Doses maiores

16 de dezembro de 2016

Para dar boas-vindas a alienígenas e estrangeiros

Para eles, a fala é um gargalo porque exige que uma palavra siga a outra em sequência. Com a escrita, por outro lado, cada marca em uma página pode ser visível simultaneamente. Por que restringir a escrita com uma camisa de força que exige que ela seja tão sequencial quanto a fala? Isso nunca lhes ocorreria.

O trecho acima se refere a personagens alienígenas do conto “The story of your life”, de Ted Chiang, ainda sem tradução do inglês. Com base nele, Denis Villeneuve fez o filme “A Chegada”, raro exemplo de ficção científica que faz pensar.

A lógica por trás da linguagem desses extraterrestres é determinada por sua experiência em relação ao tempo. Para eles, a escrita se expressa e é aprendida simultaneamente porque passado, presente e futuro também se manifestam de uma só vez.

Difícil entender? Com certeza. Mas não faltam efeitos especiais, boas atuações e um roteiro cativante, ainda que acabe amarrando algumas pontas à moda de Hollywood.

Mas outro aspecto muito interessante da produção é que o centro da ação e do suspense são os mistérios da linguagem.

Em tempos de fortes ataques às ciências humanas, o papel de uma linguista se revela mais importante que o de físicos, matemáticos, programadores. Até a enorme prioridade contemporânea dispensada às soluções militares é obrigada a dar lugar às sutilezas da comunicação simbólica.  

É como se Chiang e Villeneuve nos lembrassem do quão imprecisas são as ciências exatas e de como é grosseira a pontaria bélica. E se isso vale até para a chegada de alienígenas, deveria ser obrigatório na recepção a estrangeiros.

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