“Marxistas práticos”. Foi assim que José Góes de Campos Barros chamou os beatos do povoado de Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, que existiu no Crato, Ceará, entre 1926 e 1937. Para Campos Barros, “o beato, sem o saber, era marxista - marxista prático”.
O autor dessas palavras não tinha a menor simpatia pela comunidade que descrevia. Ao contrário, como oficial do Exército, integrou o comando da operação que promoveu o massacre dos moradores de Caldeirão. O crime de que eram acusados? Comunismo.
Sob liderança do Beato José Lourenço, afirma Campos Barros, aqueles “homens rudes, de rostos severos e mãos calosas como carapaças de tartarugas” faziam uma terra “estéril” produzir. “Para os seus celeiros convergiam todos os produtos da comuna”. Ainda segundo o relato do militar, seus moradores declaravam orgulhosos: “aqui nada me pertence, é patrimônio de todos os que vivem nesta irmandade e recorrem à nossa proteção”.
O relato aparece em “A terra da mãe de Deus”, importante livro de Luitgarde Cavalcanti, publicado em 1988. Nascida em Santana de Ipanema, no sertão de Alagoas, a autora é antropóloga, com quase 60 anos de trabalho acadêmico envolvendo a cultura e o modo de vida sertanejos. Entre seus muitos livros, estão obras fundamentais sobre Padre Cícero e Lampião.
Nas próximas pílulas, mais comentários sobre “A terra da mãe de Deus”, estudo no qual Luitgarde utiliza a elaboração de Antonio Gramsci para abordar a religiosidade popular como foco de resistência às injustiças sociais. Fenômeno importante para entender rebeliões como a do próprio Caldeirão, do arraial de Canudos e dos povoados do Contestado.
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O título me deixou intrigado, tipo, que diabo é isso? Entendi. O tal do Campos Barros era um facínora, mas pelo que parece tinha uma boa visão e sabia se expressar bem.
ResponderExcluirSim, o relatório saiu em forma de livro com o título "Ordem dos Penitentes".
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