Doses maiores

20 de junho de 2024

Os jornais falados dos bolcheviques

As informações que seguem abaixo são de uma matéria publicada no blog Rússia Beyond. O texto fala sobre um fenômeno muito interessante ocorrido na Rússia soviética das décadas de 1920 e 1930.

Após a Revolução de 1917, apenas 20% da população russa era alfabetizada. Uma das principais tarefas dos bolcheviques foi a eliminação do analfabetismo. Mas ensinar as pessoas a ler não é uma tarefa rápida, e a propaganda soviética não podia esperar. Afinal, o público-alvo era justamente a população analfabeta: trabalhadores, camponeses e soldados. Além disso, os bolcheviques não tinham recursos suficientes para a impressão de jornais. Para resolver esse problema, o governo revolucionário criou os “jornais falados”.

No início, esses jornais eram lidos em voz alta para grandes grupos de pessoas. No entanto, mesmo a leitura oral exigia muita criatividade dos oradores para o público não cair no tédio ou na desatenção. O aperfeiçoamento das técnicas de apresentação acabou se transformando em atuação teatral.

Mesmo após a eliminação do analfabetismo, os jornais falados continuaram a se apresentar em parques e casas de cultura por toda a União Soviética. O sucesso foi tão grande que “jornais ao vivo” existiram até a década de 1930, dando origem a um grande número de grupos de teatro amador para sua divulgação. Com o passar do tempo, as apresentações se tornaram mais complexas, tanto em conteúdo quanto na qualidade de sua produção.

É verdade que tudo isso ocorreu somente após a vitória da revolução, mas serve como inspiração para a construção de uma comunicação voltada aos explorados e oprimidos em sua luta contra o capitalismo.

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19 de junho de 2024

Capitalismo verde, capitalismo sujo

A denúncia está na matéria “Bahia: energia ‘limpa’ contra o povo”, publicada pelo portal Outras Palavras. É sobre as serras de Jaguarari, na Bahia, conhecidas como a “caixa d’água do sertão”. Suas 63 fontes abastecem mais de um milhão de pessoas.

Um consórcio chamado Quinto Energy escolheu a região para construir o “Complexo Manacá”, que prevê a instalação de 405 torres eólicas e 476 mil placas fotovoltaicas. A produção de energia equivaleria a um quarto da gerada por Itaipu, a maior hidrelétrica do país.

Serão abertas estradas com até 20 metros de largura para que carretas transportem torres eólicas com 43 metros de altura para o alto da serra. Além disso, será preciso construir plataformas de concreto, desmatando e cimentando as caixas d´água do sertão. Apesar disso tudo, a obra recebeu sinal verde do governo baiano.

Este é mais um exemplo de que mesmo as chamadas energias “limpas” e “sustentáveis” podem causar mais estragos que benefícios. Mas vai muito além dos impactos locais.

Parques eólicos e fotovoltaicos estão sujeitos à inconstância dos ventos e da luz solar. Desse modo, seus proprietários criam demandas que não têm condições de garantir de forma sustentável. A qualquer momento, essas fontes ditas alternativas podem “secar”, provocando apagões que o Estado será pressionado a resolver. Na utilização da energia hidrelétrica essas intermitências são corrigidas pelo sistema público, que alterna o uso das usinas espalhadas pelo país.

Fontes de energia renováveis devem substituir as tradicionais, diminuindo o impacto ambiental e social, mas também integrar os sistemas públicos. Qualquer coisa diferente disso é o velho capitalismo sujo disfarçado de capitalismo verde.

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18 de junho de 2024

Lênin, o revolucionário que sabia recuar

No período posterior à Revolução de 1905, os bolcheviques avaliaram que haveria um ressurgimento da atividade revolucionária na Rússia. Portanto, consideravam fundamental preparar a insurreição armada das massas operárias.

Os mencheviques, corrente rival dos bolcheviques dentro do partido socialdemocrata russo, achavam o contrário. Para eles, a disposição de luta dos trabalhadores diminuíra drasticamente. Defendiam um mergulho no trabalho legal, eleitoral e por reformas possíveis.

