Doses maiores

30 de setembro de 2010

Os efeitos nulos do voto nulo

Defender o voto nulo é uma tentação para os lutadores populares. O sistema eleitoral é uma máquina viciada e um campo minado. Costuma atrair para os ambientes agradáveis da burguesia aqueles que estavam nas trincheiras desconfortáveis dos explorados. A recente experiência do PT não nos deixa duvidar.

O problema é que participar das eleições costuma ser a porta de entrada para muitos dos que querem transformar o mundo. Responder a essa expectativa com o voto nulo costuma fechar essa porta sem abrir outras.

É por isso que o voto nulo somente se justifica quando todas as opções apresentadas nas eleições são tão negativas como a negação do voto. É o caso da escolha reduzida a candidaturas do campo conservador.

É verdade que nas atuais eleições, as candidaturas mais fortes disputam o direito de continuar o lulismo. Um projeto que se rendeu ao esquema de dominação que impera no País. Também é verdade que os três partidos de esquerda que combatem o lulismo cometeram o grave erro de se dividir. Inclusive pela valorização exagerada da luta eleitoral.

Mas, nada disso é motivo suficiente para que PSOL, PSTU e PCB sejam considerados forças rendidas ao campo burguês. Cada um deles conta com propostas e companheiros dignos da confiança dos socialistas. Virar-lhes as costas é facilitar o trabalho dos opressores e seus aliados lulistas.

Afinal, defender o voto nulo pode ter o efeito oposto ao pretendido. Participar de eleições não é o caminho para o socialismo. Mas, nada garante que anular o voto avance nessa direção. Mais fácil ser confundido com a condenação de toda e qualquer atividade política.

29 de setembro de 2010

Quase 200 mil eleitores presos

Nos Estados Unidos, o voto não é obrigatório. Por outro lado, em alguns estados americanos, qualquer problema com a justiça suspende o direito de votar. Geralmente, são lugares em que o racismo impera. Onde ser negro pode ser motivo bastante para ter problemas legais. A população carcerária estadunidense é a maior do mundo. Nesse caso, o voto opcional torna-se proibido. Principalmente, para pobres, negros e hispânicos.

No Brasil, só está impedido de votar quem tiver condenação criminal definitiva e ainda esteja cumprindo pena. Mas, somente a partir de 2002, presos sem sentença definitiva começaram a votar. E somente 20 mil deles terão esse direito nas próximas eleições. São menos de 10% dos 220 mil detidos em caráter provisório no País.

Para agravar o problema, chegamos ao terceiro lugar em número de presos no mundo, logo atrás da China. São mais de 494 mil detidos. Com certeza, muitos deles negros e de origem pobre. Certamente, a criminalização da pobreza tem ajudado a aumentar esse número. É o investimento público em penitenciárias substituindo as verbas para educação, saúde, criação de empregos etc.

Não é que o sistema penal brasileiro não funcione. Ele funciona, trancando milhares de pessoas que se tornaram descartáveis. Votar não é o mais importante dos direitos. Mas o bloqueio de seu exercício para tantas pessoas revela o caráter excludente da democracia de fachada em que vivemos.

28 de setembro de 2010

Economistas assustados e iludidos

Acaba de ser lançado, na Europa, o "Manifeste d'économistes atterrés". Ainda não tem versão em português. Alguns traduzem o título como “Manifesto dos economistas consternados”. Outros preferem o adjetivo “aterrorizados”.

Talvez “assustados” fique melhor. O documento vai além da consternação, mas não chega a estar tomado pelo terror. Seus signatários argumentam que a Europa vem sendo duramente afetada pela crise capitalista iniciada em 2008. E que a situação pode ficar ainda pior. O que não é pouco.

O longo texto cita 10 falsas evidências. Todas mostrando quão desastrosas foram as políticas neoliberais adotadas na Europa. Mesmo assim, diz o documento, a ideologia neoliberal continua forte.

Governantes, a mídia e organismos como FMI e Banco Mundial, responsabilizam as políticas sociais adotadas na Europa pelos efeitos da crise. Mas, já são 30 anos de substituição dessas políticas por medidas neoliberais.

O documento propõe 22 medidas para “sair do impasse”. O problema é que a maior parte delas apenas busca retomar o modelo do bem-estar social. E este não foi derrotado somente pela ofensiva neoliberal. A rigor e no longo prazo, o capitalismo é incompatível com regulação econômica, serviços públicos universais, amplos direitos trabalhistas, pleno emprego.

