Doses maiores

31 de janeiro de 2018

1917: uma revolução não tão sangrenta

A Revolução Russa costuma ser acusada pelos conservadores de ter sido um mar de sangue.

O marxista britânico Mike Haynes desmente essa afirmação. No artigo “Violência e revolução em 1917”, por exemplo, ele afirma:

A Revolução de Fevereiro estourou na 135ª semana da guerra. A de Outubro chegou na 170ª. Nos cerca de 250 dias desse meio-tempo — que alguns historiadores descrevem como um período de massacre revolucionário, com talvez 2.500 mortes —, na Europa, o número de possíveis mortes chegou a estarrecedores 1,5 milhão.

Lembrando que a sangria do lado russo foi estancada exatamente graças ao tratado de paz promovido pela Revolução de Outubro.

Já no texto “Harmonies and dissonances: Russia in revolution”, Haynes apresenta os outros números.

Na Revolução Inglesa morreram cerca de 100 mil soldados e civis e outros 130 mil de doenças relacionadas – 4,5% da população. Na Escócia, pereceram cerca de 9% da população. Na Irlanda, surpreendentes 20%. Os números soviéticos só chegaram perto disso devido ao covarde cerco imperialista.

A população das colônias americanas era de 2,5 milhões quando a Revolução Americana estourou. As mortes foram poucas, mas mais de 2% da população fugiram porque moravam no lado perdedor. Provavelmente, uma parcela maior do que a que fugiu da Rússia entre 1917 e 1921.

A população estadunidense durante a Guerra Civil Americana era cerca de 32 milhões. Recentes levantamentos indicam que podem ter ocorrido 750 mil mortes por batalhas e doenças, ou 2,5% da população.

Nada disso deve diminuir o que aconteceu na Rússia, diz Haynes, mas coloca os fatos em perspectiva. Algo que a visão achatada dos conservadores não permite.

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26 de janeiro de 2018

Tudo o que é sólido termina em solidão

“Tudo o que é sólido desmancha no ar”. Esta é uma das frases mais famosas do Manifesto Comunista, de Marx e Engels. Mas o que ela quer dizer mais exatamente?

Vejamos como ela aparece. Primeiro, os autores afirmam que a burguesia só pode existir com a condição de revolucionar incessantemente “as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais”. E a partir dessa condição extremamente inquieta:

Dissolvem-se todas as relações sociais antigas e cristalizadas, com seu cortejo de concepções e de ideias secularmente veneradas, as relações que as substituem tornam-se antiquadas antes mesmo de ossificar-se. Tudo que é sólido desmancha no ar...

Diante disso, “os homens são obrigados finalmente a encarar com serenidade suas condições de existência e suas relações recíprocas”.

Nos trechos finais do Manifesto, Marx e Engels convocam os trabalhadores do mundo a unirem-se, já que já “nada têm a perder a não ser suas correntes.” Pode-se deduzir que esta disposição viria da “serenidade” de quem encara com clareza “suas condições de existência e suas relações recíprocas”.

O problema é que, até agora, em nenhuma parte há sinais de serenidade. No lugar dela, angústia, frustrações, ódio, fanatismo e, principalmente, depressão. Há indicações de que uma causa importante dessa situação é a solidão.

Não à toa, o governo britânico acaba de criar o Ministério da Solidão. Nos Estados Unidos, aos passeadores de cães começam se juntar os passeadores de pessoas. Estamos falando do berço da Revolução Industrial e da nação mais rica e poderosa do planeta.

A pior parte das previsões do Manifesto está se concretizando. Temos que cuidar de realizar a melhor.

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Desde seu berço, o capitalismo olha para a morte

25 de janeiro de 2018

A Virgem e os estupradores

Em 18/01/2018, Contardo Calligaris publicou “Estupros, assédios, investidas e paqueras” na Folha. O artigo procura intervir na recente polêmica envolvendo feministas estadunidenses e francesas.