Mesmo assim, Lênin e outras lideranças bolcheviques concentraram-se em questões como proteger, armazenar e distribuir armas, munições, explosivos. Organizar unidades armadas e destacamentos de guerrilha urbana. Executar ações armadas de pequena escala, incluindo “expropriações” na forma de assaltos a bancos.

No entanto, Lênin logo chegaria à conclusão de que os mencheviques estavam certos. A luta armada já não fazia sentido, revelando-se contraproducente e autodestrutiva. Não teve dúvidas em romper drasticamente com o que ele mesmo defendera, chegando a votar junto com os mencheviques em plenárias partidárias. O que não significou aderir às teses reformistas defendidas por eles.

Nádia Krupskaya, esposa de Lênin, descreveria assim essa atitude:

Dizem que um bolchevique deve ser firme e inflexível. Lênin considerava esta atitude falaciosa, pois significaria desistir de todo trabalho prático, ficar à parte das massas em vez de organizá-las no enfrentamento de seus problemas concretos (...). A capacidade de ajustar-se às condições mais adversas e, ao mesmo tempo, não perder de vista os princípios revolucionários é a essência do leninismo.

O relato acima está no livro “Lênin: Responding to Catastrophe, Forging Revolution“, de Paul Le Blanc. Demonstra que uma das maiores qualidades de um revolucionário é saber quando reconhecer seus erros e recuar.

Leia também: Lênin e o militante como tribuno popular

17 de junho de 2024

A automação da vida automatizada

A pílula anterior comentava o livro “O Olho do Mestre”, em que seu autor, Matteo Pasquinelli, diz que a cibernética nasceu da necessidade de controlar sistemas de alta complexidade surgidos tanto das reestruturações no processo produtivo, como das pressões da luta de classes.

Uma das abordagens que se impôs foi a “análise de pessoas” (também conhecida como “psicografia”), que nada mais é do que a aplicação de estatísticas, análise de dados e aprendizagem automática às questões relacionadas à força de trabalho no pós-guerra.

Foi a partir desse princípio que a Google criou o algoritmo do “ranking de páginas”, cujas técnicas para mapeamento das redes se tornaram onipresentes, hoje. A teoria da automação adotada por Pasquinelli, portanto, não aponta apenas para o surgimento de máquinas a partir da lógica da gestão do trabalho, mas também dos instrumentos e métricas para quantificar a vida humana em geral e torná-la produtiva.

Os mais recentes desenvolvimentos da inteligência artificial não são, de fato, radicalmente diferentes, mas equivalentes ao design das máquinas industriais: são constituídos pela mesma inteligência analítica de tarefas e comportamentos coletivos, embora com um maior grau de complexidade.

Um aspecto importante do aprendizado de máquina é que a automação de tarefas individuais, a codificação do patrimônio cultural e a análise de comportamentos sociais não têm distinção técnica: podem ser realizadas pelo mesmo processo de modelagem estatística.

O aprendizado de máquina não é capaz apenas de realizar tarefas computacionais, mas imitar os comportamentos dos locais de trabalho e coletivos, em geral. Não é somente uma automação de estatísticas, mas uma automação da vida já automatizada.

Leia também: Reestruturação produtiva, algoritmos e cibernética

14 de junho de 2024

Reestruturação produtiva, algoritmos e cibernética

Em “O Capital”, Marx afirma que “as relíquias de instrumentos de trabalho do passado possuem a mesma importância para a investigação das formações econômicas extintas da sociedade que os fósseis para a determinação de espécies extintas de animais”. Ou seja, “os instrumentos de trabalho não apenas fornecem um padrão do grau de desenvolvimento que o trabalho humano atingiu, mas indicam as relações sociais dentro das quais os homens trabalham”, diz ele.

