Doses maiores

23 de julho de 2019

O povo nordestino e a “ingnorânça” das elites

"Os Sertões” foi o tema do último Festival de Literatura de Paraty. Jorge Coli falou sobre o livro em sua coluna da Folha, publicada em 21/07/2019. Para o professor de história da arte da Unicamp, Euclides da Cunha foi traído por sua própria obra.

Segundo ele, o livro “torna-se intolerável quando nos deparamos com os raciocínios derivados das teorias racistas, então consideradas científicas”. Mas conforme avança a leitura, vão sendo desmentidas as teses inicialmente sustentadas pelo autor. Para Coli:

O livro execra o fanatismo dos revoltosos. No entanto, ao descrevê-lo, a admiração que sente por eles —corajosos, leais, inteligentes— anula a reprovação. Concebe o Exército como arma da civilização. Todavia, ao narrar suas manobras ineficazes e dolorosamente ridículas, ao detalhar a crueldade desumana de suas práticas, cujo apogeu foi a degola dos prisioneiros —a tremenda “gravata vermelha”—, expõe a campanha como uma estupidez e um crime: “Aquilo não era uma campanha, era uma charqueada”.

Já a crítica literária Walnice Nogueira Galvão, afirmou em sua participação em Paraty:

“Os Sertões” tem que ser lido todos os dias, enquanto persistir a situação dos pobres brasileiros. Enquanto ocorrer o genocídio dos jovens negros nas favelas de São Paulo, a militarização das comunidades do Rio de Janeiro, enquanto acontecerem tragédias como as de Mariana e Brumadinho.

É famosa a frase "o sertanejo é, antes de tudo, um forte”, presente na obra. Nesse trecho, Euclides descreve o nordestino baseado em pressupostos racistas. E encerra dizendo que se trata de um “homem permanentemente fatigado."

Deve ser porque a “ingnorânça” das eternas elites sobre, e contra, o povo nordestino cansa mesmo.

Leia também:

2 comentários:

  1. Sérgio, eu li essa obra de Euclides da Cunha, e reparei nesse matiz q acabou indo para o avesso, quase o contrário. Como se o autor reconhecesse, até certo ponto, os próprios erros interpretativos iniciais, mas eu não creio nesse reconhecimento um fato real.
    Mas é interessante frisar q o testemunho dele sobre a incursão das forças do Estado o tenha levado a perceber como um método repressivo se revela um verdadeiro terror de classe pela mão de ferro do Estado.

    Abraço!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pois é, Salete. Uma grande obra mútuas vezes ultrapassa seu autor, seus preconceitos, limitações pessoais.

      Beijo

      Excluir