Doses maiores

9 de janeiro de 2013

Estupro não envolve desejo. É ódio às mulheres

Em “A Sagrada Família”, Marx disse que o progresso da mulher e de sua liberdade mostrariam o grau em que “a natureza humana” é capaz de triunfar sobre a bestialidade.

Bestialidade é uma palavra suave para o que aconteceu na Índia, recentemente. Em 18/12, cinco homens estupraram uma jovem num ônibus. Seria só mais um caso, não tivesse provocado um grande protesto popular por punições severas, em Nova Déli.

A secretária geral da Associação Progressista Pan-Índia de Mulheres, Kavita Krishnam, escreveu o artigo “Temos que defender o direito das mulheres sem medo!”. Ela revela que os casos de estupro no país aumentaram 791% de 1971 a 2010. Mas o número de condenados baixou de 41% para 27% no mesmo período.

As vítimas são sempre consideradas culpadas pelas autoridades. É muito comum exigir que as mulheres demonstrem que não “provocaram” seu próprio estupro. Governo, polícia e grande mídia tentam responsabilizar trabalhadores imigrantes pelos crimes. Mas Kavita diz que 90% dos casos de estupro são cometidos por pais, irmãos, tios e vizinhos da vítima.

Tudo indica que a jovem do ônibus não foi estuprada por conhecidos. Mas a tolerância em relação à violação sexual no ambiente doméstico banaliza esse tipo de selvageria.

Por outro lado, Kavita condena propostas como a castração química dos culpados. Elas se baseiam na ideia de que o estupro é motivado por desejo sexual. Não é. “O estupro é motivado pelo ódio às mulheres, não pelo desejo por elas”.

A violência sexual contra mulheres é uma regra maldita e antiga em quase todas as sociedades. Enquanto não for extinta, permaneceremos na pré-história mais tenebrosa.

3 comentários:

  1. Assim, jamais iria fazer apologia ao estupro ou coisa do tipo. Mas não dá pra generalizar dizendo que não envolve desejo. Você assim despreza transtornos mentais, relacionamentos envolvendo parafilia, etc. A mente humana é muito complexa e essa complexidade, meio que já quebra a coerência do título do texto. Mas entendo perfeitamente a mensagem que você quis passar, e isso realmente tem muita influência, só não dá pra colocar como regra geral! Há-braços!

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    1. Desculpe, Valter, mas discordo completamente. O desejo a que o texto se refere é o do senso comum. Não é entendido como transtorno ou impulso. Não é reconhecido como patologia. É aquele que justifica a violação por uma pretensa postura de sedução da vítima. Que aceita o crime como exagero. Na verdade, é o contrário do desejo. É o ódio, este sim, transtornado e compulsivo. Concordo que seja tratado como patologia, não como resultado da "liberação excessiva dos costumes" ou coisa assim.
      Valeu pelo comentário. Abraço

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    2. Apesar de já ter passado meses q leio após a publicação do texto, sempre é válida a sua leitura.
      Sobre o estupro, é sempre bom salientar q o mesmo se caracteriza pela relaçaõ sexual forçada, ou seja, sem consentimento algum da vítima, e tantas vezes em q o infrator dá ouvidos moucos aos"nãos" e mesmo, em tatos casos, a pedidos de socorro q permanecem calados na mordaça forçada.
      Entendo você, Valter, em entender q para a realização de um ato sexual, mesmo sem consentimento, tenha q haver desejo, mas ainda assim vejo não seja assim simples. Até pq não existe essa história de q a vítima vá provocar no infrator o "desejo de estuprar", pois nunca ouvi falar de um desejo de ser estuprada.
      A associação entre o ódio misógino e o estupro se confirma no uso frequente do estupro como arma de guerra para a dominação (a mulher é mais frágil, daí o ataque), e a covardia constante nas desagregadas relações de gênero q ocorrem cotidianamente em tantos países do planeta.
      Neste segundo caso tomemos exemplos de países como Paquistão, Bangladesh, Índia, a maioria dos países do Oriente Médio e aqueles q fazem uso de mutilações genitais femininas (MGF). Nestes países, a violência é tratada como assunto privado e os estupros ocorrem em escalas estratosféricas como forma de autoafirmação do domínio do homem no ambiente doméstico. Na Somália, os estupros são usados após "casamentos" forçados entre soldados e filhas de refugiados, q depois se dissolvem, e as vítimas são execradas, inclusive de seu convívio sociocultural e familiar (um problema cultural). São casos escandalosos de misoginia e não de doença psiquiátrica.
      Estupros praticados por doentes mentais são bem mais isolados, pois não encontramos doentes mentais em cada lar ou esquina - aliás, os doentes deixam uma "assinatura" mais característica, ao menos em sua maioria. E ainda assim deve-se ter comprovação de doença q justifique, no histórico clínico.
      Por isso nunca devemos colocar prioritariamente o estupro como algo com justificativa. Exceto com prova concreta em contrário, intrínseca ao praticante, o estupro não se justifica e deve ser combatido. O seu combate, dada a dominância de contextos patriarcais, é q se torna o maior desafio.

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