Doses maiores

21 de novembro de 2016

A esquerda que prepara sucessores de direita

No artigo “A arte da política”, publicado no Blog Junho, em 03/08, Asad Haider pergunta: “Se oito anos de Bill Clinton nos legou George W. Bush e oito anos de Obama nos deixou Trump, o que oito anos de Hillary Clinton pode oferecer?”

Como sabemos, Hillary não teve a chance de nos deixar saber.

Mas Haider aborda principalmente outra eleição importante. A de Margaret Thatcher na Inglaterra, em 1979. Cita, especificamente, um estudo do intelectual britânico nascido na Jamaica, Stuart Hall.

Escrito nos anos 1980, o ensaio de Hall procurava entender porque governos de esquerda, como os dos trabalhistas britânicos, prepararam o terreno para a enorme ofensiva neoliberal com que Thatcher massacrou os trabalhadores ingleses no período seguinte.

Em uma de suas conclusões sobre o problema, Hall afirma que a esquerda que assume governos costuma ter uma visão do papel do Estado “como encarnação do interesse nacional acima da luta de classes”.

Acreditando nisso, esses setores procuraram expandir as políticas sociais públicas, sem apelar à mobilização popular, e usaram o “intervencionismo estatal” apenas para “administrar a crise capitalista” em favor do capital.

Mas quando retorna ao governo, a direita imediatamente destrói toda política pública que contrarie minimamente seus interesses. E diante de qualquer resistência, ainda conta com um aparato repressivo não apenas mantido intacto como fortalecido pela esquerda que governava.

Ou seja, resumindo tudo muito grosseiramente, quando está no governo, a esquerda morre de medo de incomodar a direita. Mas esta, voltando a governar, arrasa tudo rapidamente com algumas canetadas e muitas cacetadas.

Será assim enquanto a esquerda institucional governar a resistência anticapitalista.

Leia também: A raiva que elegeu Trump

4 comentários:

  1. Sérgio, sua análise sintetiza a falência histórica do reformismo que transforma a tática em estratégia, secundarizando, com isso, a luta de classes. Vivemos um exemplo disso recentemente com o PT. Todavia, cabe ressaltar que nos EUA, ao contrário do que é divulgado, não existem dois partidos, o Democrata e Republica, mas somente um: o partido dos burgueses que se organizam em duas facções (democrata e republicana). Portanto, os Democratas, nos EUA, não fazem sombra ao que conhecemos como esquerda. Basta, por exemplo, verificar as decisões tomadas por Obama que remodelaram a política externa dos EUA, mas não alteraram, em essência, o caráter intervencionista dos estadunidenses.

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  2. Imagino que a pílula de hoje contemple em parte essa sua preocupação.
    Abraço

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