rocinha, comemora a abertura da milésima conta corrente no morro. As agências da Cidade de Deus e do Complexo do Alemão, abertas em janeiro de 2011, já superaram a marca. O volume de empréstimos nas três favelas, acredite, chega a R$ 8 milhões.

Ainda segundo Gois, a Rocinha “vai ganhar a sua primeira sexshop”. Tudo isso sinaliza um expressivo aumento na renda dos mais pobres. Mas não é algo que mereça muita comemoração.

Ao contrário, a ampliação do direito de consumir pode levar a uma espécie de conformismo que mantém os direitos mais básicos no péssimo patamar em que se encontram. Estamos falando de saúde pública, educação de qualidade, respeito às leis trabalhistas e aposentadoria digna.

Ao mesmo tempo, o lado perverso de nossa sociedade continua forte e vigoroso. É o que mostra o título de reportagem de Raimundo Oliveira, publicada pela Rede Brasil Atual, em 19/11: “Ascensão social faz aumentar casos de racismo em shoppings e universidades”.

Segundo a matéria, “pessoas negras enfrentam discriminação e preconceito em ambientes antes frequentados apenas por brancos”. Na verdade, o capitalismo convive muito bem com o conservadorismo. Ambos se alimentam e preservam um ao outro.

Leia também: Preconceito racial e consumo

21 de novembro de 2012

Diversão popular tem que ser perigosa

Rugendas
Em seu livro “Antologia Do Negro Brasileiro”, Edison Carneiro cita o Conde dos Arcos, que foi o último Vice-Rei do Estado do Brasil e Governador da Bahia, no século 19. Os proprietários de escravos desaprovavam os batuques dos negros. Seriam momentos roubados ao trabalho na lavoura. Mas o Conde dos Arcos discordava:

O governo (...) olha para os batuques como para um ato que obriga os negros, insensível e maquinalmente, de oito em oito dias, a renovar idéias de aversão recíproca que lhes eram naturais desde que nasceram (...). [Se] os dahomey vierem a ser irmão com os nagôs, os gêges com os haúças, os tapas com os ashantis, e assim os demais, grandíssimo e inevitável perigo desde então assombrará e desolará o Brasil. E quem haverá que duvide que a desgraça tem o poder de fraternizar os desgraçados.

Hoje, algumas festas ou divertimentos populares podem ter efeito parecido. É o caso das brigas entre torcidas ou em votações de escolas de samba. Lutas ligadas a tragédias sociais também podem ser transformadas em alegres feriados.

O Dia da Consciência Negra corre este risco. Nesta data, festividades oficiais podem dar a impressão de que a dívida histórica com o povo negro vem sendo saldada. Na verdade, acumula-se e aprofunda uma situação cada vez mais dolorida.

Mas, diferente do que pensava o Conde dos Arcos, momentos festivos podem fortalecer a luta dos explorados e humilhados. Desde que sejam organizados por nós e representem perigo para os poderosos. Reforcem o espírito de união, solidariedade, orgulho das tradições e respeito mútuo.

14 de novembro de 2012

Na Europa, greve geral contra a barbárie

No Manifesto Comunista, Marx e Engels defendem o socialismo como necessidade histórica. Mas isso não quer dizer que ele virá de qualquer modo. Eles também se referem a outra possibilidade. Não se viabilizando uma saída revolucionária, dizem eles, é possível que aconteça a "ruína comum das classes em conflito".

Rosa Luxemburgo resumiria brilhantemente esse dilema: “socialismo ou barbárie”. Podemos dizer que é essa escolha que está em jogo na Europa, hoje. O “velho continente” está no centro da crise que começou em 2008. O desemprego supera os 10% na região. Mas na Espanha, é de 25%. Na Grécia, chega a 24% e, em Portugal, quase 16%. A miséria também ataca os ainda empregados.

Essa situação criou um clima perfeito para o crescimento do racismo e do ódio aos estrangeiros. O conservadorismo vai se transformando em fermento para o fascismo. Diante disso, não adianta esperar reações dos governos. Desde que o fascismo surgiu, os aparelhos estatais toleram sua existência se isso servir para acuar os movimentos populares.