Mas o que interessa aqui é o que diz sobre os estupradores:

...o verdadeiro estuprador não age por excesso de desejo ou por frustração (“a quero tanto que não me aguento”).

Estuprador propriamente é quem não está atrás de sexo ou atrás daquela mulher que deseja. O estuprador gosta da própria violência que ele exerce sobre sua vítima.

Apesar disso:

...poucos homens são estupradores no sentido que gozam de sua própria violência. Mas muitos podem estuprar por idiotice –porque acham que a mulher vai gostar.  

E arremata:

...se você acha que essa história toda é picuinha, reconsidere. O patriarcado, a falta de paridade, a idiotice das investidas e a brutalidade dos estupros são apenas sintomas: a doença é que nossa cultura, há 3.000 anos (desde as histórias de Eva e de Pandora), é fundada no ódio à mulher, como encarnação do mal e voz tentadora do demônio.

Faltou dizer que uma das mais influentes tradições religiosas do mundo nasceu de uma gravidez não consentida. Que se tenha consumado pelo sussurro de um anjo na orelha de uma mulher não altera seu caráter impositivo. E tudo isso para parir um filho a ser sacrificado por vontade do pai, causando os piores sofrimentos que pode suportar o coração de uma mãe.

A figura comovente da Virgem tenta redimir os "pecados" de mulheres como Eva, Raquel, Betsabá, Dalila. Mas a simbologia em torno dela pode preparar um caminho que vai da veneração à violação.

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Estupro não envolve desejo. É ódio às mulheres

24 de janeiro de 2018

Abril de 1500: os Walking Dead desembarcam

“1499: O Brasil antes de Cabral”, de Reinaldo José Lopes, é um ótimo livro para descobrir a riqueza cultural e social dos povos indígenas antes da invasão europeia. Além de ser muito didático e bem escrito.

O capítulo final tenta descrever o que teria representado a invasão dos europeus para esses povos. Segundo Lopes, poderia ser um filme no estilo “Jogos Vorazes”, “The Walking Dead” e “Mad Max”.

Mas na produção em questão, “os zumbis devoradores de gente são os brasileiros de origem europeia, enquanto o papel das tribos amazônicas não é muito diferente do dos mocinhos de The Walking Dead”.

Ou seja, os indígenas seriam pessoas “tentando manter algum simulacro do funcionamento original de sua sociedade quando as estruturas políticas forjadas por seus ancestrais e a maior parte da população à qual pertenciam já tinham virado fumaça”.

A comparação pode surpreender. Afinal, a ideia dominante é a de que os indígenas brasileiros jamais tiveram sociedades muito complexas. Não passariam de poucas tribos espalhadas pelo vasto território, em estruturas sociais simples e “primitivas”, claro.

Ainda que fosse verdade, nenhuma sociedade pode ser considerada simples. Basta que seja formada por humanos para que seja complexa em algum nível. Mas o fato é que o livro de Lopes dá um panorama muito muito diferente daquele imposto pela ciência mal-informada e pelo preconceito mal-intencionado.

O livro fala, por exemplo, de “aldeias-metrópoles” no Xingu, do “esplendor da arte marajoara e tapajônica” na Amazônia e de um “poderio militar Tupinambá” que aterrorizava os portugueses. Voltaremos a ele e ficará claro que somos nós os Walking Dead nessa história.
                                           
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23 de janeiro de 2018

Vale do Silício, Rosa Luxemburgo e Marx

“Empresas do Vale do Silício, antes vistas como inovadoras, são hoje gigantes e alvo da desconfiança das pessoas”, diz Cora Rónai em sua coluna no Globo de 02/01/2018.

É só mais um dos muitos artigos na grande imprensa a demonstrar grande decepção com arrojados rapazes e suas “startups”. Este último termo refere-se a iniciativas empresariais criativas movidas pela ambição de ganhar muito dinheiro.

Na verdade, desse impulso surgem novos modos de explorar trabalho alheio. Seja por serviços como o Uber, seja pela venda dos dados pessoais de bilhões de pessoas.

