Doses maiores

9 de outubro de 2024

Nas periferias, CLT é coisa de otário

“Quero ser Pablo Marçal: por dentro da arriscada indústria que promete fabricar milionários”. Este é o título de uma ótima reportagem da BBC, publicada em 02/10/2024.

A matéria divulga conclusões de uma pesquisa da University College Dublin (UCD) feita durante dois anos, junto aos 500 maiores influenciadores de marketing digital do Brasil. A análise incluiu também um milhão de pessoas que fizeram algum dos cursos desses influenciadores, ou manifestaram interesse em fazê-los. O trabalho foi coordenado pela antropóloga Rosana Pinheiro-Machado, professora titular da UCD.

Segundo o levantamento, 13 milhões de pessoas “estão empreendendo no Instagram hoje no Brasil, por meio das contas comerciais”. Mas Rosana estima que a quantidade de gente usando o Instagram para vender algum produto no País hoje é muito maior, girando em torno de 25 milhões.

Os dados revelam a maneira como a maior parte dos influenciadores opera e seus padrões de discurso, que incluem a aversão ao emprego formal regido pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e críticas à formação superior.

"A lógica da pessoa querer ser chefe de si mesma, em um país onde muitos empregos estão marcados pela lógica da humilhação, é muito libertadora", afirma a antropóloga.

Quem mora nas periferias e bairros pobres das grandes cidades brasileiras não se surpreenderia com muitas dessas conclusões. Nesses lugares, chamar alguém de CLT é o mesmo que xingar de otário.

Tudo isso tem muito a ver com as recentes ofensivas da extrema direita e com a grande votação de Pablo Marçal para a prefeitura de São Paulo. Mas voltaremos ao tema em algumas das próximas pílulas.

Leia também: A economia idiota dos exploradores

4 comentários:

  1. Bem verdade, é esse dupla que motiva as pessoas, não precisar de carteira assinada e nem investir em formação acadêmica. Isso porque ficaram muitos difíceis essas duas coisas, aí a saída precisava ser outra mesmo, nem que fosse uma ilusão, como vou me apresentar na sociedade sem ter essas duas coisas, preciso ter um "diploma" de empreendedor ou o que for. Boa Pílula, pode continuar por aí como diz que eu autorizo. Tenho que dizer que é brincadeira a autorização porque muita gente pelo menos não me conhece.

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  2. Muito triste com as pesquisas recentes pro segundo turno de SP. As periferias tinham todos os motivos pra votar em Boulos, mas não sei como e se ele consegue puxar o voto dessa galera. Ontem ele fez umas falas sobre empreendedorismo numa tentativa de desespero (e nossa, a que ponto chegamos!).

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    1. Triste, mesmo. A Rosana Pinheiro-Machado tem feito um bom trabalho para explicar essas contradições. Na pílula de hoje, tento continuar o debate sobre esse problema. Até existem boas explicações. Mas faltam formas de incidir a partir delas na vida concreta das pessoas.

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