A saída, então, só pode ser a unidade e a luta dos trabalhadores. É por isso que, hoje, 14 de novembro, pode haver uma grande greve geral na Europa. Os trabalhadores de Portugal, Espanha, França, Grécia, Itália, Chipre e Malta prometem cruzar os braços. É preciso dar um basta às medidas que penalizam os povos europeus.

É famosa a primeira frase do Manifesto Comunista: “Um espectro ronda a Europa”. Infelizmente, não se trata do comunismo, atualmente. O que vem assustando os europeus e o mundo é o fascismo. É preciso esmagá-lo. Lá e onde mais surgir.

Leia também: O lixo de que se alimenta o fascismo

13 de novembro de 2012

Uma “classe média” para a população negra

“Negros já somam 52% da classe média brasileira” diz título de reportagem de Sergio Leo, publicada pelo jornal Valor, em 09/11. Os números são da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), ligada à Presidência da República.

O órgão se especializou em divulgar números que fazem acreditar que o País se aproxima rapidamente de uma situação de invejável justiça social. Mas a realidade verificável no dia a dia não parece levar a tal conclusão. Muito provavelmente, trata-se de problemas de metodologia.

Para a SAE, são de classe média famílias com renda entre R$ 291 e R$ 1.019 por pessoa. Os valores já são questionáveis por si só. Mas, além disso, a definição não considera outras variáveis, como acesso a certos serviços e direitos, nível de escolaridade etc.

A própria reportagem avisa que a definição adotada pelo governo “pouco tem a ver com o conceito sociológico de ‘classe média’, tradicionalmente ligado aos chamados trabalhadores de ‘colarinho branco’ e nível médio de instrução”.

Afinal, diz a matéria, 64% dessa nova “classe média” tem, no máximo, ensino fundamental completo. Por outro lado, o extrato populacional que mais contribui para o aumento desse setor intermediário é formado por negros.

Segundo a SAE, em 2002, a população negra correspondia a 31% dessa nova “classe média”. Em 2012, ela teria chegado a 52%.

Resumindo, é bem provável que uma grande parte da população que ganhou renda nem por isso conquistou melhores condições de vida. Não à toa, a maioria dessa parcela é formada por negros. O racismo brasileiro continua muito eficiente.

Leia também: Música feita para queimar as entranhas

12 de novembro de 2012

Obama reeleito: mitos e realidade

Somos uma família americana. Cairemos ou nos levantaremos juntos, como uma só nação e um só povo”. Este trecho do discurso da vitória de Obama foi destacado por Anindya Bhattacharyya, colaborador do jornal Socialist Worker, no artigo “Reeleição de Obama: mitos e realidade”.

O jornalista diz que se aprofundam as divisões na sociedade estadunidense. O desemprego continua elevado. A distância entre ricos e pobres aumenta. A polarização política nunca foi tão grande. Por isso, Obama venceu com uma diferença de apenas 2%.

De um lado, multidões raivosas com banqueiros e empresários. De outro, espalha-se o ódio racista a negros e imigrantes. Parte da esquerda votou em Obama temendo Romney. E este não soube entusiasmar a direita.

Obama também se beneficiou do perfil de seu eleitorado. Ele ficou com os votos de setores majoritários: os pobres e moradores das grandes cidades. Também cresceu entre os eleitores hispânicos e asiáticos.

É importante destacar os referendos organizados em cinco estados. Quatro deles legalizaram o casamento gay e dois, o consumo recreativo da maconha. Resultados que mostram um avanço na luta contra o conservadorismo.

Mas nada é tão significativo como a enorme abstenção eleitoral. Dos 206 milhões de eleitores americanos, 84 milhões não votaram. Trata-se de um sistema político cada vez mais desacreditado. Pode sinalizar uma disposição militante para fazer política nas ruas. Tal como aconteceu com o movimento Occupy.

A nação mais poderosa do mundo continua em crise, dividida e reserva muitas surpresas. Tomara que sejam daquelas que colocam o mundo de pernas para o ar. Por debaixo, os poderosos e aqueles que se aliaram a eles.