Mas nada disso é novo. Em certo momento da história do capitalismo, muitos acreditavam que as pequenas empresas desapareceriam. Restariam apenas as corporações gigantes.

Uma das primeiras a se rebelar contra tal ideia foi Rosa Luxemburgo. Em “Reforma ou Revolução?” ela destaca o importante papel dos pequenos capitais na dinâmica capitalista. Eles seriam:

...pioneiros da revolução técnica de maneira dupla: no respeitante a novos métodos de produção nos setores antigos fortemente enraizados; e pela criação de novos setores de produção inexplorados pelos grandes capitais.

Mas não se trata apenas de mais um aspecto da produção capitalista. Ele é fundamental para a sobrevivência do sistema. É o que diz Marx em “O Capital”:

Assim que a formação do capital caísse totalmente nas mãos de um grupo de grandes capitais totalmente constituídos, o fogo vivificador da produção extinguir-se-ia – entraria em torpor.

Portanto, a onda de inovações simbolizada pelo Vale do Silício não é a primeira nem será a última. E a próxima, como a atual, será só mais uma nova forma de manter a velha exploração de classe.

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Tudo o que é sólido termina em exploração

22 de janeiro de 2018

Quando nem a dialética de Lênin funciona

Em seu livro “Reconstruindo Lênin”, Tamás Krausz mostra a situação extremamente contraditória em que se encontrava o Estado soviético alguns anos após sua criação.

Uma confusão tão grande que levou Lênin a cometer alguns malabarismos teóricos para apontar rumos para sua superação.

Em janeiro de 1921, por exemplo, ele escreveu o artigo “A crise do partido”, descrevendo o Estado soviético desse modo:

O Estado operário é uma abstração. De fato nós temos um Estado operário, 1º, com a particularidade de que não é a população operária mas a população camponesa que predomina no país; e 2º, um Estado operário com uma deformação burocrática.

Anteriormente, em “Os sindicatos, a atual situação e os erros de Trotsky”, de 1920, Lênin já havia afirmado:

...num estado que se formou em tais condições concretas, os sindicatos nada têm a defender? Pode-se dispensá-los da defesa dos interesses materiais e morais do proletariado organizado? Seria um raciocínio completamente falso, do ponto de vista teórico. Um raciocínio que nos levaria ao domínio da abstração ou do ideal que atingiremos daqui a quinze ou vinte anos, sendo que, além do mais, não estou seguro de que o atingiremos nesse prazo (...). Nossa situação é tal, que o proletariado deve utilizar suas organizações para defender-se contra seu próprio estado, ao mesmo tempo em que o defende.

Em outras palavras, diz Tamás, os trabalhadores devem confrontar o estado, mas, ao mesmo tempo, defendê-lo juntamente com todas as suas instituições. Não há uma solução dialética para tal contradição.

Quando nem toda a capacidade dialética de um Lênin basta, difícil não esperar pelo pior.

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19 de janeiro de 2018

Revolução é tudo ao mesmo tempo agora

Elio Gaspari publicou o seguinte em sua coluna de 03/01/2018, no Globo:

A descriminalização da maconha é um tema da agenda do século 21. Já o direito das mulheres ao aborto foi tema do 20, ainda divide a sociedade americana e prevaleceu em dezenas de países. E os temas do 19? Estão diante dos olhos de todos os brasileiros quando leem ou ouvem que a polícia subiu um morro e matou "dois suspeitos".

(...)

Há um Brasil que é pouco ouvido e mal-entendido, mas que está aí, não poderá se mudar para Miami, e em outubro irá às urnas. 53% dos entrevistados com renda superior a dez salários mínimos defendem a legalização da maconha e 70% querem a descriminalização do aborto. Na turma que anda de ônibus (até dois salários mínimos), o quadro inverte-se e só 26% concordam com as duas propostas. Moralista, essa faixa da população é a mais afetada pelo que resta da agenda do 19.

São contradições como essas que podem ajudar a entender o que está por trás das divergências entre a esquerda “tradicional” e os movimentos ditos “identitários”. Um choque entre pautas de lutas que deveriam convergir.

