Ken
Loach tem 80 anos, 30 filmes e muita coerência política. Suas produções procuram
denunciar as contradições e crueldades do capitalismo, sem serem aborrecidas ou
apocalípticas. Além disso, ele sabe colocar o dedo em algumas feridas da
esquerda socialista, com sua tendência ao autoritarismo e burocratização.
Loach
gosta de lembrar um ditado inglês segundo o qual “você não pode ficar neutro
entre os bombeiros e o fogo” para dizer que, muitas vezes, é preciso ficar do
lado do fogo. É o que mais uma vez ele demonstra com “Eu,
Daniel Blake”, filme que recebeu uma Palma de Ouro em Cannes.
A trama mostra o calvário vivido por um marceneiro
veterano diante do sistema de seguridade inglês em tempos neoliberais.
Impossibilitado de trabalhar por problemas cardíacos, Daniel é jogado num
labirinto burocrático que o impede de fazer valer seus direitos. Viúvo e sem
descendentes, o que o alivia de seus tormentos é a convivência com uma mãe
solteira e seus filhos, para quem se torna pai e avô.
Se o final é triste, não é pessimista. Em meio a tantas
dificuldades e injustiças, Daniel e sua família de adoção ainda encontram várias
pessoas solidárias na medida de suas possibilidades. São pontos iluminados que
abrandam a escuridão que oprime.
Alguns povos antigos achavam que as estrelas eram buracos
na casca negra da noite. Por eles, a luz diurna continuava a vazar
insistentemente. É assim que brilha o cinema de Ken Loach.
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