Vivemos sob um sistema social suicida para a grande maioria da humanidade. Ou providenciamos seu fim, ou muitas outras crises virão. Cada vez mais trágicas.

Mas, para isso, precisamos de um outro manifesto. Que não seja assinado apenas por economistas, assustados ou não. Que seja expressão da reorganização dos explorados. E comece por romper com as ilusões em medidas tomadas de cima para baixo a partir de um Estado que é controlado pelos capitalistas.

Leia também: Europa, escuridão e luz

27 de setembro de 2010

A Petrobras e a socialização dos prejuízos

Em 24 de setembro, Lula comemorou o lançamento de uma oferta pública de ações da Petrobras na Bolsa de Valores de São Paulo. O próprio presidente admite que aquele que já foi o bicho-papão dos capitalistas agora patrocina a maior operação de capitalização já feita. Também festejou o aumento da participação do governo na empresa.

O fato é que a venda de ações é uma invenção capitalista para socializar prejuízos. Através dela, as empresas arrecadam imensos recursos para seus investimentos. Se a empresa der lucros, os acionistas recebem parte deles. No caso de prejuízo, raramente os controladores das empresas são afetados. Em geral, sobra para os pequenos investidores.

Além disso, há empresas que costumam usar ações para pagar parte dos salários de seus trabalhadores. E em muitos países, o mercado de ações funciona como poupança e fundo de aposentadoria para milhões de pessoas.

Em 2002, a quebra das empresas Enron e World.com foi um exemplo dramático. Seus trabalhadores não ficaram apenas sem emprego. Suas economias e fundos de aposentadoria viraram pó junto com os papéis das empresas que eram seu lastro. Casos parecidos ocorreram na crise de 2008.

Por fim, as grandes corporações podem colocar à venda valores muitas vezes maiores que sua capacidade de remunerar os investidores. Se algo dá errado, as toneladas de prejuízo caem na cabeça de quem está embaixo.

A Petrobras é uma empresa sólida. Mas os enormes recursos que está buscando são para explorar a camada pré-sal. Um investimento bastante arriscado e de resultados incertos. Em outras palavras, o que o governo Lula está comemorando é a exposição dos cofres públicos a enormes riscos.

24 de setembro de 2010

Cronópios, outra dose

Os famas, para conservar suas recordações as embalsamam da seguinte forma: depois de fixadas as recordações com cabelos e sinais, as envolvem dos pés à cabeça num lençol negro e colocam paradas contra a parede da sala, com um cartãozinho que diz: “Excursão a Quilmes”, ou: “Frank Sinatra”. Os cronópios, ao contrário, esses seres desordenados e mornos, deixam as recordações soltas pela casa, entre alegres gritos, e eles andam pelo meio e quando passa correndo uma, a acariciam com suavidade e lhe dizem: “Não vá machucar-te”, e também: “Cuidado com os degraus”. É por isso que as casas dos famas são organizadas e silenciosas, enquanto que nas dos cronópios há grande algazarra e portas que batem. Os vizinhos se queixam sempre dos cronópios, e os famas movem a cabeça de forma compreensiva e vão ver se as etiquetas todas estão em seu lugar.

(Do livro “História de Cronópios e Famas”, de Júlio Cortázar)

Leia também: Você conhece os cronópios?

23 de setembro de 2010

Contra as serpentes golpistas que Lula ajudou a criar

Ontem, várias personalidades lançaram o “Manifesto em Defesa da Democracia” em ato público, em São Paulo. O alvo é o governo Lula e seus ataques à atuação da imprensa nas eleições. Alguns dos presentes chegaram a comparar o presidente ao ditador italiano Mussolini. Alegam que Lula tenta impedir a livre expressão.

Alguns dos que assinaram o manifesto são figuras respeitáveis da luta por democracia. Mas estão completamente enganados.

Lula tem toda razão em suas declarações sobre a grande mídia. Os empresários da comunicação vêm atuando como partido político. Usam seus poderes de monopólio para tentar impedir a vitória da candidatura petista. Tentam acionar todo tipo de preconceito contra os movimentos sociais, as lutas de resistência, os pobres em geral.

No entanto, o próprio Lula vem mantendo e fortalecendo as condições para que manobras golpistas como estas aconteçam. Em momento algum assumiu a luta pela democratização das comunicações. Ao contrário, abrigou em seu governo porta-vozes assumidos das corporações da mídia.

Lula acha que pode manter um pé em cada canoa. Apoiar-se tanto nos movimentos sociais, como nos empresários. Mesmo que Lula sobreviva a essa acrobacia toda, o risco maior é para os lutadores em geral.