Essa passagem da obra de Marx foi citada por Matteo Pasquinelli, no livro “O Olho do Mestre”, para mostrar que são as relações entre capital e trabalho que explicam a Revolução Industrial e não a inovação tecnológica. É a necessidade de aumentar a exploração do tecelão que inventou o tear mecânico, não os engenheiros de produção.

Antes de a automação assumir o protagonismo, a divisão industrial do trabalho com suas linhas de montagem retilíneas era organizada por procedimentos comparáveis a algoritmos simples. Mas no final do século passado, ocorrem as reestruturações produtivas em resposta aos efeitos das crises capitalistas e à pressão da luta de classes. Estas novas condições passaram a exigir uma nova forma de controle.

É assim que os algoritmos passam a ser orientados pela cibernética de modo a controlar sistemas de alta complexidade que já não se organizavam de acordo com os antigos métodos hierárquicos e centralizados. Começavam a se estabelecer as condições iniciais para o aprendizado de máquina e aquilo que viria a ser chamado de inteligência artificial. Em essência, mais uma inovação tecnológica a serviço da exploração capitalista. E, como tal, mais um estágio no aprofundamento da barbárie social.

Leia também: As bases sociais e históricas dos algoritmos

13 de junho de 2024

Europa: preparando o terreno para o fascismo

O resultado das eleições para o Parlamento Europeu foi divulgado com alarde pela imprensa. Forças fascistas e ultraconservadoras de França, Alemanha e Itália conquistaram muitas cadeiras, sinalizando um avanço ainda maior da extrema direita no continente, diz a grande mídia.

Mas isso é só parte da verdade. O artigo de Antônio Martins publciado no portal Outras Palavras começa a explicar a situação por seu título “Europa: o Partido da Guerra perdeu”. O autor refere-se principalmente às forças partidárias do presidente da França, Emmanuel Macron, e do chanceler da Alemanha, Olaf Scholz. Com as votações pífias em seus respectivos partidos, os dois chefes de governo foram desmoralizados. Ambos apoiaram com entusiasmo a guerra promovida pelos Estados Unidos contra a Rússia, através da Ucrânia. A verdade é que tanto franceses como alemães sentiram as consequências desse apoio devido aos problemas econômicos causados pelo rompimento comercial com a Rússia e aos cortes nos programas sociais para aumentar gastos militares.

Enquanto a guerra continua matando e destruindo, sem uma derrota da Rússia no horizonte, milhões de europeus desacreditam de seus governos e procuram alternativas. Infelizmente, praticamente toda a esquerda alemã e francesa é favorável à guerra. Resultado: a revolta e o ressentimento popular foram facilmente capitalizados pelas forças ultraconservadoras, cujo autoritarismo, racismo, xenofobia e selvageria social perderam importância diante das denúncias contra a guerra.

Como diz Martins, governos ditos democráticos que se subordinam aos interesses de minorias ricas e ao imperialismo preparam o terreno para o fascismo. A situação no Brasil tem muitas diferenças, mas elas não são tantas que nos livrem de passar pelo mesmo.

Leia também: O avanço da extrema direita e a política das selfies

11 de junho de 2024

O avanço da extrema direita e a política das selfies

Jordan Bardella tem 28 anos e é conhecido como "Rei da Selfie" porque multidões de jovens querem tirar fotos com ele. Com mais de 1 milhão de seguidores nas redes virtuais, poderá tornar-se o mais jovem primeiro-ministro da França, se seu partido, o Reagrupamento Nacional (RN), de extrema direita, obtiver maioria nas próximas eleições para a Assembleia Nacional. Possibilidade fortalecida pelas recentes eleições para o Parlamento Europeu, nas quais o RN mais que dobrou sua bancada.

Em reportagem para o jornal italiano Repubblica, Anais Ginori cita as palavras do marqueteiro de Bardella, Pascal Humeau: “Esse sorriso parece natural, mas trabalhamos nele durante meses. O objetivo era que as pessoas dissessem: para um fascista, ele parece bonito”.

