Uma das tarefas da arqueologia dos tempos contemporâneos é reconstituir ligações e genealogias, diz Alfredo Gonzalez-Ruibal, em seu livro “Uma arqueologia da era contemporânea”.
Segundo ele, o desempenho dessa função assemelha-se à crítica do fetichismo proposta por Marx. Na maioria dos casos, as ligações já são vagamente conhecidas, mas esquecidas: dissociamos as mercadorias das suas origens obscuras e da violência dos seus efeitos. É por isso que nos sentimos tão chocados quando somos forçados a comparar o contexto do consumo de mercadorias ao das suas condições de produção.
As ligações entre o consumo de carne bovina e a destruição da Amazônia, por exemplo, são sistematicamente apagadas, e esse apagamento é essencial para a continuação e expansão do sistema capitalista, cujo caminho de destruição é “apagado, escondido ou ignorado”
Em 2006, Gonzalez-Ruibal trabalhou em um projeto arqueológico em acampamentos madeireiros e fazendas de gado estabelecidas ilegalmente dentro de uma reserva indígena no Maranhão. Foram mapeadas áreas desmatadas, rotas e acampamentos de madeireiros e inventariados os diversos objetos que ficaram para trás após uma operação policial. A “feiura” da floresta violada, os rios sujos e a miséria dos acampamentos contrastam com o luxo dos móveis feitos com madeiras “nobres” e o alegre consumo de carne no Brasil e em outros lugares.
O caso acima exemplifica como, muitas vezes, a modernidade torna difícil estabelecer as ligações entre crimes ambientais, de um lado, e consumismo glamourizado, do outro.
Ou seja, entre os mais importantes mecanismos de manutenção do capitalismo está o ocultamento das relações entre mandantes e executores. Não poucas vezes, apelando aos sangrentos préstimos de jagunços e capangas.
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