Parece que a lição mais importante dos golpes de 64 foi esquecida. Os movimentos sociais e organizações populares devem dar combate decidido ao golpismo da direita. Mas manter distância de um governo que vem criando serpentes dentro de casa.

22 de setembro de 2010

O comunismo sob ameaça, no Brasil

Comunismo não tem nada a ver com um Estado forte que determina o que o povo deve comer, em que trabalhar, o que pode ser dito, quantas famílias vão morar em uma casa etc. A raiz da palavra comunismo é propriedade comum.

Não se trata de dividir todas as coisas. Apenas os meios utilizados por uma sociedade para se manter. Principalmente, os meios de produção. São as ferramentas, a terra, as sementes, a colheita e o que sobrar dela. Comunismo é semear juntos, produzir coletivamente, decidir comunitariamente. Viver solidariamente.

Essa concepção tem como base a idéia de que todos os seres humanos são iguais em seu potencial criativo. Ainda que sejam muito diferentes cada vez que esse potencial se realiza.

Muitos dizem que essa forma de viver é utópica. A história humana desmente. Foram mais ou menos 95 mil anos vivendo assim. Até que surgiu o controle privado dos meios de produção, há uns 5 mil anos.

Mas ainda há sociedades comunistas. São as sociedades indígenas. Nelas, a propriedade privada da terra, por exemplo, é algo completamente estranho. Ela não pertence a ninguém. Simplesmente existe para oferecer sustento a quem nela trabalhar.

O que resta do modo de vida comunista no Brasil está sob ameaça. Ameaçado pela expulsão das terras que ocupam há séculos. Por doenças, vícios, hábitos introduzidos pelos invasores brancos. Por obras enormes, que vão inundar florestas e matar rios. Pelo dinheiro, que corrói as relações humanas.

Felizmente, a idéia do comunismo teima em renascer. Ressurge das violências dos poderosos, revelando aos dominados sua igualdade na condição de explorados e ofendidos.

Leia também: Belo Monte: Lula pariu o monstro

21 de setembro de 2010

Justiça social que interessa aos exploradores

O IBGE vem divulgando dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD-2009). Eles mostram queda na pobreza e na desigualdade. O governo comemora com razão. Tudo muito positivo para a campanha eleitoral.

Mas, a queda da miséria e da desigualdade social vem sendo verificadas desde os anos 1990. Em especial, após o Plano Real, quando o neoliberalismo finalmente chegou ao Brasil. O fato é que a estabilização do consumo é um elemento fundamental para o mercado capitalista.

A razão de ser do capitalismo é a exploração. Esta se realiza através do consumo. Miséria extrema priva o mercado de muitos clientes. Principalmente, para produtos com mais investimento em tecnologia, capazes de gerar as elevadas taxas de lucro que movem o sistema.

É verdade que o governo Lula colocou em funcionamento programas sociais muito mais eficientes. Mas, Bolsa Família, crédito facilitado e salário mínimo maior são políticas focalizadas. Bem ao gosto dos neoliberais. Não mexem com a estrutura econômica da sociedade.

É por isso que estatísticas do próprio governo mostram que a repartição do bolo foi feita entre os trabalhadores. Os que exploram o suor alheio mantiveram e aumentaram sua parte. As estatísticas falam em classe A,B,C... de consumidores. Não incluem os donos dos meios de produção.

O combate à miséria poderia até merecer apoio. Não fosse por um grande detalhe. Seu objetivo maior é manter intacto o sistema de dominação. Serra, Dilma e Marina são apoiados por grandes proprietários da riqueza nacional. Nenhum deles quer desmontar essa engenharia maldita.

Leia também: Era Lula: banquete e migalhas

20 de setembro de 2010

Aos 60 anos, TV continua poderosa

Em 1950, a primeira transmissão por televisão foi feita para apenas 200 aparelhos de recepção no Brasil. A nova tecnologia era inofensiva. Somente 15 anos depois se tornou ameaçadora.

Sob a ditadura militar, foi criada uma rede nacional de transmissão, com a Globo no comando. Os generais precisavam se legitimar. A TV seria uma de suas armas mais potentes.

De lá pra cá, muita coisa mudou. Menos o poder da TV e os interesses a que serve. Fala-se muito em novas mídias, internete, redes. Realmente, essas novas tecnologias tornaram a comunicação alternativa mais ágil e eficiente. Mas, são mais de 170 milhões de espectadores de TV contra menos de 14 milhões de internautas, no País.