Leia o artigo em inglês, clicando aqui

9 de novembro de 2012

Os índios e o anjo desesperado

O conceito de “progresso” é tão desastroso que Walter Benjamin o retratou da seguinte forma:

Há um quadro de Klee intitulado Angelus Novus. Representa um anjo que parece preparar-se para se afastar de qualquer coisa que olha fixamente. Tem os olhos esbugalhados, a boca escancarada e as asas abertas. O anjo da história deve ter esse aspecto. Voltou o rosto para o passado. A cadeia de fatos que aparece diante dos nossos olhos é para ele uma catástrofe sem fim, que incessantemente acumula ruínas sobre ruínas e as lança a seus pés. Ele gostaria de parar para acordar os mortos e reconstituir, a partir dos seus fragmentos, aquilo que foi destruído. Mas do paraíso sopra um vendaval que se enrodilha nas suas asas, e que é tão forte que o anjo já não as consegue fechar. Esse vendaval arrasta-o irresistivelmente para o futuro, para o qual está de costas, enquanto o monte de ruínas à sua frente cresce até ao céu. Aquilo a que chamamos o progresso é este vendaval. (Teses sobre filosofia da história – 1940)

Neste exato momento, o olhar espantado do “anjo da história” também estaria voltado para os indígenas brasileiros. Eles simbolizam as vítimas de um progresso que só serve aos interesses de grandes grupos econômicos.

Também causaria espanto ao anjo ver os governos cultuadores do “desenvolvimento” abrindo caminho para o desrespeito a direitos e a destruição de culturas. Desprezando os riscos de semear tempestades.

Que seja como na música de Caetano: “Depois de exterminada a última nação indígena”, o Índio virá. “Impávido que nem Mohammed Ali”. “Tranquilo e infalível, como Bruce Lee”.

8 de novembro de 2012

PCC é criação do conservadorismo tucano

Em 23/01/2010, o blog “Crimes no Brasil”, do Estadão, entrevistou quatro pesquisadores que estudaram o PCC em prisões e na periferia paulistana. Trata-se de Gabriel Feltran, Karina Biondi, Camila Nunes e Adalton Marques. O texto intitulado “16 perguntas sobre o PCC” é enorme, mas vale a leitura.

Segundo os entrevistados, o PCC tem uma hierarquia pouco tolerante a lideranças autoritárias. Seria responsável pela diminuição dos homicídios nas prisões e nas comunidades pobres. Também teria banido o crack nos presídios e em muitos lugares da periferia. Tudo isso em nome de alguns valores morais. Quase uma ideologia.

Podem-se tirar as conclusões mais sensatas ou delirantes disso tudo. Mas uma coisa ficou bem clara na entrevista. Perguntados sobre o que poderia enfraquecer ou acabar com o PCC, as respostas foram parecidas: “... seu fortalecimento está diretamente ligado às formas de opressão que o Estado dirige à população carcerária”, diz Karina.

Gabriel destaca o “desemprego e a fragilidade da garantia do direito à segurança dos mais pobres”. Mas, conclui, “radicalizar a repressão e o encarceramento só me parecem colocar mais água nesse moinho”.

Camila afirma que não sabe como “acabar com o PCC”, mas tem uma certeza:

...o aumento da repressão dentro e fora das prisões, a carta branca que parece ter a polícia para matar na periferia e outras formas mais de desrespeito aos direitos da população pobre da periferia e dos presos, são elementos que fortalecem o PCC...

Ou seja, é a política de segurança ultraconservadora dos últimos governos paulistas que fortalece o PCC. Os tucanos dão de comer às feras que ajudaram a criar.

6 de novembro de 2012

EUA e China: tranquilidade política, terremotos econômicos

O mundo concentra sua atenção nas eleições americanas. Mas deveria olhar também para a China. Agora, em novembro, acontece o 18º Congresso do Partido Comunista Chinês. Muito provavelmente, Xi Jinping será nomeado secretário-geral do Partido e assume a presidência do país no início de 2013.

