Doses maiores

31 de julho de 2024

O neoliberalismo desde baixo

O filósofo Rodrigo Nunes publicou o artigo “Pequenos fascismos, grandes negócios”, em outubro de 2021, na revista “piauí”. Em determinado trecho, ele lembra que a cientista social argentina Verónica Gago cunhou a expressão “neoliberalismo desde baixo”, por ele resumida como:

...uma condição em que as classes populares, cada vez mais habituadas à privatização dos riscos e aos discursos de legitimação da ordem econômica promovidos pelo neoliberalismo, internalizam a lógica do “empreendedor de si mesmo” e passam a conceber nesses termos suas próprias estratégias de vida.

Mesmo em condições normais, o mercado sempre produz muito mais perdedores que vencedores. Aliás, a ficção de que ele seria um espaço em que os indivíduos florescem exclusivamente por seus méritos normalmente serve para que os vencedores disfarcem todas as vantagens que tiveram (na forma de riqueza intergeracional, boas conexões e acesso privilegiado ao poder político, por exemplo). Mas a força da ideologia do empreendedorismo provém do fato de que a identificação com ela não só não precisa de uma base material (ela se refere mais a uma atitude que a uma atividade), como tende a tornar-se mais forte, e não mais fraca, diante da impossibilidade de se realizar. Quando se crê que o êxito depende exclusivamente do esforço individual, o fracasso não é experimentado como sinal de que os dados estão viciados, mas como culpa, vergonha e chamamento para dar ainda mais duro.

Desse modo, o neoliberalismo cria raízes no chão social, ao mesmo tempo em que o ressentimento que suas frustações geram permite ao extremismo de direita funcionar como válvula de escape e mecanismo de reforço do sistema.

Leia também: Neoliberalismo, o exterminador do futuro

2 comentários:

  1. Pois é. Recentemente, uma matéria informa que: "Embora o mercado de capitais e os investimentos financeiros sejam concentrados em uma fatia mais rica da população, o número de investidores no Brasil vem aumentando. Seriam hoje 60 milhões de pessoas, com aumento de investidores em todas as classes sociais, com destaque para a classe C – domicílios que ganham entre R$ 2,9 mil e R$ 7,1 mil - (aumento de 29% para 36% )" https://grain.org/e/7137
    Assim, não se trata apenas de adesão por desistência ou impossibilidade, mas também adesão ativa mais ou menos imposta pelas circunstâncias. A refletir. Abs, Virgínia


    https://grain.org/e/7137

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  2. Sim, Virgínia. Estes números confirmam a percepção da estudiosa argentina quando ela fala em "neoliberalismo desde baixo". Abraço, querida!

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