Sem dúvida, um fenômeno assustador. Mas apesar de novo, não é tão recente. Faz parte da onda conservadora que começou a nascer há dez anos no rastro da crise de 2008.

Desde então, surgiram novos tipos de organização partidária ligados à enorme influência das redes virtuais na vida social. Alguns estudiosos chamam essas organizações de “partidos digitais” ou “partidos plataforma”. Muitas delas até surgiram a partir da militância de esquerda, mas sua tendência à fragmentação, superficialidade e irracionalismo se adequou melhor ao ideário ultraconservador.

A necessária e urgente reação da esquerda não pode se limitar à luta nas redes. A raiz das vitórias da extrema direita está nas respostas que oferece aos problemas concretos da vida cotidiana das maiorias. Respostas absolutamente equivocadas, mas que conseguem se impor, frente a uma esquerda que ou se limita a administrar a barbárie neoliberal ou não consegue enxergar para além de suas selfies políticas.

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10 de junho de 2024

EUA e Israel promovem massacres, não guerras

O portal Outras Palavras publicou o artigo “O que nos separa de um novo conflito global” do sociólogo alemão Wolfgang Streeck, em 09/06/2024.

Vale a pena ler o texto na íntegra, mas há um trecho em que o autor faz uma contabilidade bastante sinistra. Streeck começa informando que na Guerra do Vietnã, os Estados Unidos perderam 58.220 soldados, incluindo os que morreram em circunstâncias não relacionadas a combates. Já as baixas vietnamitas foram estimadas entre 1.8 milhão e 3.3 milhões, contando militares e civis. O total exato não está disponível porque grande parte da carnificina ocorreu através de bombardeios. Mas a proporção de mortes ficou entre 30 e 57 mortos vietnamitas para cada soldado americano.

Na Guerra do Golfo de 1991, esta proporção passou a ser 1 morto estadunidense para 138 iraquianos. No Afeganistão, a mortalidade baixou para 1 americano x 45 afegãos. Na invasão do Iraque por George W. Bush, voltou a subir: 1 x 94 iraquianos.

Na Síria, disparou para 1 x 805. Os israelenses não se saíram tão bem nos 23 dias da operação “Chumbo Fundido”, entre 2008 e 2009, ficando com uma proporção de 1 israelense x 231 palestinos mortos.

Na atual guerra de Gaza, em 28 de março de 2024, 32.490 habitantes de Gaza e 251 soldados israelenses morreram, em uma proporção de 1 americano x 129 palestinos, a maioria destes, mulheres e crianças.

São esses números que levam Streeck a afirmar, com toda razão, que as “guerras dos Estados Unidos são massacres em vez de batalhas. E que isso “é ainda mais verdadeiro para as guerras israelenses”.

Leia também: O evangelho genocida do Estado de Israel

7 de junho de 2024

O evangelho genocida do Estado de Israel

Em dezembro passado, o jornal The Guardian noticiou o uso de inteligência artificial pelas Forças Armadas israelenses nos ataques a Gaza. Segundo a reportagem, os militares israelenses alegavam utilizar tecnologia para realizar ataques “cirúrgicos”, diminuindo o número de vítimas civis.

Na época, já haviam se passado mais de dois meses do início do conflito.  Hoje, após oito meses, os ataques à população de Gaza mostraram que nada têm de “cirúrgicos”. Até agora, mais de 14 mil crianças palestinas foram mortas. O mais recente bombardeio foi a uma escola da ONU, que deixou pelo menos 40 mortes, incluindo mulheres e crianças.

Outro conflito envolvendo bombardeios em Gaza aconteceu em 2014, informa o jornal. Nos 51 dias que duraram os ataques, as forças israelenses atingiram cerca de 6 mil alvos. Em comparação, somente durante os primeiros 35 dias da atual guerra, Israel já havia atacado 15 mil alvos.

Uma hipótese muito provável é a de que a inteligência artificial esteja apenas seguindo os parâmetros enviesados pelo racismo genocida de seus criadores.