E muito do conteúdo presente na rede de computadores está baseado no que a televisão pauta. São milhões de postagens envolvendo novelas, filmes, esportes e notícias produzidas pela TV. Com suas distorções, omissões, mentiras e valores conservadores.

Antes imprimíamos panfletos e jornais caros e de tiragem limitada. Hoje, editamos páginas eletrônicas a custo baixo e com maior audiência. Mas, a briga continua a ser entre um bando desorganizado de Davis e vários exércitos disciplinados de Golias.

A poderosa Globo perdeu audiência? Sim. Perdeu terreno para concorrentes tão monopolizados como ela. E boa parte do que fazem, ou imita o padrão global, ou são ainda piores que ele.

O fato é que sem a democratização das comunicações, sete famílias vão continuar a determinar como a grande maioria deve pensar. E com mais habilidade. Já não se limitam a esconder a realidade, como faziam sob a ditadura. Mostram os pedaços dela do modo que lhes interessa.

Leia também:
A ditadura da TV nas eleições

17 de setembro de 2010

A música negra olha para a luz

Em 1893, o compositor checo Anton Dvorák publicou um artigo no New York Herald. Recém chegado aos Estados Unidos, ele surpreendeu-se com a força da música negra naquele país.

O entusiasmo de Dvorák mostrou-se justificado. Os afro-americanos nunca passaram de 10% da população dos Estados Unidos. Mesmo assim, sua música teve um peso enorme durante todo o século 20.

O blues foi decisivo para o nascimento do rock, por exemplo. O jazz tornou-se a música contemporânea popular de mais alta elaboração técnica e artística.

Ambos nasceram diretamente da resistência à exploração e humilhação. Da escravidão, racismo, perseguições e linchamentos. Como tanto sofrimento fez nascer tamanha arte?

Talvez, um pouco da filosofia do alemão George Hegel ajude a entender. Ao referir-se à dialética entre senhor e escravo, Hegel diz que nessa relação nenhum dos dois se realiza como ser humano. Se o escravo é prisioneiro, a liberdade do senhor está limitada pela necessidade de manter vigilância constante.

Mas o único que pode romper essa relação é o escravo. Ele está voltado para a luz. O senhor, para a escuridão. Em sua luta, o escravo tenta usar toda a criatividade de que o ser humano é capaz. Ao senhor resta a função estéril da dominação. Essa busca pela luz influencia tudo o que escravo faz, incluindo sua arte.

Arte não precisa ser alegre, bonita, iluminada, agradável. Mas exige liberdade. Mesmo que nasça das masmorras, precisa de ar puro para sobreviver. É deste esforço para longe das trevas que nasce a arte dos escravos. Dos antigos e dos atuais. Ela antecipa o que a humanidade será capaz de fazer quando todas as pessoas forem livres.

Leia também: Fruta estranha

16 de setembro de 2010

Lênin em defesa da liberdade religiosa

Domingo, dia 19, será realizada a “3ª Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa”. São esperadas mais de 100 mil pessoas das mais variadas crenças religiosas. O ponto de encontro é no Posto Seis, em Copacabana, às 11h.

É o tipo de atividade a que grande parte da esquerda dá pouca importância. No entanto, até um revolucionário radicalmente ateu como Lênin defendia a liberdade religiosa.

Em 1905, por exemplo, Lênin foi contra a inclusão do ateísmo no programa do Partido Bolchevique. A religião deveria ser considerada um assunto privado de cada um. Era preciso combater a religião apenas enquanto linha auxiliar das “forças tenebrosas do capitalismo". Lênin também propôs a publicação de um jornal destinado aos cristãos. Era o Rassvet (A Aurora), que teve nove edições publicadas em 1904.

Na verdade, algumas igrejas cristãs ampliaram sua influência sob o governo bolchevique. O número de fiéis batistas, pentecostais e adventistas passou de 100 mil para mais de um milhão na primeira década da revolução. Muitos deles combatiam abertamente o governo revolucionário aproveitando-se das garantias da constituição soviética sobre a liberdade religiosa.

A liberdade religiosa foi um aspecto importante de libertação nacional dos povos das ex-colônias da Rússia. Os bolcheviques colocaram em prática uma política de reparação dos crimes do czarismo contra as minorias nacionais e suas religiões.

Estes e outros aspectos libertários da Revolução Russa são devidamente escondidos pela direita. Querem que prevaleça a grosseira política anti-religiosa de Stálin. Declaradamente atéia, mas tão profundamente conservadora, moralista e repressora como as inquisições medievais.