A grande mídia costuma fazer comparações tortas dos dois processos. Nos Estados Unidos, a democracia. Na China, a ditadura. Num, o capitalismo. Noutro, o comunismo. Na verdade, há mais paralelos que oposições. A ditadura é comum a ambos. Mas a chinesa, é política. A estadunidense, é de classe. Em ambas, a oposição a partir de baixo não tem vez.

Outra característica compartilhada é a base econômica. Só acredita que a China é comunista quem ignora o que é o capitalismo. Os Estados Unidos são os maiores compradores de manufaturados chineses. A China é a principal credora da dívida pública americana. Juntas e integradas, as duas economias são responsáveis por 30% da produção mundial.

Tamanha conexão impede graves desentendimentos entre os dois governos, mesmo em momento de transição. Essa mesma integração aumenta os riscos de novos e piores abalos econômicos. Basta uma forte redução na atividade econômica na China para afetar seu poderoso parceiro. Uma crise da dívida americana abalaria a enorme economia chinesa..

É assim que funciona o sistema capitalista. A relativa tranquilidade na superfície política pode esconder sinais subterrâneos preocupantes. Geograficamente, China e Estados Unidos ficam em lados opostos. Mas as placas tectônicas da economia ligam as duas potências e se movimentam perigosamente.

Sociólogo bom é sociólogo chato

Em seu livro “O que falar quer dizer”, Pierre Bourdieu diz que os sociólogos devem ser “desmancha-prazeres”. Realmente, pouca gente aguenta conversa de sociólogos. Mas não é a isso que Bourdieu se referia. O trecho abaixo ajuda a esclarecer:

Levar à consciência os mecanismos que tornam a vida dolorosa, inviável até, não é neutralizá-los; explicar as contradições não é resolvê-las. Mas, por mais cético que se possa ser sobre a eficácia social da mensagem sociológica, não se pode anular o efeito que ela pode exercer ao permitir aos que sofrem que descubram a possibilidade de atribuir o seu sofrimento a causas sociais e assim se sentirem desculpados; e fazendo conhecer amplamente a origem social, coletivamente oculta, da infelicidade sob todas as suas formas, inclusive as mais íntimas e as mais secretas.

A passagem acima é do livro “A Miséria do mundo”, também de Bourdieu. De origem pobre, Bourdieu tornou-se um dos mais prestigiados cientistas sociais do mundo. Dedicou grande parte de sua produção a mostrar como diferenças sociais consideradas naturais não passam de imposições da estrutura de dominação.

Ou seja, trata-se de estragar a festa dos poderosos, que justificam sua dominação com todo tipo de discriminação. Desde preconceitos óbvios como os de cor, até conceitos aparentemente neutros como “inteligência”, “bom gosto”, “vocação”, “sofisticação” etc.

Mas não basta ser chato. Segundo Bourdieu, também é preciso ser “cúmplice da utopia”. O sociólogo francês morreu há dez anos. Durante sua vida travou muitas batalhas contra a grande mídia e o neoliberalismo. Algo que costuma dar muito prazer aos sociólogos que não abrem mão de um bom combate.

5 de novembro de 2012

A limitada democracia americana

As eleições presidenciais americanas se aproximam. A grande mídia costuma considerá-las uma festa da “maior democracia do mundo”. Não é bem assim.

Em primeiro lugar, a eleição para presidente não é direta. O ocupante do Executivo é escolhido por um colegiado formado por delegados eleitos nos estados. Para ser eleito, o candidato precisa obter 270 votos nesse colegiado. 

Mas a representação do colégio eleitoral é composta de forma a favorecer os estados menos populosos.  Assim, o presidente pode ser eleito sem que tenha obtido a maioria dos votos diretos. Foi o que aconteceu com George Bush, em 2000.

O pluralismo político é uma farsa. Há cerca de 70 partidos legalizados. Mas o sistema distrital favorece apenas republicanos e democratas. Na verdade, duas alas de um partido único. Só divergem quanto à melhor maneira de preservar os interesses da classe dominante americana.

Outro mecanismo limitador da democracia é o encarceramento em massa de pobres e negros. Eles formam a maior parte dos 2,3 milhões da população carcerária dos Estados Unidos. A maior do mundo.