“Agora, pois, matai todos os meninos entre as crianças, e todas as mulheres que conheceram homem, deitando-se com ele”. Estas palavras são de Moisés, após ter se enfurecido contra seu exército por ter poupado as crianças e mulheres do povo midianita.

O trecho pertence ao livro de Números, capítulo 31, versículo 17, do Antigo Testamento. Mas jamais poderia servir como justificativa para o extermínio de nenhum povo, nem resume o que significa ser judeu ou cristão. Apesar disso, o nome da plataforma de inteligência artificial utilizada pelo estado israelense é “O evangelho”.

Leia também: Gaza: os ataques de Israel a uma agência da ONU

6 de junho de 2024

As bases sociais e históricas dos algoritmos

A etnomatemática é um ramo científico que mostra como a matemática não é somente aquela que conhecemos na atualidade e no Ocidente. Fórmulas que hoje consideraríamos como algébricas ou analíticas já eram descritas pelos babilônios através de procedimentos passo a passo, expressos em palavras comuns e não na metalinguagem simbólica atual.

Problemas econômicos e administrativos parecem estar na origem das antigas técnicas de cálculo. A palavra “número” vem do latim “numerus”, ou “porção de comida”. Servia para registrar os estoques de alimentos.

Segundo o filósofo Ernst Cassirer, a simbologia numérica surgiu das canções usadas para marcar o ritmo do trabalho na lavoura. Algarismo vem do nome do persa Muhammad al-Khwarizmi, bibliotecário-chefe da Casa da Sabedoria de Bagdá, que escreveu um livro fundamental de cálculos no século 9.

Algarismo deu origem ao conceito de algoritmo, que nada mais representava que os procedimentos incorporados em rituais e práticas, muitas vezes transmitidos oralmente, sem serem formalizados em linguagem numérica.

A grande diferença para os atuais algoritmos de inteligência artificial é que os dados já não são informações passivas. Pelo contrário, as próprias regras iniciais que os geram são alteradas automaticamente, à medida que novos dados se incorporam.

É uma inovação poderosa que, mais do que nunca, oculta tanto suas origens sociais como suas ligações com um sistema que aperfeiçoa e aprofunda a exploração do trabalho humano.

As informações acima estão no livro “O Olho do Mestre”, de Matteo Pasquinelli. Mostram que a matemática e demais ciências exatas são produto humano e, como tal, precisam ser apropriadas e orientadas para fins que contemplem o conjunto da humanidade.

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5 de junho de 2024

Do “doomscrolling” ao infocalipse

“Doomscrolling” é a palavra inglesa para o hábito de rolar imagens e notícias na tela do celular em busca de fatos negativos, tristes e deprimentes. Parece o antigo costume de “zapear” na TV em busca dos programas de notícias policiais mais escabrosos. Só que agora em maior velocidade e com oferta praticamente inesgotável.

Inesgotável porque os agentes produtores dessas imagens e informações são muitos. Em contrapartida, os centros distribuidores são bem menos. Não se trata dos inúmeros grupos de zap. Estes são apenas vetores que transmitem a doença.

O foco da moléstia são os poucos e poderosos monopólios de dados e algoritmos, como Facebook, Youtube, X... Esses abutres das redes virtuais precisam manter a atenção e a tensão dos usuários para extrair-lhes os dados e vender-lhes porcarias, enquanto os premia com ansiedade e depressão.

Outro efeito dessa situação é a infodemia, caracterizada pela Organização Mundial da Saúde como um “excesso de informações, algumas precisas e outras não, que torna difícil encontrar fontes idôneas e orientações confiáveis quando se precisa”.

Informação distorcida e alarmista não atenua situações críticas nem mitiga consequências de eventos negativos ou catastróficos. Ao contrário, torna-as ainda mais nocivas e graves.

Mas não podemos ignorar a base material de todo esse caos. É o capitalismo em sua fase de colapsos cumulativos. Colapso político, social, ambiental, moral, sanitário...