Em breve, novas doses sobre o tema. Para quem lê inglês, muito mais informações em The Bolsheviks and Islam

15 de setembro de 2010

EUA: uma idosa que fazia os poderosos tremerem

Plínio de Arruda Sampaio se destaca na atual campanha eleitoral por defender idéias e propostas radicais. E também por sua idade avançada, enfrentando os preconceitos contra idosos.

Lembra a história de Mother Mary Jones. Mais uma personagem do livro “Uma história do povo dos Estados Unidos”, de Howard Zinn.

Nascida na Irlanda, em 1837, Mary mudou-se para os Estados Unidos, onde perdeu seus quatro filhos numa epidemia de febre amarela. Em Chicago, trabalhou como costureira até que um incêndio destruiu sua oficina e tudo o que tinha.

Começou a participar do movimento sindical aos 50 anos. Principalmente junto aos mineiros. Atuava com as mulheres no apoio às manifestações e greves de seus maridos.

Sua imagem maternal e idosa escondia um vulcão de agitação. Certa vez, em uma assembléia, foi apresentada como uma humanista. Ela corrigiu: “Não sou humanista. Sou uma agitadora infernal.”

Ao ser interrogada por autoridades, perguntaram-lhe onde vivia. Ela respondeu: "Vivo nos Estados Unidos, mas não sei exatamente em que lugar, porque estou sempre onde uma luta contra a opressão precisar de mim."

Em 1903, Mother Jones liderou uma marcha de crianças da Pensilvânia até Nova York para protestar contra o trabalho infantil, diante do Presidente Roosevelt.

Em 1905, estava entre os que fundaram a central sindical Industrial Workers of the World (IWW). A organização foi criada para romper com a atuação pelega da American Federation of Labor (AFL).

Morreu em 1930, aos 93 anos, apesar de alegar ter chegado aos 100. Tinha orgulho de sua velhice ativa e de ser considerada a mulher mais perigosa dos Estados Unidos. Perigosa para os poderosos.

Leia também: EUA: nasce um monstro imperialista

14 de setembro de 2010

Para Lula, grande mídia é grande álibi

Há vários dias, jornais, rádios e TVs não param de falar em quebra de sigilo fiscal. Os jornalistas das organizações Globo falam nisso antes de dar bom dia. Agem como um verdadeiro partido de apoio aos tucanos.

Querem provocar um segundo turno de qualquer maneira. Tudo indica que não vão conseguir. As pesquisas continuam favoráveis a Dilma Roussef. Não é difícil entender o motivo.

A grande maioria da população parece não ver tanta gravidade no caso. Não tem renda suficiente para se preocupar com sigilos e talvez não entenda porque os rendimentos de pessoas públicas deveriam ser tão secretos.

Quanto a possíveis imoralidades, são consideradas como parte da atividade política oficial. É feio, mas é do jogo. Vêm aprendendo isso há muitos anos. Recentemente, com o próprio PT, que se dizia campeão da ética na política.

Lula poderia acusar os empresários da grande mídia de ingratidão. Afinal seu governo não mexeu uma palha contra os monopólios do setor. Fechou os olhos para as irregularidades que cometem enquanto concessões públicas. E ainda aprovou um modelo de TV digital que preserva e reforça seus interesses.

Mas Lula tem mais é que agradecer. O partido da mídia está conseguindo mostrar sua candidata como vítima dos poderosos. Lula usa isso para comover setores populares e movimentos sociais. Para disfarçar todo o apoio que Dilma recebe de grandes empresas, bancos, latifúndios.

Por outro lado, a mídia não vem fazendo tudo isso apenas por estupidez e preconceito. Nesse jogo, ela vem perdendo no varejo. No atacado, vai garantindo que o próximo governo continue a respeitar religiosamente os interesses dos poderosos.

13 de setembro de 2010

Crise: W para os patrões, L para os trabalhadores

Quando a crise capitalista começou, em 2008, os especialistas discutiam se sua trajetória seria em W ou em L. Ela seria em W, se a queda na economia fosse seguida de uma recuperação. Num gráfico, as setas formariam a primeira e a segunda perna de um W. Depois da recuperação haveria outra queda e outra recuperação. Seriam a terceira e quarta pernas que faltam.

Em formato de L, a seta mostraria uma queda da atividade econômica, que permaneceria em baixa. Como houve uma recuperação da economia a partir de 2009, a trajetória em L foi descartada. Certo? Errado.