Mas nada disso é necessariamente novo ou localizado. Trotsky, por exemplo, trabalhou o conceito de “desenvolvimento desigual e combinado”, segundo o qual relações e estruturas ultramodernas não apenas convivem como dependem da permanência do que há de mais arcaico.

Foi com base nessa compreensão do desenvolvimento capitalista que Trotsky e seus camaradas encontraram suas saídas. Fizeram uma revolução num país que era a quinta economia da época, com mais de 90% de analfabetismo.

Leia também: As intersecções da dominação capitalista

18 de janeiro de 2018

Até agora, Trump vem perdendo para Churchill

Dias atrás, Trump chamou de “países de merda” o Haiti e nações africanas.

No mesmo período, estreou o filme “O Destino de uma Nação”, que retrata Winston Churchill como herói da liberdade.

O que uma coisa tem a ver com a outra? Vejamos.

Em 11/01, Richard Seymour escreveu na revista “Jacobin” sobre o famoso primeiro-ministro britânico. Segundo o artigo, no final da Segunda Guerra, Churchill afirmou: “Devemos varrê-los, cada um deles, homens, mulheres e crianças. Não deve restar um japonês na face da terra”.

Mas tem mais.

...não admito que um grande mal tenha sido feito aos índios vermelhos da América ou aos negros da Austrália (...) pelo fato de que uma raça mais forte, uma raça superior, (...) invadiu e tomou seu lugar.

Visitando a Itália em 1927, declarou a Mussolini: "Se eu fosse italiano, com certeza estaria a seu lado desde o início para concluir sua luta triunfante contra os apetites e paixões bestiais do leninismo".

Escrevendo sobre suas "relações íntimas e agradáveis” com Mussolini, acrescentou que "no conflito entre fascismo e bolchevismo, não há dúvidas sobre de que lado ficam minha simpatia e convicções".

Mas Churchill não se limitava a proferir barbaridades. Ele autorizou o uso de gás venenoso contra rebeldes que combatiam o domínio britânico no Iraque. Na verdade, já havia ordenado que se fizesse o mesmo contra a Rússia dos bolcheviques.

Um caso de pioneirismo foi a utilização do terrível “agente laranja” contra rebeldes na Malásia. Muito antes que as tropas estadunidenses fizessem o mesmo no Vietnã.

Por enquanto, Trump vem perdendo para Churchill na condição de criminoso racista. Por enquanto...

Leia também: Yes, vocês podem! Não é, Trump?

17 de janeiro de 2018

Os bolcheviques e a liberação sexual

O título acima é de um artigo de Noel Halifax, publicado na revista marxista “Socialismo Internacional”, em 13/10/2017. O autor é membro do Partido Socialista dos Trabalhadores inglês e militante do movimento LGBT.

Ainda sem tradução do inglês, o texto combate a ideia muito corrente de que a política dos líderes da Revolução Russa para a sexualidade era homofóbica.

O artigo diz, por exemplo, que nos anos 1920, os bolcheviques se juntaram à Liga Mundial de Reforma Sexual, sendo seus maiores apoiadores. Em um dos encontros da Liga, o delegado russo Grigorii Bakkis descreveu a legislação soviética sobre homossexualidade desse modo:

...o Estado e a sociedade não devem, em absoluto, interferir em assuntos sexuais, desde que ninguém seja ferido ou tenha seus interesses prejudicados. Sobre homossexualidade, sodomia e várias outras formas de satisfação sexual que a legislação europeia considera ofensas contra a moralidade, as leis soviéticas as trata exatamente da mesma maneira como as relações sexuais ditas "naturais".

Além disso, um dos principais psiquiatras do início da União Soviética, Lev Rozenstein, foi responsável pela criação de cursos e programas de educação sexual que visavam ajudar os “pacientes” a aceitarem seu desejo pelo mesmo sexo. A lei soviética também permitia que mulheres adotassem nomes masculinos e vivessem como homens.