O lado mais perverso disso tudo é que o sistema nos massacra com suas mazelas, enquanto nos distrai e nos torna viciados nelas. Vai nos acostumando com a ideia de que o mundo pode até acabar, mas o capitalismo tem que continuar.

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A economia política das fake news

4 de junho de 2024

Mais parteiras da revolução: Konkordia e Vera

Abaixo, novos relatos do livro “Parteiras da Revolução”, de Jane McDermid.

Uma grande lutadora bolchevique em defesa dos direitos das mulheres foi Konkordia Samoilova. Em 1903, quando fazia um trabalho militante entre ferroviários de Baku, ela foi acusada por algumas das esposas deles de tentar “roubar” seus maridos. O incidente ajudou a convencê-la da necessidade de concentrar-se no trabalho junto às mulheres da classe trabalhadora.

Dez anos mais tarde, Konkordia desempenhou papel fundamental na organização da primeira manifestação do Dia Internacional da Mulher na Rússia. Embora ela tivesse dificuldades em convencer seus camaradas bolcheviques a apoiarem suas ações, a persistência e seriedade de sua atuação conseguiu atrair muitas trabalhadoras.

Konkordia ajudou a fundar o “Rabotnitsa”, jornal bolchevique voltado para as mulheres operárias. Nessa condição, desenvolveu atividades de educação política através de cursos voltados às das trabalhadoras das fábricas. Trabalho que seria fundamental para a criação da seção feminina do partido. Konkordia morreria em 1921, aos 43 anos, vítima de cólera.

Assim como Nádia Krupskaya, esposa de Lênin, Vera Slutskaia atuava no importante distrito industrial de Vyborg, em Petrogrado. Inicialmente, ela resistia à organização separada das mulheres. Mas, diante da decisiva participação feminina na Revolução de Fevereiro, ela passou a organizar as trabalhadoras a fim de manter o seu impulso revolucionário.

Vera ajudou a promover grandes comícios de mulheres em Vyborg, mostrando ao partido bolchevique que era necessário criar uma sessão especial para coordenar esse trabalho. Perdeu a vida defendendo a Revolução de Outubro, logo depois da tomada do poder pelos sovietes.

Essas são apenas duas das muitas guerreiras anônimas que foram fundamentais para a vitória bolchevique.

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3 de junho de 2024

Retroengenharia: o capitalismo precisa ser desfeito

Voltando ao tema geoengenharia, no lugar de adotar remendos ambientais que ameaçam piorar o caos ambiental, que tal defender uma espécie de “retroengenharia”?

“Retroengenharia” seria desfazer aquilo que nem deveria ter sido feito. É o caso dos sistemas viários urbanos. Imagine se cada apartamento de um edifício tivesse um elevador próprio. Pois é isso o que acontece quando uma em cada duas famílias utiliza um automóvel para se deslocar nas grandes cidades. Tal como no caso do elevador, muito mais racional seria adotar um sistema de deslocamento únicos e unificado, com diversas entradas e muitos ramais, servindo a quase totalidade da população.

Esse sistema já existe. Chama-se transporte público. O problema é que os investimentos em sua manutenção e ampliação jamais receberam a mesma prioridade destinada à infraestrutura voltada para o transporte individual. Afinal, a indústria automobilística precisa manter e ampliar seus lucros. O mesmo vale para as petroleiras e, agora, para a indústria de componentes para automóveis elétricos.

Mas a simples adoção dessa lógica não é necessariamente positiva. Os primeiros computadores pessoais eram máquinas isoladas, cheias de programas e dados redundantes. Mais tarde, passaram a se comunicar, compartilhando tarefas e informações pela internete.

Claro que houve ganhos de racionalidade, rapidez e eficiência. Mas para quem e com que objetivos? Basta observar como o imenso poder dos monopólios que controlam os dados e algoritmos provoca um enorme estrago social e econômico.

O motor do atual sistema são os lucros em benefício de uma elite cada vez menor. A engenharia que não funciona para a grande maioria da humanidade é a do capitalismo. Retroengenharia nele!

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