Por fim, vale lembrar o livro “Democracia contra o capitalismo”, da marxista canadense Ellen Wood.  A democracia americana, diz ela, é “formada por muitos indivíduos particulares e isolados”. Eles elegem seus representantes e voltam a sua passividade privada. Impera o que a autora chama de “cidadania passiva e despolitizada”.

Ou seja, o sistema político da nação mais poderosa é uma das mais perfeitas ditaduras de classe que já existiu. Por isso, espalha guerra e tragédias sociais pelo mundo. A “festa democrática” americana é chata, para poucos e muito perigosa.

Leia também: A ditadura eleitoral estadunidense

1 de novembro de 2012

Diante dos índios, nossas vergonhas à mostra

"Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas”, escreveu Pero Vaz de Caminha na famosa carta. Referia-se aos nativos da terra que os europeus iriam saquear pelos séculos seguintes.

Foram necessários quase 500 anos para que se reconhecesse o direito deles a viver em seus territórios. Está na Constituição atual. Mas jamais saiu do papel. O recente caso dos Guarani-Kaiowá é mais uma prova disso.

Na tradição indígena os pactos e acordos baseiam-se na palavra empenhada. O “homem branco” só confia no que está escrito. Mas não se envergonha de ignorar suas próprias leis.

Tamanha frouxidão moral faz lembrar o cacique Mario Juruna, primeiro índio brasileiro a se tornar deputado federal. A liderança xavante costumava carregar um gravador para onde ia. Usava o aparelho para registrar as promessas que as autoridades brancas faziam e nunca honravam.

Mesmo isolado no parlamento, Juruna conseguiu criar a Comissão do Índio do Congresso e a presidiu pela primeira vez. Também defendeu a nomeação de representantes das comunidades indígenas para dirigir órgãos como a Funai.

Mas quase todos nós, brancos de várias cores, de esquerda e de direita, só sabíamos rir do cacique e seu gravador. Juruna morreu esquecido e doente, em 2002. Mas o preconceito de que foi vítima continua vivo. Nunca mais um indígena foi eleito deputado federal.

Alguns de nós, a duras penas, aprendemos a respeitar os indígenas. Muitos outros continuam a zombar deles. Humilham suas lideranças, desprezam suas tradições, são cúmplices de suas mortes, roubam suas terras.

Cinco séculos de dominação branca acumulam vergonhas demais para serem escondidas.

Índio demais, atrapalha. De menos, não tem direitos

31 de outubro de 2012

Quem lucra com o caos urbano

Finadas as eleições, prefeitos eleitos ou reeleitos administrarão grandes cidades cada vez mais inviáveis. Dificilmente será diferente em um país que incentiva a compra de automóveis. Ou adota um programa habitacional que constrói mais bairros dormitórios. Modelo que provoca enormes migrações de um lado a outro das metrópoles duas vezes ao dia.

A combinação entre “Minha casa, minha vida” e IPI menor para carros mantém a situação descrita pela reportagem “As cidades na ponta do lápis”, publicada no Valor em 26/10. Entre outras coisas, o texto de Diego Viana diz que a mobilidade urbana deficiente nas cidades brasileiras consome até R$ 40 bilhões anuais. Já a poluição atmosférica custa até R$ 17 bilhões em doenças respiratórias, só em São Paulo.

A matéria só não explica que tais prejuízos atingem principalmente os trabalhadores e a infraestrutura pública. E que esta é custeada basicamente pelos impostos cobrados daqueles.

Afinal, não há notícia de diminuição do faturamento dos empresários por causa do caos urbano. Suas fábricas poluem. Os carros que fabricam entopem as ruas. A especulação de que se beneficiam faz disparar o preço dos imóveis. Eles concentram enormes lucros e dividem os prejuízos ambientais com a grande maioria da população.

Nem com o trânsito, os grandes empresários sofrem. Têm à disposição a maior frota de helicópteros do mundo. A miséria, o estresse e o sofrimento ficam no chão. No ar, a elite voa como abutres gordos. Apenas observam a confusão no formigueiro lá embaixo. Devem acreditar que o que vem debaixo não pode atingi-los. Melhor não confiar nisso. Nossas metrópoles estão se tornando barris de pólvora.

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