Doses maiores

8 de fevereiro de 2024

Fé e Fuzil: lições sobre hegemonia pentecostal

O movimento social está dizendo que o mundo está acabando, que o fascismo está tomando conta, uma série de desgraças. Mas o pessoal da favela já é doutor em desgraça, ele não precisa ouvir mais essas. Já os pastores estão lá, dizendo para o desgraçado que ele é tudo pra Jesus. Se eu estou numa situação de abandono, eu me agarro.

As palavras acima são do dirigente da Central Única das Favelas (Cufa), Preto Zezé. Estão no livro de Bruno Paes Manso “A fé e o fuzil”. Organizações como a Cufa, lembra ele, são moldadas pelos valores da era pentecostal, ligados ao empreendedorismo.

Os evangélicos pentecostais ofereciam algo que outras estruturas de poder seculares, criadas para produzir controle e ordem, não conseguiam, afirma o autor. Isso ocorria, em primeiro lugar, pela força de suas mensagens. As pessoas as obedeciam porque acreditavam nas explicações, seguiam suas regras e mudavam de comportamento porque queriam ser recompensadas por isso.

Como a competição com os mais ricos era inglória, o crime surgia como opção para os revoltados e cínicos. Já a crença em um poder divino podia favorecer o amor-próprio e trazer satisfação pessoal. Os pentecostais também conseguiram criar uma poderosa estrutura de comunicação, diz o autor.

Quanto maior o alcance da mensagem, menos exótica ela se tornava, e conforme deixava de ser estranha ao senso comum, mais normalizada e mais adeptos conquistava. Templos surgiam com a mesma agilidade que botecos e biroscas, tornando-se presença inseparável do ambiente das favelas, conclui Manso.

Nesses poucos parágrafos, muitas lições sobre disputa de hegemonia, ainda que orientada por valores conservadores e neoliberais.

Leia também: Fé e fuzil: o sagrado e a luta de classes

2 comentários:

  1. O parágrafo inicial com a fala do dirigente é muito boa, e os outros também. Muito elucidativo, é isso, ganha quem oferece algo, mesmo que seja ilusão diante do nada. Merda.

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