É o que diz o economista Rick Wolff, professor da Universidade de Massachusetts. Referindo-se à economia americana, ele mostra que a recuperação verificada entre 2009 e 2010 aconteceu apenas para os lucros das grandes empresas. Para salários, benefícios e empregos vale a seta em forma de L. Mais uma vez, os trabalhadores estão pagando a conta da crise.

Agora, vários economistas estão prevendo uma nova recessão da economia americana. É que os bilhões de dólares de ajuda governamental foram usados em muita coisa, menos na recuperação de empregos e salários. E com estes em baixa, uma economia consumista como a americana não tem como se recuperar de forma sustentável.

De qualquer maneira, o esquema W é falso. As crises capitalistas jamais deixaram as coisas como estavam antes delas. A concentração de riqueza aumenta em cima, pobreza e exploração crescem embaixo. A dúvida é sobre até que profundidade o L pode chegar. O que já está ruim para os trabalhadores pode ficar pior, com reflexos no mundo todo.

Leia o texto de Wolff, clicando aqui

Leia também: De BMW na fila do sopão

10 de setembro de 2010

Um assentamento chamado Cuba

Fidel Castro teria negado o socialismo, dizem alguns jornais. Na verdade, ele se referiu ao atual modelo econômico de Cuba. Não ao que ele chama de socialismo.

Mas o fato é que a esquerda brasileira precisa discutir melhor a experiência cubana. Não apenas defendê-la e fazer lhe elogios irrestritos.

Talvez, pudéssemos comparar Cuba a um assentamento de trabalhadores rurais. Uma trincheira formada por homens e mulheres organizados solidariamente. Dispostos a lutar por seus direitos e pela liberdade. Tudo muito parecido com Cuba.

Um assentamento sofre ataques pesados e covardes do latifúndio e do Estado. O povo cubano é vítima do imperialismo. Numa ocupação, a ameaça dos inimigos obriga à adoção de forte disciplina e respeito às lideranças. É o que ocorre com o povo cubano, sua disciplina quase militar e obediência míope a Fidel Castro.

A direção do MST se declara socialista. Mas, os assentados lutam pelo direito de produzir e vender para o mercado. O governo cubano afirma que a ilha já vive no socialismo. Mas abriu-se para o turismo e luta para se integrar à economia mundial.

O capitalismo é um sistema global. Invade, corrói, massacra cada pedaço do planeta. Seus valores e lógica se impõem tanto num assentamento como em Cuba. Num caso e no outro, não se trata de socialismo. Nem de transição a ele. É resistência.

Por isso, não pode haver dúvidas. Todos os verdadeiros revolucionários devem defender Cuba, tanto quanto defendem o MST.

Mas é preciso superar os limites ideológicos que os inimigos impõem. O socialismo só pode ser construído de baixo pra cima. Fruto da luta internacional dos trabalhadores. Com formas coletivas e solidárias de produção. Sob o governo de organizações populares. Caminho seguro para uma comunidade mundial formada por pessoas livres das amarras econômicas, hierarquias e opressões.

9 de setembro de 2010

5x favela, sob domínio da Globo

5x favela é um filme agradável. Bem produzido. Direções e roteiros profissionais. Atores competentes e talentosos. Nada disso impede que seja uma fraude.

Seu nome completo é “5x favela, agora por nós mesmos”. É uma produção da Globo filmes. Entre os patrocinadores, a MMX e EBX do grupo controlado por Eike Batista. Como é que um projeto como esse pode falar em nome dos que vivem na favela?

As tramas e dramas exibidos até tentam humanizar o tratamento da pobreza. O filme é melhor do que muita porcaria conservadora.

A direção, roteiros, atores e pessoal técnico podem até ser produto do trabalho de moradores de comunidades. Mas de um lado está a boa vontade, de outro, um poderoso monopólio mundial da informação e da diversão. O fato é que tudo isso está encaixado na linha de montagem da Globo. É a velha pretensão global: “A gente se vê por aqui”. “Até você, morador da favela, se quiser se ver, vai ter que se render ao padrão Globo”.

As comunidades pobres já falam por si mesmas. De muitas maneiras. Quase todas elas massacradas sob toneladas de preconceito, perseguição, discriminação, porrete e bala.

Para falar por ela mesma, já enfrenta tudo isso radicalmente. Jamais pelos caminhos do crime. Nunca pelo beco sem saída do mercado. O caminho é a guerrilha política, social e cultural. Nesta última trincheira, suas armas são as mídias que cria. O muro grafitado, o CD vendido na mão, o evento musical, o blog e o clipe pra ver na lan-house, o funk, o hip-hop, o pagode e o que mais servir para resistir.