É verdade que as leis russas voltariam a criminalizar a homossexualidade em 1934. Mas, aí, já se tratava de mais uma das muitas derrotas impostas pela contrarrevolução stalinista às conquistas de Outubro. Mais uma traição às preocupações libertárias dos bolcheviques.

Leia também: Os bolcheviques contra a família e por liberdade sexual

16 de janeiro de 2018

O novo individualismo já tem alguns séculos

Anthony Elliott é professor de sociologia das universidades South Australia e Keio, no Japão. Em 31/12, publicou artigo na Folha discutindo um novo tipo de individualismo.

Segundo ele, o individualismo atual “nos encoraja a mudar tão completa e tão rapidamente que nossas identidades se tornam descartáveis”.
                                    
Ele cita o filósofo e escritor estadunidense Don DeLillo, para quem:

...o capitalismo mundial gera transformações à velocidade da luz, não só em termos do movimento súbito de fábricas, migrações em massa de trabalhadores e transferências instantâneas de capital líquido, mas em “tudo, da arquitetura ao tempo de lazer, à maneira pela qual as pessoas comem, dormem e sonham”.

Ora, em 1848, o Manifesto Comunista já afirmava que a burguesia “não pode existir sem revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção, e com isso, todas as relações sociais”.

Em relação ao mundo “profissional”, Elliott afirma:

A morte da ideia de uma carreira (uma vida de trabalho) desenvolvida dentro de uma só organização foi interpretada por alguns como sinal de uma nova economia —flexível, móvel, operando em rede. O financista e filantropo internacional George Soros argumenta que transações tomaram o lugar dos relacionamentos na economia moderna.

As transações que tomam o lugar dos relacionamentos identificadas por Soros continuam a movimentar mercadorias, ainda que, atualmente, muitas delas nem existam e circulem por meio de pulsos eletrônicos.

O conceito de “fetichismo da mercadoria” apresentado em “O Capital” diz algo muito parecido. É a relação entre as mercadorias ocupando o lugar da relação entre as pessoas.

Soros, DeLillo e Elliott poderiam dar os devidos créditos a Marx e Engels. 

Leia também: Uberização do desespero, luta de classes, disputa hegemônica

15 de janeiro de 2018

A derrota de Bolsonaro não seria necessariamente uma vitória

“Onde os fracos não têm vez” é o título do artigo de Eduardo Matos de Alencar, publicado no início do ano. Admirador de Olavo de Carvalho, o autor é insuspeito ao avaliar que “Bolsonaro tem mais chances de perder estofo quando as peças e engrenagens do sistema político começarem a operar de maneira efetiva”.

São exatamente essas peças e engrenagens o tema principal do texto de Alencar, que trabalhou para várias prefeituras do Nordeste e foi gestor da implantação da “UPP Social” na Rocinha, em 2012.

É dessa experiência que ele retira evidências sobre o funcionamento do varejo da disputa de votos que forma o atacadão conservador da política institucional em um país extremamente desigual. 

Sobre os eleitores mais pobres, por exemplo, ele afirma:

Inúmeras dessas pessoas podem até declarar, num primeiro momento, a preferência por A ou B, mas a verdade é que quando a liderança comunitária, o vereador, o prefeito da cidade ou o deputado da região acionarem os mecanismos para “pedir” votos pelos seus aliados, acho bem difícil acreditar que as pessoas responderão diferentemente do esperado

É esta “capilaridade” que precisa ser dominada pelos que querem ter alguma chance no pesado jogo eleitoral nacional. Um fator tanto mais importante quanto maior a desigualdade, a pobreza, a ausência de serviços públicos. Elementos que jamais faltaram ao País e alimentam o pragmatismo do “rouba, mas faz” há muitas décadas.

O texto também descreve como o PT capitulou a essa lógica suja. E o pior é que não há como discordar. Mas acima de tudo, indica que uma derrota de Bolsonaro não merece necessariamente grandes comemorações.

Leia também: Bolsonaro não é a maior ameaça. Ainda