Contra os monopólios da grande mídia, milhares de vezes favela!

Leia também: “Linha de passe” fica longe de quem interessa

8 de setembro de 2010

Crise capitalista: 2,5 milhões param a França

Os trabalhadores da França invadiram as ruas ontem para protestar contra a reforma da previdência e a política migratória. Cerca de 2,5 milhões paralisaram as atividades nas áreas de educação, transporte e serviços públicos.

A resistência aos ataques contra os imigrantes é uma das lutas mais importantes na França. Mas, o dia de paralisação convocado pelas maiores centrais sindicais teve como principal motivo outra questão. Trata-se do projeto de reforma da previdência enviado pelo governo Sarkozy à Assembléia Nacional. Entre outras medidas, a proposta quer elevar a idade mínima de aposentadoria de 60 para 62 anos.

Com as greves, mais da metade dos trens pararam. Os serviços de metrô também foram atingidos. Cerca de metade dos funcionários públicos aderiu à greve. Os sindicatos avaliam que o movimento superou as manifestações de junho passado, que havia envolvido 2 milhões de trabalhadores.

O objetivo dos governos europeus é obrigar os trabalhadores a amargar os prejuízos causados pela crise capitalista. As conseqüências são óbvias: aumento da desigualdade social, corte de direitos e mais pobreza. É por isso que as respostas vêm sendo cada vez mais radicais.

Os governos da Grécia, Espanha, Itália e Romênia também vêm enfrentando grande resistência popular a suas tentativas de impor cortes de salários e direitos. O metrô de Londres ficou paralisado na terça-feira por uma greve de 24 horas contra o fechamento de postos de trabalho.

Outras partes do globo parecem estar longe de tanto barulho. Mas, os intestinos da economia global continuam digerindo os efeitos da crise de 2008. Muita matéria fedorenta ainda está por ser expelida.

Leia também: Sexta-Feira 13 na Grécia

3 de setembro de 2010

O Hino Nacional da injustiça social

O Hino Nacional brasileiro é a cara de uma sociedade injusta. A começar por seu vocabulário. “Lábaro”, “garrida”, “impávido” são algumas das palavras que mais de 99% dos brasileiros não conhecem.

“Gigante pela própria natureza”, o país foi mantido unido a ferro e fogo. Revoltas populares aconteceram no Pará, Maranhão, Bahia, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Queriam as liberdades prometidas durante o processo de independência. O fim da escravidão era uma delas. Foram massacradas a mando da classe dominante.

A “mãe gentil” de que fala o Hino tem muitos filhos. A grande maioria está condenada à pobreza. Enquanto isso, alguns poucos são mimados com o que há de mais luxuoso. Mãe? Talvez. Desnaturada? Com certeza.

O “florão da América” sempre foi governado por quem explora e oprime os povos vizinhos. Desde a Guerra do Paraguai até os serviços prestados pelos carrascos da ditadura militar às ditaduras uruguaia, argentina e chilena nos anos 70.

Hoje, multinacionais brasileiras, como a Vale, Petrobras e Odebrecht fazem miséria em grande parte dos países sul-americanos. Já não se contentam em acabar com “nossos bosques” que “têm mais vida”. Também avançam sobre as matas e a vida de nossos vizinhos.

Já o “filho que não foge à luta”, é formado por negros e pobres. Na Guerra do Paraguai, por exemplo, a grande maioria dos 40 mil soldados brasileiros mortos era formada por escravos. Ou se alistaram em troca da liberdade, ou foram obrigados a ir para a guerra no lugar dos filhos de seus senhores.

O povo brasileiro ainda vai ter um hino que represente suas lutas. Enquanto isso, cantemos a Internacional. E, talvez, o hino dos clubes de nossos corações.

O Corinthians e o futebol têm pouco a comemorar

Aos 100 anos, o Corinthians até que está bem. Vem ganhando vários títulos nos últimos anos. Está bem no campeonato brasileiro. O presidente mais popular da história do país é seu torcedor entusiasmado. A enorme torcida cresce ainda mais. Mas tanto o clube como o futebol em geral não têm muito que comemorar.

Criado por ferroviários, o clube foi um dos primeiros de origem popular. Para jogar no time, não havia barreiras de preconceito de classe ou de cor. Desse modo, contava com os inúmeros talentos surgidos das várzeas paulistanas. Por isso, já nasceu conquistando vários títulos. Com essa história, o Corinthians foi um dos maiores responsáveis pela transformação do futebol em paixão popular.

Um dos momentos mais bonitos do clube aconteceu durante a chamada “democracia corintiana”. Entre 81 e 85, o clube viveu uma experiência única de democracia no futebol. Liderados por Sócrates, Wladimir e Casagrande, os jogadores acabaram com obrigatoriedade de se concentrarem antes dos jogos. As decisões eram resolvidas através do voto.

Os atletas participavam ativamente da vida política. O time entrava em campo vestindo camisas com mensagens incentivando a participação popular na política. Alguns deles foram lideranças no movimento pelas Diretas Já, por exemplo.

Vinte e cinco anos depois, o corintiano Lula governa o país. Mas, aliou-se aos cartolas. O Corinthians vai ter um grande e moderno estádio. Mas, provavelmente, será um lugar caro demais para grande parte de sua torcida. Muitos jogadores de futebol participam da política. Mas a maioria só quer se dar bem. Alguns craques ganham milhões. Muitos jogadores ganham muito mal.

Salve o Corinthians! Salvemos o futebol...

2 de setembro de 2010

Era Lula: pobre é baratinho

Lula é um grande comunicador. Pode-se discordar do que ele fala. Difícil não entender o que diz. Um exemplo:
Tem rico que vem aqui, te pede um bilhão de reais e sai falando mal de você. O pobre te pede dez reais e fica agradecido pelo resto da vida.
A frase foi publicada na revista Isto É de agosto passado. Não deixa de ser coerente.

O Bolsa-Família é considerado o maior programa social do mundo. Entre 2003 e 2009 o programa ficou com 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB).

Parece muito, mas não é. É só comparar com outros gastos públicos. O superávit primário, por exemplo, mordeu mais de 3% do PIB em média, no mesmo período.

O superávit primário é uma invenção maldita dos tucanos. Trata-se da diferença entre o que os governos gastam e arrecadam. O que sobra não pode ser usado em obras necessárias para a população. Tem que ir para o pagamento dos juros da dívida pública. Aquela que já está em mais de R$ 2 trilhões. A mesma que virou o cassino em que os muito ricos apostam, negociando papéis que pagam os maiores juros do planeta. Por isso, o superávit primário também é chamado de renda mínima dos capitalistas.

Ganhando Dilma ou Serra, o pessoal do andar de cima não precisa se preocupar. O orçamento de 2011 já garantiu R$ 125 bilhões para o superávit primário. Aprovado em lei com a ajuda de tucanos e petistas.

Eles confiam na avaliação de Lula de que pobre é baratinho. Uma crença que pode lhes custar caro, se os bons ventos da economia mundial mudarem de rumo.

Leia também: Era Lula: banquete e migalhas

1 de setembro de 2010

Os mineiros chilenos, entre abutres e predadores

Desde 5 de agosto, 33 trabalhadores estão presos a 700 metros de profundidade em uma mina, no Chile. O resgate pode levar quatro meses. Câmeras de vídeo, no entanto, já chegaram aos mineiros soterrados. A operação pode se transformar numa espécie de Big Brother.

O caso lembra um filme de Billy Wilder, de 1951. Em “A montanha dos sete abrutes”, Kirk Douglas interpreta um repórter fracassado, numa cidade do interior. É chamado para cobrir um acidente. Um morador está preso em uma mina abandonada. O resgate parece difícil. A notícia vira assunto nacional. A verdade é que o jornalista está dificultando o salvamento para fazer sucesso.

Não é possível dizer que o mesmo vem ocorrendo no Chile. Por outro lado, TVs e rádios devem ter adorado a situação. Garantia de enorme audiência por vários meses. São os abutres da mídia em ação.

Mas aves de rapina dependem de predadores para sobreviver. No caso, são os proprietários das minas. Segundo denúncias dos sindicatos, eles economizam no item segurança. E contam com a cumplicidade e omissão do governo chileno. O órgão encarregado da fiscalização é dominado pelas mineradoras. Nada muito diferente das agências reguladoras brasileiras.

Acidentes como este já poderiam ser evitados. Há muito tempo, robôs são enviados para explorar outros planetas. Por que não utilizar trabalho totalmente automatizado no subsolo da Terra? Basicamente, porque custa caro.

Além de ser barato, o trabalho humano coloca à disposição do patrão a capacidade cerebral dos trabalhadores sem custos adicionais. É assim que funciona um sistema que só serve para predadores e abutres.